Desconfiança em corte de gastos justifica dólar a R$ 6,20
17 dezembro 2024 às 17h52
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Nos últimos 30 dias, foram publicados indicadores que apontam simultaneamente para a melhora e piora da economia brasileira. Por um lado, o crescimento do PIB foi revisto para 4% e o desemprego caiu a 6,2%; por outro, o dólar quebrou novo recorde histórico ao atingir a marca dos R$ 6,20 e o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central aumentou a taxa Selic para 12,25% ao ano, com previsão de novo aumento de um ponto percentual nas próximas reuniões.
Como um país em crescimento econômico pode manifestar políticas monetárias contracionistas? Com tendências tão opostas, há um discurso para os defensores do governo na “oposição da Faria Lima” e na “sabotagem dos neoliberais”. Entretanto, diversas reportagens do Jornal Opção revelam que, na prática, a população sente que a economia patina: a temporada dos feriados ainda não aqueceu o comércio, consumidores lamentam o alto preço da carne, entre outros.
Os indicadores, na verdade, não são contraditórios. Primeiro, porque crescimento do PIB não significa necessariamente um aumento da produtividade; gastos ruins também são levados em consideração. Desde janeiro, o déficit público acumulado em 2024 é de R$ 64 bilhões — esse é o valor que o governo consumiu acima de sua receita. Crescimento induzido por gastos do Estado é o cenário familiar que gerou a crise de 2015, e a razão pela qual a inflação está 0,1 ponto percentual acima do máximo da meta de 4,5% ao ano.
O mecanismo pelo qual os gastos públicos acima da receita geram inflação foi explicado em um estudo do MIT, que revelou como 42% da alta da inflação nos Estados Unidos em 2022 podem ser atribuídos aos gastos do governo. Naquela ocasião, o estímulo do governo para ajudar a economia a se recuperar durante a pandemia aumentou a oferta de dólares. No Brasil, o cenário é análogo.
Para tentar conter o mau gasto público que aumenta a oferta de reais sem causar benefício duradouro a economia, o ministro da Fazenda Fernando Haddad apresentou pacote de corte de gastos. O pacote foi visto como tímido e pouco convincente pelo mercado, e essa reação é manifestada na desvalorização da moeda. Investidores pouco confiantes no Brasil preferem aportar seus recursos no dólar.
O governo federal tem parte da culpa pela descrença dos investidores na seriedade do pacote. Primeiro, porque Haddad apelou ao Congresso para não desidratar as medidas — a base do governo no Legislativo estará disposta a comprar a briga? Em segundo lugar, o Arcabouço Fiscal, que previa déficit zero, foi desmoralizado poucos meses após ter sido aprovado pelo governo.