No dia primeiro de maio, a comemoração do Dia do Trabalhador que contou com a presença do presidente Lula da Silva (PT) na Neo Química Arena, o estádio do Corinthians, pôde ser considerado um fracasso em diversos sentidos. Foi uma derrota na arena da Justiça Eleitoral, com o uso de recursos públicos para a realização de um showmício extemporâneo. Mas, mais importante, foi uma fracasso de público. O baixo número de participantes poderia servir de case para análise, se a resposta de Lula não fosse aquela que o presidente exibiu no palanque: culpar o ministro ao seu lado pela má convocação. 

A primeira e mais imediata derrota foi a determinação da Justiça Eleitoral de que o YouTube e o presidente retirem do ar o trecho gravado do evento em que Lula pede votos para Guilherme Boulos (PSOL), candidato de Lula em São Paulo. Vale destacar que o ato teve patrocínio do Conselho Nacional do Sesi, da Petrobras (empresa de capital aberto cujo acionista majoritário é o Governo do Brasil), e outros. Foi ainda parcialmente financiado com recursos captados pela Lei Rouanet, de acordo com informações do Sistema de Acesso às Leis de Incentivo à Cultura (Salic).

A segunda derrota lembra 2018, quando Mano Brown diagnosticou o problema da campanha perdida de Haddad (PT) contra Bolsonaro (PL). Brown disse, enquanto era vaiado e chamado de “traidor” pelos militantes petistas: “A cegueira que atinge eles, atinge a nós também. Tem uma multidão que não veio hoje e precisa ser conquistada. Deixou de entender o povão, já era.”

Neste primeiro de maio, a reação de Lula foi criticar a convocação do ato, sob responsabilidade do ministro Márcio Macedo, da Secretaria-Geral da Presidência. A bronca em público soa estranha. O presidente se comporta como se não fizesse parte do governo, mas como se sua função fosse a de ombudsman do trabalho de seus ministros. “Macedo é responsável pelo movimento social brasileiro. Não pensem que vai ficar assim”, disse Lula em público, parecendo condenar o ministro à demissão ao vivo. “Ontem eu disse para o Márcio que o ato está mal-convocado. Não fizemos o esforço necessário para trazer a quantidade de gente que precisa.”

Mais interessante, porém, é entender a razão pela qual o PT não parece saber quem são as pessoas com quem conversa, o que querem essas pessoas e o que as aflige. Em outras palavras, encontrar “o diagnóstico Mano Brown”. Em parte, o problema parece ser explicado pelo distanciamento do Partido dos Trabalhadores de sua origem. 

O ato foi patrocinado em parte pelas centrais sindicais na capital paulista, mas os tempos são outros, e trabalhadores como motoristas de aplicativos têm interesses diametralmente opostos aos dos sindicatos da era Getúlio Vargas. O governo petista propôs regular o trabalho por aplicativos pelo molde CLT, e a ideia foi fortemente repelida pela própria categoria que visa proteger. 

Nos últimos 20 anos, pautas identitárias penetraram a esquerda. Sem entrar no mérito da justiça e necessidade das causas, é importante destacar que elas simplesmente não estão na lista de prioridades da maioria pobre e sem acesso a serviços do estado no Brasil. Uma pauta que está, sim, na lista de demandas é a segurança pública — uma área onde a esquerda apresenta poucas propostas em relação à direita. As igrejas evangélicas, com enorme capilaridade nas zonas de classe baixa e que oferecem serviços essenciais onde o estado não chega, são outra porta de entrada para a direita, que tem vínculos estreitos com a religião. 

Todos esses fatores se referem ao que Mano Brown já aludia seis anos atrás. Novamente, em forte tom personalista, Lula se afasta do fato de que a esquerda “deixou de entender o povão” e se comporta como um crítico externo.