Encontro de Gigantes nas Praias do Araguaia: quando o boto-do-Araguaia vira presa da onça-pintada
01 novembro 2025 às 21h00

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Por: Douglas dos Santos Silva, Leandro Silveira, Sebastião Pegoraro Monteiro Guimarães e Cristiane Gonçalves de Moraes – Especial para o Jornal “Opção”
Era início do mês de outubro de 2023, a equipe do programa “Araguaia Vivo 2030”, em parceria com o Instituto Onça Pintada (IOP), desembarcava em uma praia do Rio Araguaia, próxima à confluência com o Rio das Mortes, no município de São Félix do Araguaia, no Mato Grosso. Essa praia estava sendo monitorada há algum tempo devido à presença constante de uma onça fêmea com um filhote bem pequeno. Uma “armadilha fotográfica” (câmera que funciona com sensor de movimento e dispara quando o animal se movimenta no raio de ação do sensor) havia sido instalada pela equipe de pesquisadores em uma trilha que saía da praia em direção à mata. O local havia sido escolhido devido a outros registros de predação de jacarés e capivaras, indicando que a onça estava frequentemente caçando nessa praia.
Essas praias de areia branca, marcantes ao longo do Rio Araguaia, se formam durante o período de seca (maio a novembro) à medida que o nível do rio abaixa. Adjacentes às praias é comum a formação de lâminas d’água rasas, variando de poucos centímetros até um metro de profundidade, popularmente conhecidas como “rasuras”. São áreas muito frequentadas por peixes de diversos tamanhos e, consequentemente, por diversas outras espécies, como aves aquáticas, jacarés, capivaras, tartarugas e ariranhas, todas presas potenciais das onças-pintadas. Naquele momento, a rasura daquela praia tinha cerca de um metro de profundidade e formava uma espécie de pequena baía, que se afunilava até uns 15 metros de distância da mata.
Ao desembarcar na praia, os pesquisadores logo notaram que algo diferente acontecera ali: uma grande marca de arrasto saía da água na direção da trilha para o interior da mata, com pegadas de onça por todo lado, além de algumas marcas de sangue acompanhando os rastros. A marca do arrasto era muito espessa e profunda na areia, indicando que se tratava de um animal grande e pesado. Estava óbvio que não era um abate comum, e assim algumas hipóteses começaram a surgir entre a equipe:
– Seria uma anta adulta? As antas adultas pesam mais de 200 kg, mergulham e nadam muito bem, não seria fácil uma onça conseguir abater um indivíduo adulto dentro d’água;
– Talvez um jacaré-açu de grande porte, já que nessa região já foram avistados jacarés com mais de 4 metros! Por outro lado, é muito raro que onças ataquem jacarés tão grandes…
Enquanto discutiam as possibilidades caminhando pela praia seguindo as marcas na areia, só havia um pensamento ecoando na mente dos pesquisadores: a torcida para que a câmera ali instalada tivesse registrado imagens que ajudassem a desvendar aquele mistério. Ao subir o barranco e entrar na mata, os rastros passavam bem diante da câmera. Antes de checar as imagens, a equipe continuou seguindo as marcas mata adentro e o que encontraram, cerca de 30 metros adiante, foi absolutamente surpreendente: um boto-do-Araguaia adulto com mais de dois metros de comprimento e pesando mais de 200 kg! Botos são mamíferos aquáticos, parentes das baleias e dos golfinhos marinhos, que se adaptaram para explorar ambientes fluviais. O boto-do-Araguaia (Inia araguaiaensis) vive exclusivamente na bacia Tocantins–Araguaia e desempenha papel fundamental na saúde ecológica dos rios. No “Araguaia em Foco” você encontra um ensaio sobre esses animais, as ameaças à sua persistência e a importância de sua conservação para a região.
A carcaça ainda estava fresca, indicando que o abate havia sido recente e a onça havia comido apenas parte da cabeça, do pescoço e o do “melão” (protuberância de gordura atrás da cabeça). Algumas precauções eram necessárias, pois certamente a onça estaria ali por perto e retornaria para comer o restante da sua presa. Então a equipe decidiu amarrar a carcaça, para que a onça não arrastasse mais para dentro da mata, e utilizar uma câmera para tentar registrar a onça consumindo a carcaça. Em seguida, foram para a câmera instalada na trilha e, ao checar as imagens, constatou-se que os resultados não poderiam ser melhores!!! A câmera não registrou apenas a onça arrastando o boto, mas também diversas imagens que antecederam o ataque. Aquela fêmea passou boa parte da madrugada espreitando naquele barranco, invisível entre a vegetação, monitorando cada movimento da presa em potencial na praia. O filhote chegou a aparecer em algumas imagens durante a madrugada, mostrando que, mesmo muito pequeno, já acompanhava as caçadas de sua mãe. Próximo das cinco horas da manhã o comportamento da mãe mudou; sua atenção se volta para a praia e o filhote não está mais junto dela. Algo chamou sua atenção na praia, provavelmente o som da respiração dos botos e o barulho na água enquanto estes encurralavam um cardume na rasura. A fêmea passa pela câmera em direção a praia, e o próximo vídeo já é gravado pouco mais de 40 minutos depois, quando ela já arrastava o boto pela mata em frente à câmera.
Aquele registro deixou os pesquisadores atônicos, quanta força fazia aquela mãe ao arrastar sua presa com mais de 200 kg barranco acima! Enquanto a fêmea arrastava o boto em frente a câmera, outro registro interessante foi obtido: o filhote se atracava com o boto abatido, enquanto sua mãe arrastava lentamente a carcaça pela areia, entre pausas para descanso. É dessa forma que as onças aprendem a caçar, observando suas mães e interagindo com as presas que ela abate. Ali o filhote aprendia sobre a textura, o gosto e as formas de usar suas garras e mandíbulas, e o que parece apenas uma brincadeira é, na verdade, uma pequena onça aprendendo a se tornar um futuro predador de botos!
Após a checagem das imagens restava uma lacuna a ser preenchida: entender como foi a dinâmica do ataque. Para isso, os pesquisadores precisaram montar um quebra-cabeça a partir das marcas deixadas na areia. As marcas das garras profundas na areia indicavam exatamente o local onde a onça saltou sobre o boto que adentrou muito na rasura atrás do cardume. O ataque foi fulminante, o salto preciso, a onça agarrou o boto e com a força da mandíbula deferiu uma mordida fatal na cabeça. O local onde a onça saiu com o boto da água estava poucos metros distantes do local do salto, sugerindo que a luta durou poucos segundos. O predador terrestre, adaptado a emboscadas, foi capaz de capturar rapidamente um predador aquático, e com um esforço impressionante, arrastou o corpo pesado do boto para a areia.
Uma semana depois, a equipe retornou à praia para checar a carcaça e recolher a câmera instalada em frente à ela. Para surpresa da equipe as imagens revelaram que uma segunda onça fêmea frequentou a carcaça em dias alternados à onça que abateu o boto, mostrando um compartilhamento de recursos interessante. As duas se revezaram e se alimentaram da carcaça do boto por quatro dias. É possível diferenciar os indivíduos de onça-pintada por suas resetas (as manchas pretas na pelagem) pois cada onça tem um padrão único de manchas, são como suas impressões digitais. As onças consumiram basicamente a cabeça, o melão e a parte superior do tórax, principalmente as vísceras. Aparentemente, as onças não mostraram interesse pelo restante da carcaça.

Mas o grande interesse da equipe era coletar o crânio do boto. A onça-pintada possui a mordida mais potente, proporcionalmente, entre todos os grandes felinos. A musculatura e a estrutura óssea de suas mandíbulas e dentes evoluíram para perfurar e quebrar ossos. Elas geralmente matam com uma poderosa mordida na cabeça, perfurando o crânio e paralisando rapidamente as suas presas. Ao checar o crânio, a equipe obteve a última confirmação que faltava do evento de predação. A perfuração na base do crânio, com quase um centímetro de diâmetro, e várias fraturas na mandíbula inferior e em outras partes do crânio não deixavam dúvidas: aquele animal foi vítima de uma poderosa mordida na cabeça.

O registro desse ataque, identificado poucas horas após o ocorrido, capturado por uma câmera instalada às margens do rio e acompanhado por equipe de cientistas, revelou uma cena que poucos acreditavam ser possível. Por muito tempo se considerou improvável que onças caçassem botos de forma ativa. A explicação mais aceita era a de que, ocasionalmente, esses felinos se aproveitavam de animais debilitados, encalhados ou mortos, alimentando-se das carcaças. Então, seria esse evento registrado pelos pesquisadores em 2023 um caso isolado, um comportamento raro e eventual, ou as onças do Araguaia são realmente caçadoras de botos e nós desconhecíamos essas habilidades?
Essas perguntas então ganharam grande atenção dos pesquisadores do projeto do “Corredor da Onça”, coordenado pelo IOP e apoiado pelo programa “Araguaia Vivo 2030” (@araguaiavivo), financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (FAPEG) e gerenciado pela Tropical Water Research Alliance (TWRA), e pelo PPBio Araguaia (@ppbio.araguaia), executado pela PUC-Goiás com apoio do CNPq. Nesse contexto, o Rio Araguaia vem sendo trabalhado como o “Corredor da Onça” devido à sua grande importância como um dos maiores corredores ecológicos do mundo, ligando os dois maiores biomas Brasileiros (Amazônia e Cerrado), totalizando quase 3 mil km de extensão desde sua nascente até a sua foz próxima à Ilha do Marajó, após o encontro com o Rio Tocantins. As grandes faixas de vegetação nativa ao longo de todo Rio Araguaia, a baixa ocupação humana, a diversidade de habitats e presas disponíveis, fazem do Araguaia uma de alta adequabilidade para onça-pintada.
Ao mesmo tempo em que esse corredor ecológico ao longo do Araguaia ganha importância pelo seu tamanho, ele traz junto grandes desafios de se monitorar uma área tão extensa. Uma onça poderia abater um boto em qualquer parte do corredor, ela o arrastaria para a mata e a carcaça jamais seria encontrada. Mas havia um grupo de pessoas que está no rio todos os dias e que conhece muito bem o Araguaia: os guias de pesca. O Programa “Araguaia Vivo” vem estreitando muito as relações com os guias de pesca da região, que atuam como pilotos das embarcações que levam as equipes em trabalho de campo, colaboram em coletas de dado por meio da “ciência cidadã” e recebem cursos de capacitação promovidos pelo projeto.
Hoje, com a evolução dos smartphones e suas câmeras e a popularização da internet e das mídias sociais, tudo o que acontece no rio é registrado por guias e pescadores. Nesse contexto, a quantidade de avistamentos de onças no Araguaia publicados nas redes sociais aumentou consideravelmente nos últimos anos. Agora, a equipe de monitoramento do projeto “Corredor da Onça” acompanha atentamente os perfis no Instagram e os grupos de Whatsapp dos guias de pesca, em busca de mais registros, o que começou a render frutos rapidamente.
Em julho de 2024, a publicação de um vídeo de uma onça arrastando um boto em uma praia do Araguaia viralizou nas redes sociais. A equipe de pesquisa entrou em contato com o guia que filmou o evento, chegando rapidamente ao local do ataque. Esse local, novamente a rasura de uma praia, estava mais de 200 km de distância rio acima do primeiro registro, próximo a Luiz Alves, povoado de São Miguel do Araguaia, em Goiás.

O guia de pesca que presenciou o ataque, que ocorreu em plena luz do dia, descreveu com detalhes como tudo aconteceu. O boto entrou na rasura encurralando os peixes de um cardume, enquanto a onça, abaixada em posição de ataque, observava tudo da praia. No momento oportuno, ela partiu velozmente em direção à água e saltou sobre o boto. A luta durou pouco tempo, a onça arrastou o boto ainda agonizando para a praia e ali terminou de matá-lo, deixando uma grande marca de sangue na areia; em seguida, o arrastou para dentro da vegetação. A equipe então seguiu as marcas na areia na esperança de encontrar a carcaça e, poucos metros depois de adentrar à vegetação, encontraram o que restava do boto. Muito já havia sido consumido, mas o crânio ainda estava bem preservado. Ao analisar o crânio, os pesquisadores logo notaram as fraturas e perfurações, semelhantes às encontradas no primeiro crânio coletado em São Félix do Araguaia. Para análises comparativas mais detalhadas e precisas dos padrões de mordidas, os dois crânios foram encaminhados para a sede do Instituto Onça Pintada, em Mineiros (Goiás).
Demoraria um ano para que outro boto predado por onça fosse encontrado pelos guias de pesca do Araguaia. Ao final do mês de julho de 2025, um boto foi encontrado morto em uma praia quase 100 km rio acima do evento anterior, próxima a Bandeirantes, distrito de Nova Crixás, em Goiás. Ao desembarcar na praia, o guia de pesca e seus turistas logo notaram um boto que estava parcialmente consumido, começando pelo melão, cabeça e pescoço. Havia ali diversas pegadas de onça por perto e, novamente, uma marca de arrasto na areia da praia que saía da água vindo da rasura. A equipe de pesquisa logo tomou ciência da predação e, com o apoio de guias e empresários locais, mobilizou uma equipe de guias parceiros para ir buscar o crânio no local da predação. Com mais esse evento registrado, já era possível começar a estabelecer um padrão no comportamento das onças de caçar botos no Araguaia, tanto nas características nas áreas de emboscadas, quanto nos padrões de mordida e nas partes mais consumidas da carcaça.
Pouco mais de um mês depois, no início do mês de setembro de 2025, outro vídeo de boto predado por onças circulou na internet, agora próximo ao município de Aruanã, em Goiás, a mais de 500 km de distância rio acima do local do primeiro registro em São Félix do Araguaia. Assim que a equipe tomou conhecimento, um guia de pesca colaborador do Programa “Araguaia Vivo 2030” foi acionado para ir até o local recuperar o crânio. A carcaça havia sido pouco consumida, novamente apenas no melão, na cabeça e no pescoço. Porém, o que chamou atenção nesse caso foi que ele não ocorreu em uma praia ou perto de uma rasura: a carcaça estava em um barranco alto, à margem de uma parte um pouco mais profunda do rio. Esse fato chamou a atenção dos pesquisadores, mostrando que as emboscadas nem sempre estão vinculadas às rasuras. As onças de algumas regiões do Pantanal caçam jacarés saltando sobre eles de cima dos barrancos em águas mais profundas, então será que as onças do Araguaia também conseguem usar tal estratégia para caçar botos? Surgia mais uma pergunta a ser respondida pelos pesquisadores.
Poucos dias depois, no final do mês de setembro, surgiu mais um vídeo mostrando botos mortos encontrados por guias de pesca no Araguaia. As marcas na areia não deixavam dúvida, uma onça seria responsável pelo abate. Novamente, ao tomar ciência do fato, o IOP acionou os parceiros locais para tentar recuperar o crânio. Mas esse evento trouxe algo completamente surpreendente, pois não havia apenas um, mas dois botos mortos e arrastados para o mesmo local, um arbusto no interior da praia. Os dois crânios estavam preservados e foram coletados pelos guias de pesca para serem encaminhados para o IOP. Seria apenas uma onça responsável pelo ataque? Teria sido um ataque simultâneo de duas onças? Ao mesmo tempo em que as evidências se acumulavam e traziam mais informações sobre a interação ecológica entre esses dois gigantes do Araguaia, muitas novas perguntas emergiam na cabeça dos pesquisadores. É assim que a ciência funciona!!!
Os seis crânios coletados até o momento e a identificação dos locais das predações estão contribuindo para montar um complexo quebra-cabeça. Estamos aos poucos compreendendo melhor o comportamento e a dieta das onças no Araguaia. Existem outros relatos e até publicações científicas a respeito de onças-pintadas se alimentando de mamíferos aquáticos ao longo de sua distribuição geográfica, como botos na Amazônia e golfinhos em praias à beira mar na América Central. Mas, sem dúvida, as melhores evidências científicas de que esses cetáceos são regularmente predados por grandes felinos surgiram ao longo do médio Rio Araguaia nos últimos dois anos.
Esses avanços não seriam possíveis sem a colaboração dos guias de pesca e dos parceiros locais, evidenciando a importância da ciência cidadã, do conhecimento das comunidades tradicionais e da população ribeirinha. Os guias de pesca do Araguaia foram a parte mais importante nesse processo de acúmulo de conhecimento. Graças a eles, os materiais coletados e enviados ao IOP, estão sendo analisados pelos pesquisadores e um artigo científico será publicado com os resultados da pesquisa.
Nós ainda sabemos muito pouco sobre as interações entre onças e botos, e muitas perguntas ainda precisam ser respondidas. Esses eventos de predação também acontecem durante o período de cheias, quando o médio Araguaia se encontra em grande parte alagado? Os botos tendem a se tornar mais vulneráveis a predações de onças conforme o Araguaia vai ficando mais seco e assoreado, aumentando as rasuras? No entanto, os registros coletados ao longo desses dois anos de monitoramento no Vale do Araguaia representaram um grande avanço no preenchimento de importantes lacunas no conhecimento a respeito dessa interação.

Já sabemos que são nas rasuras que as chances do encontro aumentam. O boto, acostumado a caçar peixes em águas abertas, aproxima-se das margens, onde a profundidade reduzida o torna vulnerável. Já a onça, que domina como poucos predadores a arte da espera e da camuflagem, aproveita quando o boto se aproxima, o ataque é rápido e preciso — a força concentrada da mandíbula é suficiente para imobilizar o animal quase instantaneamente. Essa estratégia demonstra uma capacidade impressionante de adaptação. A precisão da mordida observada nos crânios coletados indica que as onças aprenderam a atacar em pontos vitais. O padrão se repete: mordida no crânio, perfurando a caixa craniana, muitas vezes perto de onde estão as vértebras cervicais. São golpes fatais, aplicados com extrema eficiência. Essa repetição demonstra não um evento isolado, mas um comportamento aprendido e reproduzido, possivelmente transmitido entre indivíduos e reforçado por experiência. O Araguaia molda não apenas as margens e praias, mas também o comportamento das espécies que dependem dele.
Além do aspecto ecológico, o comportamento observado ajuda a compreender melhor a resiliência da onça-pintada. Em um ambiente de transição, sujeito a cheias e secas extremas, a capacidade de explorar diferentes fontes de alimento é crucial para sua sobrevivência, mostrando a sua versatilidade como predador de topo de cadeia. Predar um boto é uma das expressões mais impressionantes dessa plasticidade ecológica. Quanto aos botos-do-Araguaia, o fato de ser agora confirmado como presa ocasional da onça-pintada não representa uma ameaça adicional significativa, mas sim uma revelação sobre a complexidade ecológica do Araguaia. A predação natural é parte do equilíbrio, um lembrete de que o ciclo da vida, mesmo entre espécies emblemáticas, segue seu curso no tempo e no espaço da natureza.
Ver onças e botos coexistindo e interagindo como predador e presa é testemunhar um elo entre dois mundos. Ambos são símbolos da natureza brasileira, protagonistas de mitos e histórias contadas por gerações ribeirinhas. Para os povos do Araguaia, o boto é espírito do rio; a onça, guardiã da mata. Em tempos em que rios são represados e margens são tomadas por construções, registros de onças caçando botos soam como uma mensagem. É a voz do Araguaia lembrando que a vida selvagem ainda pulsa, mesmo sob ameaça. Mostra também que o Araguaia ainda é suficientemente selvagem para abrigar comportamentos que desafiam o conhecimento humano.
Proteger o Araguaia é proteger o palco onde essas histórias acontecem, o território onde o Cerrado e a Amazônia se encontram. Cada nova descoberta científica é também uma lembrança poética: o Araguaia continua sendo um rio de mistérios, onde gigantes se cruzam longe dos olhares humanos e sob o olhar atento da natureza.
Confira quem são os autores do artigo
Douglas dos Santos Silva – Turismólogo e Doutor em Biodiversidade Animal pela UFG, vice-coordenador da atividade “Turismo e Pesca” do Programa “Araguaia Vivo 2030” da TWRA/FAPEG.
Leandro Silveira – Biólogo e Doutor em Biologia Animal pela Universidade de Brasília (UNB), fundador e presidente do Instituto Onça Pintada (IOP) e pesquisador associado do PPBio Araguaia (CNPq).
Sebastião Pegoraro Monteiro Guimarães – Bacharelando em Biologia pela Faculdade Estácio e Pescador Científico.
Cristiane Gonçalves de Moraes – Professora da Universidade Evangélica de Goiás – UniEVANGÉLICA. Pesquisadora do programa “Araguaia Vivo 2030” da TWRA, do PPBio Araguaia (CNPq) e do SARDI/WWF (South American River Dolphin Initiative).
