Resposta está no exercício da atividade jornalística, que exige compromisso com a informação, algo inexistente na realidade virtual de defensores de A ou B

Ataques aos profissionais de imprensa Glenn Greenwald (The Intercept) e Patrícia Campos Mello (Folha de S.Paulo) abusam de mentiras e invenções para tentar manchar a honra de profissionais éticos e sérios | Fotos: Vinícius Loures/ Câmara dos Deputados e Caíco de Queiroz

Houve uma inversão de valores e atenções que não chega a ser novidade na história do mundo. Quando um veículo de comunicação noticia algo que depõe contra a imagem de completa correção de um político ou figura pública que um grupo de pessoas trata como salvador da pátria, começam a surgir informações falsas ou distorcidas sobre a vida do jornalista responsável pelo conteúdo que desagradou a claque de A ou B na internet.

Os jornalistas Glenn Green­wald (The Intercept) e Patrícia Campos Mello (Folha de S.Paulo) têm sofrido bastante com um exército de revoltados on-line insatisfeitos com revelações do trabalho sério e criterioso do jornalismo profissional no Brasil.

As matérias sobre o disparo pago de mensagens durante a campanha presidencial de 2018 e as conversas por aplicativo entre o ex-juiz Sergio Moro, membros do Ministério Público Federal no Paraná e a Polícia Federal tiraram o sono dos apoiadores incondicionais de todos os atos da Operação Lava Jato e do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Deslizes 

Até mesmo quando se tratam de atos ilegais revertidos em instâncias superiores, como áudio obtido por um grampo entre uma presidente da República e um ex-presidente.

E para atacar a honra dos profissionais de imprensa, ao invés de focar no objeto das revelações jornalísticas de investigação, pesquisa, busca de entrevistas e checagem de fatos, a militância revoltada se apega a qualquer informação que encontra para tentar contra-atacar os fatos noticiados.

Adota como verdade até ataques do presidente Jair Bolsonaro à honra de Patrícia Campos Mello ao insinuar, de forma violenta, machista e mentirosa, que a repórter teria dado o furo pela reportagem.

No caso de Glenn Greenwald, até dizer que a doença da mãe não era tão grave foi afirmado por um blogueiro. O resultado da ofensa sem sentido contra uma mulher que estava com câncer e quatro meses depois morreu veio com a condenação a pagar indenização no valor de R$ 15 mil ao jornalista.

Mentiras contra jornalista chegam ao nível mais baixo possível no Congresso

Irresponsabilidade

O mesmo blogueiro condenado por mentir sobre a doença da mão do jornalista é apontado como autor de “alentada reportagem” que teria comprovado que Greenwald teria conhecido o marido e deputado federal David Miranda (PSOL-RJ) enquanto produzia filmes pornôs no Rio. As publicações insinuam, como se fosse verdade, que Miranda seria garoto de programa quando conheceu o jornalista.

Entendemos que a vontade de se apegar a qualquer oportunidade de desmerecer o trabalho sério e criterioso de um jornalista vencedor de um Pulitzer é grande. Chega a coçar o dedo para agredir verbalmente ao usar aspas para tratar o jornalismo no Brasil porque a informação lida não agrada um grupo de militantes que defende incondicionalmente a direita ou a esquerda.

Mas é preciso aprender com Glenn Greenwald e Patrícia Campos Mello, jornalista mais premiada do Brasil em 2019, que o primeiro trabalho básico de qualquer jornalista é o da pesquisa. E bastam cinco minutos de busca na internet para verificar que o texto assinado por Hugo Alves e Oswaldo Eustáquio, a “alentada reportagem”, não passa de uma grande mentira.

Há, inclusive, na publicação de Alves e Eustáquio no dia 8 de agosto de 2019 no site Agora Paraná um link de onde os dois teriam retirado as informações de que Greenwald se mudou para o Rio com o propósito de produzir filmes pornôs.

Desatenção intencional?

O curioso é que basta clicar no link do texto do New York Daily News, assinado por Dareh Gregorian, de 26 de junho de 2013, para perceber que a tal fonte citada na “alentada reportagem” de Oswaldo Eustáquio, “um jovem chamado Tony”, não existe ou é feita qualquer citação a esse nome. Publicação, inclusive baseada em um e-mail enviado por “DomMascHry31”.

Inclusive, o conteúdo da publicação norte-americana só cita o Rio de Janeiro uma vez para dizer que Greenwald mora na capital fluminense porque é lá que vive o então namorado. “Greenwald lives in Rio, because that’s where his boyfriend is. His tax problems didn’t drive him away.”

A assim chamada “alentada reportagem” por militantes, que insistem em fazer os ataques mais baixos possíveis por não aceitar que a imprensa continue a fazer seu trabalho sério e revelar casos suspeitos de atuação ilegal dos ditos heróis nacionais, não conseguirá parar o trabalho sério de jornalistas – corretamente sem uso de aspas, porque são de fato, formação, profissão e atuação jornalistas –, não pode ser chamada nem de material jornalístico. Muito menos de corajosa ou destemida.

Alerta

É por isso que o autor do texto foi condenado uma vez pelas invenções criminosas que faz na internet contra Glenn Greenwald. Deveria servir de alerta para defensores incondicionais de ex-juízes, ministros e presidentes e ex-presidentes da República: cuidado para não ser o próximo.

A liberdade de expressão deve ser defendida acima de qualquer coisa. Mas a responsabilidade de quem produz, publica e compartilha conteúdo reconhecidamente falso para atacar a honra de alguém deve ser exemplarmente identificada e punida.

Sabemos que a vontade dos novos justos e salvadores do Brasil, que não passam de falastrões e mentirosos, adoraria ver Glenn Greenwald preso e Patrícia Campos Mello desmoralizada. Pena que você, na tentativa de incriminar alguém que não tem culpa nenhuma por sua vontade de não enxergar a realidade, se rebaixe ao mais inaceitável ato desumano da ofensa gratuita com invenções das mais violentas e incompreensíveis.

Tentativa ilegal

Até tentaram enquadrar o direito de sigilo da fonte garantido legalmente ao jornalista. Mesmo balançado, o Poder Judiciário não teve coragem de ignorar a lei para abrir ação penal contra Greenwald por fazer seu trabalho da forma mais correta e ética possível. Você consegue dizer o mesmo ao reproduzir, compartilhar e assinar embaixo de mentiras que lhe satisfazem?

Um procurador do Ministério Público Federal tentou forçar a barra para incriminar o jornalista, mesmo sem investigação ou indiciamento pela Polícia Federal. Há quem tente até atribuir à destituída ex-presidente Dilma Rousseff (PT) uma suposta discussão sobre a não comprovação da Teoria da Relatividade, de Albert Einstein.

Vale lembrar que há registos do guru da gestão Bolsonaro, o astrólogo-filósofo autodidata Olavo de Carvalho, a chamar os estudos do físico alemão de “falsificações científicas”. Que tal interpretar algo com base em informações verdadeiras baseadas em construções de realidade honestas?

https://www.youtube.com/watch?v=XIkn6-U0ZHE

Esclarecimento dos fatos

Enquanto Glenn Greenwald, que já respondeu diversas vezes sobre as mentiras inventadas por Oswaldo Eustáquio, Patrícia Campos Mellos e centenas de outros jornalistas comprometidos com os fatos continuam a bem cumprir seu trabalho de esclarecer os acontecimentos à população, militantes seguirão na busca por realidades paralelas. Muitas vezes bem acima do limite das mentiras suportáveis.

Os conspiracionistas e criadores de mundos confortáveis à visão confusa dos iludidos não deixarão de existir. Eles se multiplicarão aos montes. Mas precisam saber que, vez ou outra, serão processados e obrigados a arcar com suas irresponsabilidades.

Quem ofende a honra alheia de forma gratuita e usa da mentira para ofender hoje, amanhã pode estar em um tribunal a ouvir um magistrado lhe sentenciar a botar a mão no bolso para arcar com sua desumanidade não justificável por motivos ideológicos.

Atenção

E aqui não interessa se o mentiroso, seja ele réu primário ou reincidente, é ex-ocupante de cargo público ou um anônimo. Até na internet, que muitos pensam ser território livre, as leis valem e tudo tem limite.