Entraram para os anais da política as palavras de Dilma Rousseff: “Não acho que quem ganhar ou quem perder, nem quem ganhar nem perder, vai ganhar ou perder. Vai todo mundo perder”. Apesar de parecer confusa, a fala da ex-presidente da República e atual presidente do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), o chamado ‘banco do BRICS’, tem um sentido claro: independente de um dado resultado, todos os envolvidos no processo, até mesmo os vitoriosos, sairão prejudicados. A máxima pode ser aplicada, inclusive, ao pleito eleitoral de 2024, mas com um sentido exatamente oposto: os ganhadores saíram com os louros, mas mesmo aqueles disputaram e não conseguiram se eleger podem ter saído melhores do que entraram, e fortalecido para as próximas eleições.

Não restam dúvidas sobre os maiores ganhadores do pleito: Ronaldo Caiado e seu grupo. A base do governador conseguiu eleger mais de 100 prefeitos em Goiás primeiro e segundo turno, incluindo todos os municípios da Região Metropolitana de Goiânia. Caiado, inclusive, quebrou um tabu de quase 40 anos – o de que governadores não conseguem eleger prefeitos na capital goiana – e comemorou, radiante, a vitória de seu candidato, Sandro Mabel, sobre o adversário bolsonarista, Fred Rodrigues. E com uma ampla margem de diferença: mais de 70 mil votos. Presente maior para quem pretende disputar o Palácio do Planalto em menos de dois anos não há.

É justo dizer que a eleição de Mabel não foi surpresa. As pesquisas de intenção de voto, incluindo a do instituto Opção Pesquisas, já apontavam uma vantagem do agora prefeito eleito sobre o oponente no segundo turno (indicando também uma virada, uma vez que Fred largou na frente de Mabel na conclusão do primeiro turno). O que sobressaltou muitos, isso sim, foi o resultado obtido pelo senador Vanderlan Cardoso, do PSD, no pleito. O político, que aparecia em primeiro ou segundo, às vezes em terceiro lugar, nos levantamentos de intenção de votos divulgados ao longo da campanha do primeiro turno, acabou ficando em… quinto.

O pessedista ficou atrás de Fred Rodrigues, Sandro Mabel, Adriana Accorsi e Matheus Ribeiro, à frente somente do atual prefeito, Rogério Cruz, e do Professor Pantaleão. Nem Vanderlan e nem seu entorno tinham grandes expectativas de que ele fosse eleito, mas também não esperavam que a votação de um senador da República, que já havia concorrido à Prefeitura de Goiânia e que contava com uma boa estrutura de campanha tivesse um desempenho tão pífio.

Como se não bastasse, Vanderlan também foi derrotado em Senador Canedo: sua esposa e ex-primeira-dama do município ficou em terceiro lugar na corrida, atrás de Fernando Pellozo, que foi reeleito pela base caiadista, e da Doutora Cristiane Pina, que ficou em segundo. As perdas foram imensas, e o receio sobre o impacto disso no futuro político do pessedista foi grande. Mas há de se dizer: Vanderlan é político experiente, o chamado “macaco velho”, e sabe, como ninguém, usar limões em uma limonada.

No segundo turno, Vanderlan e seu entorno não se demoraram a declarar apoio a Mabel, mergulhando de cabeça na campanha do então candidato. Havia, é claro, a opção de neutralidade, ou até mesmo de apoiar Fred Rodrigues (vale lembrar que Izaura Cardoso, esposa de Vanderlan, é suplente do senador bolsonarista Wilder Morais, presidente do PL em Goiás), mas o pessedista apostou no “cavalo certo” e pode, com isso, ter marcado o início de uma volta por cima após o fracasso do pleito municipal e, quiçá, uma aproximação efetiva com o governador Ronaldo Caiado.

Outro que, mesmo derrotado, saiu inegavelmente maior do pleito foi o próprio Fred Rodrigues. A campanha do bolsonarista foi marcada por revés atrás de revés – desde a exposição do diploma inexistente (Fred afirmava que era formado em Direito na PUC Goiás, mas a própria universidade negou a informação), até a denúncia de que ele teria assumido um cargo na Assembleia Legislativa se baseando nessa graduação fictícia -, e mesmo assim o bolsonarista saiu do segundo turno com pouco mais de 283 mil votos. O ex-deputado, é claro, sai mais forte da corrida e com certeza se lançará na próxima, possivelmente ao cargo de deputado federal (com chances reais de ser eleito).

Ex-prefeito de Aparecida de Goiânia, Gustavo Mendanha também entra para o rol de políticos que fizeram as apostas certas nestas eleições. Acusado por adversários de ter “traído” o atual prefeito de Aparecida, Vilmar Mariano, ao não apoiá-lo, Mendanha investiu todo seu capital político na eleição de Leandro Vilela e o resultado não poderia ser melhor: Leandro Vilela saiu vitorioso tanto no primeiro turno quanto no segundo, quando teve 63,60% dos votos e foi eleito o novo prefeito aparecidense. Mais um candidato da base governista que derrotava um bolsonarista, no caso em questão, o Professor Alcides.

Não poderia haver prova maior da influência política e eleitoral de Mendanha do que a eleição de Leandro Vilela, e é praticamente certo que o ex-prefeito já tenha começado a se preparar para concorrer ou ao Senado Federal, ou ao cargo de vice-governador na chapa de Daniel Vilela.

Vilela, por sua vez, é um dos nomes que passaram e passarão a ter cada vez mais destaque. Respeitando o protagonismo do governador no papel de líder das articulações do grupo, e ao mesmo tempo cumprindo com êxito as “missões” a ele repassadas (que vão desde a construção e coesão dos grupos políticos da base governista no interior do estado – atuação decisiva no alto número de prefeitos eleitos pela base em Goiás – e a condução de projetos ambiciosos, como a reforma do estádio Serra Dourada e a atração de investimentos internacionais para o estado), Daniel Vilela tem preparado bem seu “traje de candidato ao governo”, fazendo jus à posição de sucessor natural de Caiado em 2026.

Assim como o vice-governador, os líderes do Legislativo, tanto estadual quanto municipal, viram nas eleições deste ano uma chance de colocarem suas forças políticas à prova – e conseguiram. Romário Policarpo, presidente da Câmara Municipal de Goiânia, teve papel essencial na eleição de Sandro Mabel. Vice-presidente do SindiGoiânia e nome respeitado e ouvido dentro do funcionalismo público, Policarpo pode ser considerado um dos maiores responsáveis pela aproximação efetiva do prefeito eleito com os servidores, garantindo uma expressiva fatia de votos a ele. Quanto a Bruno Peixoto, presidente da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego), é inegável o impacto de suas articulações para apoios a Mabel tanto no primeiro quanto no segundo turno.

Ambas as lideranças já teriam planos para a política, e já estariam trabalhando neles. Peixoto já adiantou que deve se lançar na corrida ao Congresso Nacional em 2026. Quanto a Policarpo, não será surpresa se o presidente do Legislativo goianiense, disputar a cadeira de prefeito da capital no próximo pleito municipal.

Ainda no Legislativo, destaca-se, na esquerda, o nome do Professor Edward, ex-reitor da UFG e o segundo vereador mais bem votado destas eleições. A votação expressiva de Edward sem sombra de dúvidas deve servir de impulsionador para o parlamentar cargos mais altos – e muito provavelmente no próximo pleito. Há quem diga que o ex-reitor pode tentar uma vaga na Câmara Federal em 2026. Do mesmo jeito, Major Vitor Hugo, vereador mais votado em Goiânia neste ano. Assim como Edward, as chances de o ex-deputado bolsonarista entrar na corrida ao Congresso em 2026 são altas.

As eleições deste ano foram, também, teste de força para 2026 e 2028. E mesmo sem mandato, só saiu perdedor quem se manteve distante ou neutro no processo eleitoral. Bons líderes não ficam neutros, e é assim que permanecem no poder.