Sinal raro no centro da Via Láctea pode ser evidência inédita de matéria escura, indica estudo
26 novembro 2025 às 12h49

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Uma análise recente sugere que um sinal incomum vindo do centro da Via Láctea pode representar o primeiro indício direto da matéria escura — componente invisível que compõe cerca de 85% da massa do Universo. O trabalho, conduzido pelo astrônomo Tomonori Totani, da Universidade de Tóquio, examinou dados atualizados do telescópio espacial Fermi, da Nasa, e identificou um brilho em raios gama compatível com o padrão previsto para a destruição de partículas teóricas de matéria escura.
Aceito para publicação no Journal of Cosmology and Astroparticle Physics, o estudo aponta que a emissão aparece como um “halo” de alta energia ao redor do centro galáctico, zona onde a presença de matéria escura seria maior. Segundo Totani, o espectro observado coincide com o nível de energia esperado quando duas partículas conhecidas como WIMPs colidem e se anulam, liberando fótons extremamente energéticos — partículas básicas de luz que podem ter baixa ou altíssima energia.
As WIMPs, principais candidatas a explicar a matéria escura, seriam partículas pesadas, de movimento lento e interação mínima com a matéria comum, o que até hoje impediu sua detecção direta. Assim, radiações como essas, produzidas em colisões entre elas, seriam uma das poucas formas de identificá-las.
O estudo analisou raios gama de cerca de 20 gigaelétron-volts distribuídos simetricamente em torno do centro da galáxia. Para minimizar interferências típicas do plano da Via Láctea — região com grande concentração de poeira, gás e fontes intensas de radiação — Totani considerou apenas o halo acima e abaixo do núcleo.
Segundo o pesquisador, tanto a distribuição espacial quanto a intensidade da radiação são compatíveis com o perfil previsto para halos de matéria escura. Ele argumenta ainda que fenômenos conhecidos, como pulsares ou nuvens de gás energizadas, não explicam facilmente o padrão detectado. “Se essa interpretação estiver correta, seria a primeira vez que conseguimos ‘ver’ a matéria escura”, afirmou. “Isso também indicaria a existência de uma nova partícula ainda fora do modelo padrão da física.”
Apesar da empolgação, Totani ressalta que o resultado exige confirmação independente. Uma das principais formas de testar a hipótese é buscar o mesmo tipo de sinal em galáxias anãs próximas — ricas em matéria escura e com menos ruído de radiação. Embora o Fermi já tenha observado dezenas delas desde 2008, o número de fótons detectados ainda é insuficiente para conclusões robustas. A expectativa é que, com mais anos de operação, o telescópio consiga reunir dados suficientes para repetir a análise e verificar se o padrão energético se mantém.
Se confirmado, o achado representaria um marco para a cosmologia e a física de partículas. Até hoje, a matéria escura só pôde ser detectada indiretamente, por seus efeitos gravitacionais sobre estrelas, galáxias e aglomerados. Resolver sua natureza continua sendo um dos maiores desafios científicos do último século.
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