Um episódio de racismo, no último domingo, 16, marcou profundamente a vida de Sandra Regina Martins, gerente de Igualdade Racial do município de Goiânia e ativista há mais de 30 anos pelo Coletivo de Mulheres Negras Samba Criola. O caso ocorreu no tradicional Mercado da 74, espaço que ela frequenta semanalmente para prestigiar o samba e que considera familiar e seguro. 

Sandra reuniu amigos e familiares para comemorar seu aniversário, mas a noite de celebração foi interrompida por agressões verbais e gestos racistas de um homem identificado por ela somente como Ricardo. 

Sandra relata que havia reservado mesas para o evento. Por volta das 18h30, enquanto estava no banheiro, suas netas foram abordadas pelo homem, que mandou que elas se levantassem e retirou uma das mesas. Ao retornar, Sandra questionou a atitude e ouviu dele: “Não, ‘Bombrilzinho’, tá tudo certo. Tá tudo resolvido aqui”, enquanto batia em seu cabelo. 

A gerente do mercado tentou contornar a situação, afirmando que o homem era “caçador de confusão” e oferecendo outra mesa mais à frente. “Seguimos a noite toda, das 6 da tarde até às 9 da noite”, conta Sandra. 

Já próximo das 21h, Sandra foi novamente interpelada. Ao tentar passar pelo corredor, o homem bloqueou sua passagem e disse: “Não, para você passar tem que pedir licença, viu?”. Sandra respondeu: “Ah, moço, sai da minha frente”, empurrando a mesa dele e seguindo. 

Pouco depois, durante o show, o agressor voltou. “Ele desabotoou a calça, desceu a calça e fez um pum. Daí me cutucou para eu olhar, porque eu não estava nem olhando para ele. Eu estava conversando com um amigo que estava ao meu lado. [O agressor] ainda me cutucou para eu olhar e fez assim aqui para vocês, ó”, descreve. 

Veja o vídeo abaixo.

Sandra afirma que ficou em choque. “Sabe quando você fica tão passada com o que aconteceu? Eu olhei para o Rick e falei: ‘O que aconteceu?’. Ele disse: ‘Você não viu?’”, indagou.  

Indignada, ela gritou: “Chama a polícia, eu tenho um racista aqui!”. O homem fugiu, deixando a companheira para trás. Amigos de Sandra conseguiram registrar a placa do carro. 

Sandra registrou boletim de ocorrência na Delegacia Estadual De Atendimento à Vítima de Crimes Raciais e De Intolerância – Goiás (DEACRI) e recebeu apoio da administração do mercado, que forneceu imagens das câmeras de segurança e o nome do agressor. A divulgação pública só ocorreu dias depois, quando o mercado conseguiu restabelecer a internet e liberar as filmagens. 

“Desde segunda-feira eu já tinha feito o boletim de ocorrência. Só ontem conseguimos publicizar porque só ontem a filmagem foi liberada”, explica. 

Impacto emocional 

A ativista afirma que o episódio a deixou profundamente abalada. “Eu não paro de chorar, não consegui trabalhar mais. Eu falo tanto de racismo, mas na hora eu não consegui me defender desse homem”, disse. 

Como eu vou ter capacidade de falar para os adolescentes sobre racismo se eu não consegui me defender deste racismo?

Ouça abaixo.

Ela também destacou a presença das netas. “Eu estava com minhas duas netas, duas crianças. Tanto que eu acho seguro lá, tanto que eu acho lugar familiar. E aconteceu isso”, contou. 

Sobre os insultos ao seu cabelo, Sandra aponta emocionada: “Meu cabelo não é ‘Bombril’. Meu cabelo é caro, é cuidado. Eu gasto muito para manter meu cabelo bonito como ele é”, afirmou. 

Ampla divulgação

Sandra defende que o caso seja amplamente divulgado. “Racismo é crime. Quem comete racismo precisa pagar por isso. Não é só verbalmente, é pagar preso. Se fosse uma mulher branca, ele não teria feito isso. Eu não aceito o que ele fez comigo. Eu quero que a justiça seja feita. Eu vou exigir que a justiça seja feita. Quero que isso seja publicizado, quero que a cara dele apareça”, finalizou. 

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