Por intermédio do prefeito de Goiânia, Rogério Cruz, o partido está sugerindo que deve ser chamado à mesa para negociar uma vaga na chapa majoritária

Em Brasília há uma aristocracia da política. Para pertencer a ela não é preciso de título de nobreza, e sim de mandato de deputado federal e senador. Quem não tem mandato, na capital construída por Juscelino Kubitschek, é plebeu, quer dizer, não tem acesso ao poder — exceto, é claro, se pertencer a algum lobby poderoso.

Marcos Pereira, presidente do Republicanos | Foto: Reprodução

Entretanto, como se sabe, desde o “rei” da Bahia, Antônio Carlos Magalhães, só é forte na corte quem é forte na província. Quem é fraco na província se torna plebeu na corte.

O partido Republicanos, diz-se, é dirigido pelos líderes e epígonos da Igreja Universal — como o poderoso Marcos Pereira, deputado federal que tem as portas do Palácio do Planalto abertas desde sempre, tanto que já foi ministro do governo de Michel Temer (MDB). Pode-se falar em autonomia relativa do partido em relação à IURD? Talvez. Porque, com seu crescimento, o partido não conta mais tão-somente com integrantes da Igreja. O presidente da legenda em Goiás, o deputado federal João Campos, é integrante da Igreja Assembleia de Deus.

Daniel Vilela e Rogério Cruz, prefeito de Goiânia | Foto: Reprodução

O fato é que o Republicanos é um partido forte e em ascensão — conta com 32 deputados federais e dois senadores. Mas quer ampliar sua fatia de poder, e a batalha começa pelos Estados.

Então, a crise entre o Republicanos de João Campos e do prefeito de Goiânia, Rogério Cruz, e o MDB de Daniel Vilela não resulta de mera picuinha (é preciso enxergar para além da árvore e capturar o contexto; a imprensa parece presa ao disse-me-disse). Trata-se de uma luta política com componentes nacional — daí a presença de aliados de Marcos Pereira na cidade — e local.

Nacional porque o Republicanos quer ampliar sua bancada de deputados federais e senadores. Acredita-se que, em Goiás, o partido, se jogar pesado, poderá eleger João Campos para o Senado e pelo menos dois deputados federais — o pastor e deputado estadual Jefferson Rodrigues e o ex-prefeito de Itumbiara José Antônio da Silva Netto, conhecido como Zé Antônio, para deputado estadual. Jefferson Rodrigues é o nome da Igreja Universal. Zé Antônio é bancado por João Campos.

João Campos e Jefferson Rodrigues: jogando para 2022 | Fotos: Reprodução
Protagonista na batalha eleitoral de 2022

Mas a luta se dá no terreno local, é claro. Por isso, ao “expurgar” ou “esvaziar” o MDB, retirando-lhe o poder de mando — o que o Jornal Opção anunciou antecipadamente (em janeiro!) —, o Republicanos está afiançando que será protagonista na disputa eleitoral de 2022.

O Republicanos mostra, desde já, que é um play e que possíveis candidatos a governador, como o governador Ronaldo Caiado (Democratas) e Jânio Darrot (Patriota), terão de convidar seus líderes, como João Campos, Jefferson Rodrigues e Rogério Cruz, para sentar e conversar à mesa.

Se mantivesse o MDB como peça decisiva na Prefeitura de Goiânia, inclusive com poder de nomear e fazer pagamentos, o Republicanos não teria condições de ampliar sua estrutura, sobretudo ao negociar com líderes de partidos que, na agora agá, poderão bancar a postulação de João Campos ao Senado. É isto que explica o esvaziamento do emedebismo e, por extensão, de Daniel Vilela.

Por que Daniel Vilela pode ser cotado para vice de Ronaldo Caiado e Joao Campos não pode ser cotado para senador na chapa do governador? O que o Republicanos está dizendo, via ações de Rogério Cruz, é que o Republicanos quer espaço e tem como exigi-lo. O partido, por meio de seus líderes, não está brincando em serviço.

As ações recentes, resultados de costuras nacionais e locais, foram geradas por uma engenharia política inteligente. O Republicanos está dizendo que não é subsidiário do MDB e que se Daniel Vilela quiser um lugar em alguma chapa majoritária — como vice ou candidato a governador — terá de lutar por si, com o apoio do emedebismo, mas não dos deputados João Campos e Jefferson Rodrigues e do prefeito Rogério Cruz.

A morte de Maguito Vilela e a aposentadoria de Iris Rezende deixaram um vazio político, em termos de liderança, que ainda não foi preenchido. Mas não há vácuo, em termos políticos, que dure para sempre. A cúpula do Republicanos percebeu a oportunidade, entendeu que o espaço estava vazio e decidiu ocupá-lo.

O que o Republicanos está sublinhado, convém repetir, é que, para 2022, vai jogar alto — e quer ter um nome na chapa majoritária. O nome do político é João Campos e o partido que vê-lo na disputa para senador.

O Republicanos é “dono”, por assim dizer, de três PIBs: a Prefeitura de Goiânia — que, a rigor, é um mini-Estado, com uma arrecadação fabulosa (note-se que só o programa de recapeamento das ruas, que foi suspenso, tem 600 milhões de reais) —, uma força considerável no meio evangélico (que se estende da Igreja Universal à Assembleia de Deus) e um deputado federal, João Campos, além de um deputado estadual, Jefferson Rodrigues, e três vereadores em Goiânia. E o partido está no poder numa cidade que tem quase 1 milhão de eleitores e cuja administração reverbera em todo o Estado.

Se Rogério Cruz for bem como prefeito de Goiânia — se não se tornar uma espécie de Marcelo Crivella do Cerrado, a tendência será o Republicanos chegar muito forte para a disputa de 2022.

Na semana passada, tanto Rogério Cruz quanto João Campos operavam alianças políticas com o Pros de Eurípedes Júnior, o Podemos de Eduardo Machado e Felipe Cortês, o Cidadania de Lincoln Tejota (a vice não interessa ao Republicanos para a disputa de 2022) e outros partidos. Não se está tratando, no caso, de busca pela governabilidade, e sim de aliados para o próximo pleito eleitoral.

Fica, por fim, a pergunta: quem vai apoiar Rogério Cruz para a disputa da reeleição em 2024, daqui a 3 anos e alguns meses? O MDB dificilmente o apoiará e, por isso, terá de buscar novas composições. Mas verdadeiros políticos são pragmáticos e pouco dados à retórica e à especulação sobre um futuro relativamente distante. Eles acreditam que cada eleição tem sua própria história, portanto suas articulações e negociações. Quando chegar em 2024, se sair forte em 2022 — por exemplo, elegendo João Campos para o Senado, dois deputados federais e uns dois ou três deputados estaduais —, o Republicanos será outro partido, ainda mais forte.

Deve-se sugerir, aos que lidam com política como se fosse alguma coisa pessoal, que o Republicanos está jogando com rara habilidade política, com profissionalismo. Está usando sua força, derivada da Prefeitura de Goiânia, para ampliar seu espaço político. Está jogando — e bem. Reduzir a força do MDB é aumentar a própria força. É isto.