Principal aliado de Mendanha em Aparecida é contra cota para mulheres na política

06 fevereiro 2022 às 00h01

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André Fortaleza impediu que Camila Rosa falasse. A vereadora não recebeu a solidariedade pública de Gustavo e Mayara Mendanha
O presidente da Câmara Municipal de Aparecida de Goiânia, André Luís Carlos da Silva (MDB), conhecido como André Fortaleza, notabilizou-se, antes de ser vereador, como açougueiro — era conhecido como “Faca de Ouro” (dada sua habilidade no corte de carnes). Num de seus discursos, teria dito que é um homem rico, porém, no site do TSE, aparece como dono unicamente de uma motocicleta Honda Titan CG 150, de 2011, no valor de 4 mil reais (nem a Casa de Carnes Fortaleza, em Aparecida, mereceu registro). Informou ao TSE que é “divorciado”.

Político popular, “de muita coragem” e “discurso afiado” — segundo um colega de Câmara —, André Fortaleza foi o vereador mais votado do pleito de 2020, com 3.702, superando o popularíssimo Gilsão Meu Povo (Gilson Rodrigues da Mata, do MDB), que conquistou 3.213 votos. “André Fortaleza é ‘brutão’, não tem papas na língua, mas é bom de acordo político, é firme e articula com habilidade”, afirma um secretário do prefeito Gustavo Mendanha (sem partido).
André Fortaleza, dado seu “arrojo pessoal” e “invasivo”, é um político que tem inimigos. Um deles é o vice-prefeito de Aparecida, Vilmarzinho Mariano, do Podemos.
Como vai assumir a prefeitura, daqui a 56 dias, Vilmarzinho Mariano articulou para lançar um candidato a presidente da Câmara de seu grupo político. Entretanto, suspeitando da “lealdade” do vice-prefeito, Mendanha articulou pela manutenção de André Fortaleza no comando do Legislativo.
A permanência de André Fortaleza, reeleito com muita antecedência, é um recado do desconfiado Mendanha para Vilmarzinho Mariano. Com o ato, sem precisar explicitá-lo com palavras, o prefeito “disse” o seguinte: se você me “trair”, passando para o lado do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), e se abrir a caixa-preta da minha gestão, nós, com André Fortaleza à frente, podemos derrubá-lo via impeachment… e por qualquer motivo.

Com a musculatura reforçada pela articulação de Mendanha, André Fortaleza se sentiu empoderado e passou a jogar ainda mais duro com os vereadores. Recentemente, num ato brutal, cortou o microfone da vereadora Camila da Silva Rosa, do PSD — a décima mais votada de 2020.
Camila Rosa, política serena e uma empreendedora — produz verduras e é feirante —, é pré-candidata a deputada federal, com o apoio da cúpula do PSD (leia-se Vilmar Rocha e deputado federal Francisco Júnior). Na Câmara, é conhecida pela calma, elegância e educação. Nunca maltrata colegas e funcionários. Sua força advém não do físico — afinal, não é tão forte quanto André Fortaleza — e da capacidade de gritar e ameaçar. Advém, isto sim, de suas ideias e projetos para melhorar o mundo.

A crise política, que se tornou pessoal, dada a brutalidade de André Fortaleza — repudiada em várias partes do país —, tem a ver, claro, com o fato de que Camila Rosa vai disputar mandato de deputada federal e o vereador também deve ser candidato. Como ela é popular, e conta com o apoio decisivo de seu partido, ele certamente teme fracassar. Daí a explosão. Porém, esta é uma parte do problema. A outra é que homens às vezes avaliam que podem silenciar as mulheres gritando, batendo na mesa ou cortando o microfone para que não possam ter voz. Do alto de sua fragilidade, Camila mostrou força e não recuou. Chorou, é certo, ante a falta de cortesia e respeito do colega, mas se manteve firme. Não se abateu e, sobretudo, não se dobrou. Pelo contrário, está buscando o amparo da Justiça, inclusive da Eleitoral, porque o presidente da Câmara está cassando a voz de uma vereadora eleita pelo povo — o que configura crime.
O conflito se deu, num primeiro momento, porque André Fortaleza é contra a cota para mulheres na política. Ele avalia que isto não é positivo. Camila Rosa avalia, pelo contrário, que é preciso abrir mais espaço na política para as mulheres.
Camila Rosa recebeu solidariedade pública de mulheres de Goiás e de todo o Brasil — como as deputadas federais Joice Hasselmann e Renata Abreu (presidente nacional do Podemos) —, mas não recebeu a solidariedade, ao menos não publicamente, da primeira-dama de Aparecida, Mayara Mendanha (por sinal, uma mulher de valor, séria).

Mayara Mendanha e Camila Rosa são aliadas e amigas. Entretanto, a primeira-dama não divulgou nenhuma nota de solidariedade. O motivo: o maior aliado do prefeito Mendanha em Aparecida é André Fortaleza. Então, em nome desta aliança, Mendanha e Mayara não condenaram a ação desrespeitosa do vereador. A omissão sugere “colaboracionismo”, ou seja, entre Camila Rosa e André Fortaleza, o prefeito e a primeira-dama ficaram com aquele é mais forte, pessoal e eleitoralmente. Quer dizer, sacrificaram valores em nome de interesses eleitorais.

De que adianta defender a família, no discurso e reuniões, mas não ter coragem de defender uma mulher agredida? As eleitoras de 2022, de 2 de outubro, certamente estarão de olho na conduta anti-moderna de Mendanha e de seus aliados. Afinal, André Fortaleza pode não ser uma voz isolada.