Marconi precisaria de alguém fazer com ele o que Lula fez com Moro
26 março 2023 às 00h17
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Provavelmente desde antes de decidir trocar a carreira de juiz pelo cargo de ministro da Justiça de Jair Bolsonaro (PL), Sergio Moro nunca tinha vivido uma semana tão em alta como a que passou. Por ironia do destino, grande parte de seu sucesso se deveu a seu arquirrival – no caso, não seria exagero trocar o termo por “arqui-inimigo”.
Moro hoje é um político, senador da República pelo União Brasil, na vaga do Paraná. Foi uma eleição altamente “polêmica”, já que tinha saído do Podemos às vésperas do fechamento do prazo de filiação, trocou de cargo pretendido – até então não lhe servia outra coisa que não ser presidente – e também, por causa da Justiça Eleitoral, teve de “aceitar” ser candidato pelo Paraná em vez de São Paulo, onde teria mais holofotes.
A sequência de fatos positivos para o senador de primeiro mandato começa com Lula concedendo uma dispensável entrevista ao portal de esquerda Brasil 247 em que a única coisa que repercutiu foi uma mais do que desnecessária inconfidência sobre seu período de prisão: a de que, naqueles dias, pensava que só estaria bem no dia em que “f*desse com o Moro”. Um termo chulo que por si já faria com que a entrevista tivesse virado papo de boteco, mas pior seria para ele – como foi – o capital de exploração política embutido.
E como tudo sempre pode piorar um pouco mais, veio a coincidência da Operação Sequaz, em que as polícias – entre elas a Federal –, o Ministério Público e a Justiça desmontaram um plano do Primeiro Comando da Capital (PCC) para sequestrar e até matar autoridades, entre elas o próprio Sergio Moro – não é de hoje que a extrema direita explora notícias falsas ligando o PT ao narcotráfico e a organizações criminosas.
O ex-juiz já era então, de fato, uma potencial vítima do grupo mafioso, mas Lula pela segunda vez em dois dias, o ajudaria a posar de vítima: em outra entrevista desastrosa, disse que desconfiava que tudo aquilo que fora desbaratado pelas forças policiais – entre elas a própria PF comandada por seu ministro Flávio Dino, da Justiça – poderia ser “armação do Moro”.
Com a tribuna do Senado à sua disposição, Moro tem aproveitado os deslizes do presidente para se cacifar ainda mais. Já é, no mínimo, um nome forte para sucessão do governo paranaense.
Fazendo um exercício de adequação do caso à cena política goiana, seria como se, de repente, o governador Ronaldo Caiado (União Brasil), por exemplo, resolvesse desabafar acerca de seus entreveros com o ex-governador Marconi Perillo (PSDB). E então fizesse declarações infelizes, enquanto o tucano estivesse em situação de certa forma vulnerável.
É uma analogia bastante imperfeita, já que não se pode fazer uma comparação “ética” ou “ideológica” entre Caiado e Lula nem entre Marconi e Moro. Mas são duplas de desafetos que atuam no campo político, disputando o mesmo espaço de protagonismo, numa relação hoje desigual.
Lula deu a volta por cima após a prisão e ocupa o cargo mais poderoso do País. Mas, nos últimos dias, deu a Sergio Moro um protagonismo que este não tinha desde que o havia condenado, em 2018. Na polarização insana em que se transformou a política nacional, o presidente galvanizou, no hoje senador, uma simpatia combalida que ele buscava reconquistar na extrema direita desde que literalmente abraçou Bolsonaro na disputa do segundo turno de 2022.
Político experiente, Caiado já foi muito menos comedido em seus discursos, entrevistas e declarações. O Executivo lhe deu outra visão e hoje jamais daria uma importância política a um a adversário “esquecido”.
Marconi, claro, nunca pode ser considerado carta fora do baralho. Mas, assim como seu partido, nunca esteve tão enfraquecido politicamente. Para voltar ao jogo, precisará achar outro “Lula” para chamar de seu. Não o terá no Palácio das Esmeraldas.