Lula eleito presidente. Como fica para Goiás?

28 outubro 2022 às 14h13

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Nilson Gomes
Domingo, 30 de outubro, 20h. Ainda não foram contados todos os votos, mas a apuração parcial mostra vitória irreversível de Lula da Silva. O presidente Jair Bolsonaro não ligou para o adversário reconhecendo a derrota, mas nas principais cidades cresce a barulheira dos petistas comemorando. A Paulista, mais famosa via urbana do Brasil, está lotada de militantes com bandeiras vermelhas. Em Goiás é mais tímida a manifestação dos lulistas, as quase duzentas avenidas Bernardo Sayão permanecem quietas, até porque Bolsonaro ganhou aqui e nas demais unidades federativas do Centro-Oeste. Adesivos colados em carros de goianos dariam o Oceano Atlântico, os de Lula não ocupariam o hoje detonado Córrego Caveirinha, o curso d’água goianiense no qual a omissão das autoridades, dia após dia, justifica o batismo. Há centenas de projetos em andamento de parcerias firmadas entre os governos federal, estadual e municipais. As maiores lideranças regionais apoiaram Bolsonaro no segundo turno, inclusive o governador reeleito Ronaldo Caiado, 16 de 20 congressistas e mais de 90% dos prefeitos. Quais os reflexos para o Estado e os 246 municípios com a vitória de Lula?
Nenhum.
É incomparável a atenção de Bolsonaro com a de Lula em Goiás. Se as duas gestões tivessem um álbum como o da Copa, a figurinha do atual presidente valeria poucos centavos e a do ex, alguns milhares de reais.
A gente só vê a Janja por foto. A Michelle vai à sede da OVG, à igreja na Fama…
Você está no campo de futebol de Goianápolis, ouve o barulho, olha pra cima, é o Bolsonaro. O motorista vai abastecer num posto perto de Anápolis, entra na conveniência, olha lá o capitão comendo um salgadinho. É motosseata em Goiânia, Jataí e Rio Verde. E assim se repete com ainda mais frequência no Entorno de Brasília. Lula, em oito anos reinando no Palácio do Planalto, não nos deu essa intimidade. O cargo máximo que político goiano conseguiu com Lula foi a presidência da Anvisa para um petista de primeira grandeza, o médico Valdi Camarcio. Alguém vai lembrar que Henrique Meirelles presidiu o Banco Central com status de ministro. Esqueça. Ele não mora em Goiás há bom meio século — major Vitor Hugo é mais goiano.
Portanto, 1 a 0 para Bolsonaro.
No debate liderado pela Band e a Veja, Lula encostou Bolsonaro nas cordas com a pergunta sobre o número de universidades e institutos federais feitos por um e outro. Em Goiás, ambos empatam em 0x0. Lula liberava a papelada. E só. A prefeita Marisa Araújo teve de tomar uma medida extrema: desocupou o prédio da prefeitura para implantar em Uruaçu um IF. Reitores e diretores das instituições federais de ensino superior gastavam tempo e paciência nos gabinetes de deputados e senadores em busca de verbas. Então, Bolsonaro e Lula foram avessos à Educação em Goiás. Integrantes da bancada goiana rogavam a Lula por universidades federais em Jataí e Catalão. Nada. O senador Wilder Morais insistiu com Dilma por Universidade Federal do Sudoeste (em Jataí), do Sudeste (em Catalão), do Sul (em Itumbiara), do Norte (em Porangatu), do Entorno do Distrito Federal (em Cidade Ocidental). Discursava na tribuna, lembrava nas comissões, visitava, pedia, rogava, se humilhava. Dilma liberou as duas primeiras. Mas foi ela. Lula? Nada. Bolsonaro? Também não.
A partir de fevereiro, Wilder estará de volta ao Senado e vai retomar a batalha pelas universidades federais que ainda não conseguiu. Se for Bolsonaro: vai ficar feito carrapato, grudado. Se for Lula: vai ficar igual a chulé, no pé.
No quesito obras, logo vêm à mente os R$ 13 bilhões enviados por Dilma Rousseff em 2013. Pois é, foi a Dilma, não o Lula. Com ele, Goiás viu a vó pela greta — e não foi a Garbo nem a Thunberg.
Dilma duplicou a BR 060 de Goiânia a Jataí. Pois é, foi ela, não ele. Lula mal concluiu pequenos trechos da 153 de Goiânia a Itumbiara e da 060 de Anápolis a Brasília. Ainda assim, a conta-gotas de massa asfáltica. Bolsonaro está com projetos e inícios de pavimentações, porém nada ainda marcante. Dilma ia duplicar a 153 de Anápolis ao Tocantins. A empresa vencedora da licitação já havia se instalado, maquinário na área, quando foi tragada pela Operação Lava-Jato. Voltou tudo ao início. Um dos efeitos de a 153 ser pista simples é a carnificina. Morrem mais goianos em acidentes nas BRs que ucranianos nos bombardeios russos. Uma das vítimas (em 2011) foi a prefeita Marisa, que fez em conjunto com o senador Demóstenes Torres o mais belo teatro de arena do Centro-Oeste, na beira do lago de Serra da Mesa.
A construção da Barragem do Ribeirão João Leite, que abastece Goiânia, é reivindicada por Lula e pelo ex-governador Marconi Perillo. Nem tico nem taco, segundo dois estudos, um de âmbito nacional, outro internacional: “A construção da Barragem João Leite e os reflexos nas áreas de abrangência do reservatório” apresentado no IV Congresso Brasileiro de Gestão Ambiental (Salvador-BA, 2013) por Maria Aparecida Neves Martins e Marcos Antonio da Silva.
“Projeto Básico Ambiental da Barragem e do Reservatório de Regularização e Acumulação do Ribeirão João Leite em Goiânia, Goiás, Brasil”, Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental (San Juan, 2004), Caio Antônio de Gusmão e José Carlos Valsecchi.
Ambos informam: “Para as obras de construção foi firmado contrato entre a Saneago e o BID, órgão financiador de 50% dos recursos financeiros da obra, através do contrato 1414/OC BR”.
Quando começou, o presidente ainda era Fernando Henrique Cardoso.
Em dois anos, Michel Temer fez mais pelo saneamento de Goiás que Bolsonaro, Lula e FHC em 20 — o ministro da área nomeado por Temer era o goiano Alexandre Baldy, mesmo motivo que faz com que o pai de Michelzinho goleie Lula e Bolsonaro também em moradias.
Lula para Goiás foram oito anos de nada. Bolsonaro, quase quatro de coisa nenhuma. Destravou a Ferrovia Norte-Sul, que está travada por diversas inadequações.
Resumindo a operação: se Bolsonaro ganhar, coitado de Goiás; se o eleito for Lula, tadinho de Goiás.
Ou não: quem sabe o vencedor, que virá de oito ou quatro anos de esquecimento, tenta se redimir…
O relacionamento de Caiado com Bolsonaro poderia ser a prática do slogan do major Vitor Hugo, “Goiás de mãos dadas com o Brasil”. Vai sonhando… O relacionamento de Caiado com Lula poderia afastar a ideologia e irem “juntos pelo Brasil e por Goiás”, como pregava Wolmir Amado. Vai tendo pesadelo… O eleitorado, novamente, afastou nas urnas a federalização das campanhas e deixou os candidatos de Lula (Wolmir) e do capitão (o major) a ver navios no Meia-Ponte e jetisqui no Caveirinha — se viu as motos náuticas no reservatório do João Leite não está delirando.
Qualquer que seja o eleito, Goiás estará bem. Se for Bolsonaro, estará melhor, pois talvez inclua no ministério alguns (fala-se em dois) goianos. Se for Lula, tanto faz, pois o anapolino que emprestamos ao mundo, Meirelles, é nome certo na Economia. E Goiás sofreu na mão pesada de Paulo Guedes, viu…
Nilson Gomes é advogado, escritor e jornalista.