Haraquiri de Roberto Naves: prefeito opera pró-Gomide, esquerda, contra Márcio Corrêa, da direita
15 setembro 2024 às 00h00
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O União Brasil lançou uma candidata a prefeita em Anápolis, Eerizânia Freitas, tecnicamente consistente. Seu marketing fez duas tentativas pala alavancá-la. Primeiro, escondeu o prefeito Roberto Naves, do Republicanos. Não deu certo. Segundo, o repôs no palco da postulante. De novo, não deu certo.
Roberto Naves é um prefeito ruim e Anápolis piorou na sua gestão? Não. De maneira alguma. O líder do Republicanos é um prefeito que contribuiu para o crescimento da economia da cidade. Os demais municípios estão crescendo, por uma série de fatores, mas Anápolis permanece com o segundo maior PIB de Goiás — atrás apenas do de Goiânia, que, sendo a capital, conta com 1,4 milhão de habitantes, o que impacta, em larga escala, os serviços (que superam o agronegócio na formatação do Produto Interno Bruto).
A candidata “de” Roberto Naves é Eerizânia Freitas, mas isto não significa, necessariamente, que os eleitores estão avaliando os dois. Talvez seja o contrário. Os eleitores estão avaliando, possivelmente, dois outros candidatos: Antônio Gomide, do PT, e Márcio Corrêa, do PL.
Nos processos eleitorais, há a tendência de os eleitores avaliarem apenas dois candidatos, o que gera a polarização — como está ocorrendo em Anápolis.
Projeto central do prefeito de Anápolis
Do ponto de vista da análise política, é imperativo perguntar: se Eerizânia Freitas está praticamente fora do jogo, por que o, digamos, ressurgimento de Roberto Naves? Em suma, qual é o jogo do prefeito, um dos políticos mais astutos de Goiás — tanto que foi eleito, em 2016, e reeleito, em 2020?
Há indícios de que, inclusive passando por cima das clivagens ideológicas, Roberto Naves talvez esteja cometendo o que se pode chamar de haraquiri (ou suicídio) político.
Qual é o objetivo de Roberto Naves na eleição de 2024? Não parece ser eleger Eerizânia Freitas. Pois, sagaz como é, sabe que a postulante do União Brasil talvez seja um caso perdido.
Então, o objetivo de Roberto Naves é, sobretudo, trabalhar para tentar derrotar Márcio Corrêa, candidato apoiado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, do PL, e pelo vice-governador de Goiás, Daniel Vilela (que assumirá o governo daqui a dois anos), do MDB. Portanto, o prefeito articula contra os dois — o que poderá afetar seus projetos políticos futuros.
Por que Roberto Naves, se opera contra Márcio Corrêa, da direita, acaba por apoiar, direta ou indiretamente, Antônio Gomide, da esquerda? Não é fácil responder à questão.
Diz-se que Roberto Naves teme que, se for eleito, Márcio Corrêa promova uma profunda auditoria nas contas da prefeitura. Pode ser. Mas talvez a questão seja outra.
Roberto Naves sempre foi de direita? Na verdade, não. Com o apoio de seu ex-líder Jovair Arantes, ele trabalhou no governo do PT, em Brasília. Mas é fato que, como tantos políticos, migrou da esquerda (ou o centro) para a direita.
O que Roberto Naves mais teme, provavelmente, é a cristalização de um líder jovem na política de Anápolis. Se for eleito em 2024, Márcio Corrêa tende a ser candidato à reeleição em 2028. Contra quem? Roberto Naves, cujo perfil é mais de Executivo do que de Legislativo.
Por isso, se contribuir para impedir a ascensão de Márcio Corrêa agora, Roberto Naves não o terá pela frente em 2028. Talvez acredite que seja mais fácil vencer, no pleito seguinte, Antônio Gomide.
(Na semana passada, chegou-se a comentar, em Brasília, nas rodas palacianas, sobre a possibilidade de intervenção federal em Anápolis. Porque duas pessoas foram assassinadas e as investigações patinam. Então, se a Polícia Federal entrar no jogo, com autorização da Justiça Federal e apoio do governo de Lula da Silva, os fatos poderão ser esclarecidos mais rapidamente, talvez até antes das eleições. Se isto acontecer, os dois casos sairão do âmbito das versões e poderão voltar ao terreno dos fatos. Há quem queira encobrir a verdade a respeito das mortes escamoteando e plantando pistar falsas? A PF, se entrar no jogo, poderá esclarecer o que realmente está acontecendo. Doa a quem doer.)
Roberto Naves apoiará Lula ou a direita em 2026?
Voltando a Antônio Gomide, que, de fato, foi um administrador eficiente em Anápolis. Se o petista for eleito, na disputa de 2026 ele estará no palanque do presidente Lula da Silva, que, se tiver saúde, disputará a reeleição. Se ajudar o petista a ser eleito Roberto Naves contribuirá para fortalecer a candidatura de Lula da Silva. É uma questão de lógica cartesiana, e não de emoções à flor da pele.
Márcio Corrêa apoiará a candidatura de Lula da Silva em 2026? Não, com certeza. Apoiará um candidato da direita, possivelmente Ronaldo Caiado, que, desde já, se apresenta como candidato a presidente da República pelo União Brasil.
Na hipótese de segundo turno em Anápolis, Ronaldo Caiado subirá no palanque de Antônio Gomide ou de Márcio Corrêa? Do palanque do petista não participará. Então, o mais provável é que apoie o postulante do PL.
Como ficará Roberto Naves? Tudo indica que não subirá no palanque de Antônio Gomide, mas certamente estará aplaudindo-o dos camarins. É, repetindo, o que se pode nominar de seppuku ideológico — típico de quem tem projeto político pessoal, mas não de grupo. (E.F.B.)