Entenda por que Ronaldo Caiado precisa de um secretariado mais político do que técnico

06 novembro 2022 às 06h11

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A próxima equipe do governador de Goiás, Ronaldo Caiado, do União Brasil, deve ser mais política do que técnica. Dizer isto às vezes gera certa confusão. Portanto, urge esclarecer: sugerir que será mais política não significa que também não será técnica. Noutras palavras, o que se fará é usar a política para melhorar a qualidade técnica do governo. O objetivo é tornar a gestão mais proativa, eficiente — com resultados mais rápidos e palpáveis para a sociedade.
Um governo com auxiliares mais experimentados — por exemplo, como Vilmar Rocha (na Casa Civil), Alexandre Baldy (na Secretaria da Indústria e Comércio) e Henrique Meirelles (Secretaria de Economia) — liberaria, ao menos em parte, o governador para a articulação política.
Ronaldo Caiado sugere que tem pretensões presidenciais, e há espaço para o gestor e político goiano. Porque, além de administrador competente — recuperou as finanças de Goiás, com austeridade, mas sem deixar de investir, sobretudo no social e em infraestrutura —, é um político nato, de rara habilidade para a articulação.

Em 2026, ao término do governo de Lula da Silva — o petista-chefe disputando ou não a reeleição —, a política do país estará inteiramente aberta. Há nomes que poderão se apresentar para a disputa, como Tarcísio de Freitas, do Republicanos, Eduardo Leite, do PSDB, Guilherme Boulos (a imagem de radical de esquerda o prejudica), do Psol, e o próprio Jair Bolsonaro, do PL. Porém, como representante de uma centro-direita moderna e civilizada — que investe no social e no crescimento econômico, sem dissociá-los —, Ronaldo Caiado poderá se tornar a principal aposta para se contrapor à imagem de uma direita bárbara e tosca. Médico formado no Rio de Janeiro, com especialização em ortopedia na França de Louis Pasteur, deputado federal por vários mandatos, senador por um mandato (ficou quatro anos) e, agora, governador (seguirá para o segundo mandato), trata-se de um político-gestor com ampla experiência.
Ronaldo Caiado pode se tornar uma alternativa de centro e de direita, absorvendo um eleitorado que, a rigor, Bolsonaro não soube conquistar. Porém, antes de qualquer coisa, o líder do União Brasil — hoje, o de maior expressão do partido no país, tendo sido reeleito governador — precisa fazer uma segunda gestão mais arrojada (mais de expansão do que de ajustes), que atraia a atenção do Brasil para Goiás.
Para tanto, Ronaldo Caiado planeja operar um programa social de amplo espectro, com a possibilidade de erradicar a fome em Goiás. Mas não só isto. O que o governador planeja, e já pratica em parte, é uma profunda integração social dos pobres à sociedade (eles estão à margem, em todo o país). Claro que é difícil fazer uma revolução igualitária num único Estado, mas não é impossível.
Dada sua autoridade moral, e sua noção de que o Estado deve servir à sociedade — e não aos privilegiados —, Ronaldo Caiado tem condições de mudar a configuração social de Goiás. E não deixa de ser curioso que se trata de um liberal — digamos, um adepto do liberalismo social, aquele sobre o qual o filósofo e sociólogo José Guilherme Merquior discutiu e teria sugerido a Fernando Collor (que, por certo, não entendeu a proposta).
Não basta, porém, chamar a atenção do Brasil para Goiás, com resultados concretos. O governador tem de se circular pelo país, falando de suas ideias e, sobretudo, de seus feitos — para além da teoria — para galvanizar a opinião pública nacional.
Entretanto, só pode se ausentar, por momentos curtos, se tiver uma equipe azeitada tanto do ponto de vista político quanto do técnico. Por isso, vai montar, certamente, um secretariado mais experimentado e autônomo. Não fará, portanto, um governo tão centralizado quanto o primeiro (porque precisava ajustar a máquina para torná-la eficiente e recuperar sua capacidade de investimento). Será um governo mais aberto, descentralizado, com responsabilidade mais divididas.
Veja-se o caso de Vilmar Rocha. Na Casa Civil, poderá operar a máquina político-administrativa com equilíbrio e ponderação, como é de seu feitio. Mas não só. Há outro Vilmar Rocha pouco conhecido. Trata-se do articulador nacional. Ele é visto, no PSD, como um “orientador” nacional do partido — com diálogo em vários Estados. Em São Paulo, por exemplo, conta com dois interlocutores de primeira linha — Gilberto Kassab, presidente nacional do PSD, e Guilherme Afif Domingos, também do PSD. Os dois são ligados ao governador eleito de São Paulo, Tarcísio de Freitas (cujo vice é do PSD). E Kassab é um dos interlocutores privilegiados do presidente eleito Lula da Silva, do PT.
Em Brasília, devido aos seus vários mandatos de deputado federal, amigos brincam que até as cadeiras e as mesas o “conhecem” e o “cumprimentam”. Noutras palavras, Vilmar Rocha é um político que, além de abrir portas, sabe o quão é importante não arrombar portas abertas.
Então, Vilmar Rocha pode operar pró-Ronaldo Caiado em duas pontas: local e nacionalmente. E, além disso, é um político de ideias — outro liberal que aposta, como o governador, no social. E é um político decente.

Alexandre Baldy é outro político que, mesmo sem mandato, tem força política local e nacional. Ele é extremamente ligado ao Centrão — que, quer queiram ou não os puristas, continuarão dando as cartas na política brasileira. O goiano de Goiânia, aos 42 anos, tem uma experiência política que surpreende — tanto que fala com o ministro Ciro Nogueira (pP) e com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (pP), quando quer. O ex-deputado e ex-ministro é um político conectado, com forte presença nacional. Assim, como Vilmar Rocha, pode operar pró-Ronaldo Caiado em Goiás e no país.
Disputar a Presidência da República, em 2026 — quanto terá 77 anos —, é um dos projetos de Ronaldo Caiado. Ele vai trabalhar para se colocar nacionalmente, para ser avaliado pelos brasileiros. Porém, se o projeto não der resultado, dependendo da conjuntura nacional — há a possibilidade de Jair Bolsonaro voltar a disputar a Presidência em 2026, quiçá galvanizando o eleitorado de direita —, o gestor estadual pode disputar uma das vagas de senador (duas vagas estarão em disputa no próximo pleito).
Vale sublinhar, por fim, que Ronaldo Caiado, como político hábil — e nem sempre sua habilidade é registrada pela imprensa local com a devida percepção —, logo depois do término da eleição, já está operando a remontagem de sua base política, inclusive com a atração de adversários. Porque sabe que um candidato a presidente começa a disputa em sua própria casa, formando uma ampla base de apoio. Enfim, é um político agregador.
Quanto aos técnicos, Ronaldo Caiado tem o maior respeito por eles. Porque sabe que, a rigor, ninguém governa sem seu auxílio (o êxito de seu primeiro governo se deve largamente à operosidade, competência e responsabilidade dos técnicos, como Pedro Sales, Adriano Rocha Lima, Fátima Gavioli e Cristiane Schmidt). O que ele está sugerindo, com suas maneiras discretas, é que, para disputar a Presidência da República, precisa reforçar suas alianças políticas. Mas é óbvio que não transformará seu governo num imenso “partido” político.