Roberto Naves passou apenas uma semana sem partido: o prefeito de Anápolis por dois mandatos deixou o PP no dia 18 e migrou direto para a presidência estadual do Republicanos. A movimentação vira o cenário político de cabeça para baixo, porque inverte a correlação de forças no estado e toca o coração da crise que se estabeleceu na Capital nas últimas semanas. 

À medida que qualquer prefeito se aproxima do final de seu segundo mandato, é natural que sofra certo esvaziamento. Com a perspectiva da troca de poder, aliados se afastam pois já pensam em integrar a próxima gestão, projetos de longo prazo deixam de surgir, a Prefeitura se preocupa com os gastos que já foram contratados – a tinta da caneta seca e o café esfria. Em geral, a melhor perspectiva para prefeitos bem avaliados é fazer um sucessor e passar dois anos sem mandato. 

Em Anápolis, Roberto Naves parecia seguir esse script, pois além de chegar à reta final da gestão na prefeitura, o prefeito havia nascido e crescido politicamente sob a sombra de Alexandre Baldy, presidente estadual do PP que tem relações com a cidade. Baldy não ofereceu oportunidades de crescimento para Naves: nunca o indicou para para chefiar órgãos ou o introduziu à cúpula nacional do PP; e não se sabe se fez isso por discordâncias com Naves ou se quis matar a competição com outra liderança.

O fato é que o partido se tornou um beco sem saída para Roberto Naves. Erroneamente, a crônica política atribuiu a crise à definição do PP de que o vereador Leandro Ribeiro seria o pré-candidato a prefeito da cidade. O desentendimento pode ter passado por aí (afinal, o partido esperava que o atual prefeito apoiasse um sucessor que não fora escolhido por ele). Mas essa definitivamente não foi a origem da tensão, e, na realidade, esse conflito pode ter alterado pouco as coisas, tendo surgido quando Naves já vislumbrava sua saída. 

A raiz da crise passa pelo fato de que Baldy opera uma aliança, política e administrativa, com o governo do PT e de Lula da Silva. Entretanto, sua base política, em Anápolis, opera uma aliança bem diferente — com o bolsonarismo. O descompasso foi revelado em matéria do Jornal Opção, que revelou que outros membros do partido chegam ao metafórico beco sem saída: “Baldy indica parentes para cargos públicos, no Estado e na Prefeitura de Goiânia, mas não companheiros de partido. Ele está pleiteando um cargo federal para si, mas não indica nenhum aliado”, afirmou um ex-deputado.

Roberto Naves escapou o destino de liderança política sufocada no PP (e mostrou seu talento para farejar oportunidades) quando identificou na crise do Republicanos de Goiânia a chance dar as cartas, mesmo nos anos em que estiver fora da Prefeitura de Anápolis. O ex-presidente do Republicanos em Goiás, Hildo do Candango, estava descontente com o prefeito de Goiânia e membro de seu partido, Rogério Cruz, que tirou espaço da sigla na Prefeitura. O desembarque do governo foi anunciado, com promessas de que o Republicanos abriria mão do comando da cidade mais importante do estado por outro candidato. 

Naves se apresentou como solução e assumiu com a promessa de pacificar a situação. Com as relações que construiu ao longo dos anos à frente do segundo maior PIB de Goiás, é possível que consiga. É uma situação em que ganha o partido e ganha Roberto Naves. Em vez de seguir o script do prefeito em fim de mandato, que prometia que Naves passaria os próximos anos interferindo na política de Anápolis, ele agora intervirá em toda a política goiana, selecionando pré-candidatos para todos os municípios.

É irônico que Baldy, na tentativa de suprimir o aliado por receio de que se tornasse um adversário, tenha o alçado à presidência de um partido concorrente.

(I.C.W)