A hora do estrategista: entenda como Caiado reforça sua base política e desmonta as oposições

04 junho 2023 às 00h00

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O jornalista só entende a política, a do dia a dia, com suas articulações e reviravoltas — as especulações às vezes se tornam fatos e, não raro, o que parecem fatos são especulações —, quando começa a pensar como os políticos.
Há repórteres que, ignorando as especulações, apreciam publicar tão-somente aquilo que aconteceu, ou seja, o que é anunciado. O que está “movendo” nos bastidores, gerando os fatos, é, quase sempre, ignorado.

Veja-se um caso exemplar: o governador Ronaldo Caiado, do União Brasil, não para — é uma máquina de fazer política. Porém, como articula — com habilidade — nos bastidores, o jornalismo raramente percebe o que está planejando e fazendo, exceto quando faz os anúncios públicos. É por isso que os jornais estão se repetindo, ao publicar apenas as ditas favas contadas. Os jornais dão aquilo que todos dão, ou seja, o óbvio ululante. Uns podem até publicar furos, mas deixando de explicitar como um fato se insere num contexto, num ambiente político mais amplo.
Examinemos uma questão, conectada a outras, é claro.
Fernando Pellozo, o prefeito de Senador Canedo, é, digamos assim, uma “árvore”. Gustavo Mendanha, ex-prefeito de Aparecida de Goiânia, é outra “árvore”.
Não há nenhum enigma. O que se está dizendo é que Fernando Pellozo, recém-filiado ao União Brasil, e Gustavo Mendanha, que se filiará ao MDB, são árvores, e das mais importantes, por causa do significado da filiação. Mas não são a floresta.
Então, aquele que perceber a árvore, entretanto, sem enxergar a floresta — o quadro geral em que a árvore está inserida —, não vai entender as movimentações políticas de Ronaldo Caiado, o maior estrategista político que surgiu em Goiás nos últimos anos.
Quando examina o quadro político, Ronaldo Caiado percebe as árvores, observa seus movimentos — a força dos ventos que as “movem” — e, pensando na floresta, começa a agir como estrategista, sem deixar de ser, no comportamento, republicano.
Em 2021, havia uma árvore frondosa na floresta política goiana. Trata-se de Daniel Vilela, presidente do MDB. O jovem político havia enfrentado Ronaldo Caiado na disputa pelo governo do Estado, em 2018, e ficou em segundo lugar, superando o candidato da base governista, o então governador José Eliton, do PSDB.
Ronaldo Caiado tomou uma decisão: aproximou-se de Daniel Vilela e o trouxe para seu lado. De cara, ofereceu-lhe a vice em 2022, sugerindo o quão ele era importante para o seu projeto político.
Ao atrair Daniel Vilela, que representava o novo para 2022, Ronaldo Caiado desmobilizou as oposições — que ficaram sem rumo. O emedebista, cujo partido está enraizado em todo o Estado, fortaleceu aquele que já era forte e, ao ficar ao seu lado, enfraqueceu seus opositores.
Com Daniel Vilela e seus aliados, a floresta de Ronaldo Caiado cresceu e se tornou inexpugnável. Tanto que o governador foi reeleito, e com relativa facilidade.
Como não vai disputar o governo em 2026 — deverá ser candidato a presidente da República (em recente reunião da CPI do MST, movendo as peças com sua habilidade habitual, levou a esquerda a “destacá-lo”, nacionalmente, como um dos grandes nomes da direita) —, Ronaldo Caiado poderia reduzir suas articulações, acomodando-se. Mas não o faz.
O verdadeiro político pensa no grupo e define suas táticas e a estratégia para fortalecê-lo. Por isso, Ronaldo Caiado está em campo, reforçando a floresta sua e de Daniel Vilela para 2024 e 2026. Ele percebeu, com o máximo de clareza, que precisa conectar, numa sintonia fina, as duas eleições.
A primeira tacada de mestre foi a atração da “árvore” Gustavo Mendanha. O ex-prefeito de Aparecida perdeu a eleição para governador, mas foi bem votado e saiu com alto capital político. Tanto que, se pudesse disputar mandato na sua cidade, seria eleito pela terceira vez. E não deixa de ser curioso que também aparece como nome forte para a disputa da Prefeitura de Goiânia.
As oposições certamente pensavam em Mendanha para a chapa majoritária de 2026 — como candidato a governador, vice ou senador. Pois, dada a ação de Ronaldo Caiado e Daniel Vilela, o ex-prefeito agora pertence à base governista — o que a fortalece e, ao mesmo tempo, enfraquece as oposições.
Comenta-se que o empresário Wilder Morais (PL), com seu ar de sacristão de paróquia do interior, planeja disputar o governo de Goiás em 2026. Por não ser nenhum néscio, o senador sabe que não terá o apoio de Ronaldo Caiado, que, desde já, costura uma nova aliança para bancar Daniel Vilela para governador.
Sem Mendanha, Wilder Morais terá de contar com Vanderlan Cardoso, Major Vitor Hugo e Gustavo Gayer — uma espécie de exército de Brancaleone. Ir para uma batalha eleitoral contra um candidato bancado por Ronaldo Caiado unicamente com o trio é o que se pode caracterizar, quem sabe, de suicídio político. Se Wilder Morais fugir da raia, por cálculo político, que ninguém se surpreenda. Mais inteligente seria, para não ficar isolado, solamente só, resguardar-se para 2030.

Citemos, agora, Fernando Pellozo. A conquista do prefeito de Senador Canedo — cidade com mais de 150 mil habitantes e um eleitorado grande, e em ampliação — é mais do que aparenta. Primeiro, o governo passa a ter uma presença mais ativa no município, agora com o gestor municipal filiado ao União Brasil. Segundo, se Vanderlan Cardoso fechar uma aliança com Wilder Morais, para 2026, não levará junto Fernando Pellozo. Quer dizer, as oposições estão sendo minadas desde já.
Pelo que se comenta nos bastidores, novos prefeitos migrarão, em breve, para as bases do governo — filiando-se ao União Brasil ou ao MDB (a prefeita de Itaberaí está de malas prontas para se filiar ao partido dirigido por Daniel Vilela).
Registre-se, por fim, o caso do PSD. Depois de pressionar o presidente nacional, Gilberto Kassab, Vanderlan Cardoso conseguiu derrubar Vilmar Rocha do comando do PSD em Goiás. Eles conversam, por causa dos salamaleques da cultura “cordial” do país, mas as arestas ficaram. Vilmar Rocha não tem simpatia alguma por Vanderlan Cardoso — o político dos negócios — e este não tem simpatia alguma por aquele, o político das ideias. Se toleram, e é só.
Em 2026, o grupo de Vilmar Rocha — a bancada ética do PSD — acompanhará Daniel Vilela como candidato a governador. Não irá com o candidato de Vanderlan Cardoso — possivelmente Wilder Morais.
Recentemente, Francisco Júnior assumiu a presidência da Codego, órgão do governo do Estado. O cargo, que fique bem claro, não é do PSD de Vanderlan Cardoso. É de Vilmar Rocha, que, por sinal, não quis ter cargo, optando por indicar o ex-deputado federal.
Portanto, parte da floresta do PSD — aquela irrigada por Vilmar Rocha e Francisco Júnior — está integrada à floresta de Ronaldo Caiado e Daniel Vilela.
A faceta de Ronaldo Caiado como estrategista — aquele que mexe as peças políticas de seu grupo e intervém, direta ou indiretamente, nas oposições — merece registro mais adequado da imprensa. Mas, como se disse acima, é preciso ver as árvores, mas também para além das árvores. É preciso verificar o conjunto, a floresta, ou florestas. (E.F.B.)