Por A.C. Scartezini
O tempo e espaço no cronômetro dos três presidenciáveis com chance de chegar aos votos do segundo turno dentro de três semanas
[caption id="attachment_17008" align="alignright" width="620"] Aécio Neves cresceu nos últimos e voltou ao páreo
Marina Silva viu seu fôlego acabar, mas tem chance[/caption]
O tucano Aécio Neves ou Marina Silva (PSB/Rede)? A definição da dupla que iria ao segundo turno presidencial com Dilma Rousseff é o suspense que ficará até a noite de hoje, quando as urnas abrirem a boca depois de uma semana com sucessivas pesquisas de opinião eleitoral até o último momento.
Aos poucos, Aécio se aproximou da cotação marineira, sendo que a diferença entre eles caiu a cada uma das seis rodadas divulgadas pelo Datafolha desde setembro. Na primeira delas, Marina tinha a vantagem de 20 pontos. A diferença a favor da candidata chegou a três pontos na quinta-feira, 2. Ao mesmo tempo, outras seis avaliações do Ibope viram a vantagem marineira cair de 18% para 5%.
As perdas marineiras da época foram arrebatadas por Dilma? É possível, nas contas aritméticas das pesquisas. No Datafolha, a reeleição cresceu 5%. No Ibope, a presidente subiu 3%. Esses números demonstram, de quebra, que a pontuação de Dilma teria chegado ao teto e parado por ali no intervalo de um mês, numa indicação forte de segundo turno.
Retornemos à aritmética. As perdas sucessivas de Marina justificariam os ganhos não apenas de Dilma, mas também de Aécio. Se ela perdeu 17 pontos no Datafolha e 13 no Ibope, Aécio ganhou sete no primeiro e quatro no segundo. Dilma faturou, respectivamente, 5% e 3%.
A soma do lucro de Dilma e Aécio, juntos, foi a oito pontos no Datafolha e sete no Ibope. Como Marina emagreceu 17% e 13%, respectivamente, a sobra possivelmente a favor dos dois principais concorrentes é de nove pontos no Datafolha e seis no Ibope.
Portanto, o espólio de Marina pode explicar o avanço numérico da concorrência. Considere-se ainda que cada um dos dois institutos de pesquisa trabalha com a margem de erro de 2%, que pode ser para cima ou para baixo.
No período, no Datafolha, os votos nulos ou brancos caíram de 6% para 5%. Os indecisos desceram de 7% também para 5%. Os outros sete candidatos, somados, caíram de 5% para 3%. Entre eles, a perda geral foi traumática. Proporcionalmente, a evasão de eleitores chegou a 20%.
Na mesma época, no Ibope, os nulos ou brancos subiram um ponto: foram a oito. Os indecisos subiram dois pontos, foram a sete. Os outros candidatos, somados, subiram de dois pontos para três, numa expansão de 50%.
Enfim, as votações dos três candidatos nas pesquisas de quinta-feira, 2. O Datafolha atribuiu a Dilma o estacionamento em 40%. Marina desceu três degraus em uma semana e ficou com 24%. Aécio subiu outros três no período e chegou a 21 – empate técnico com Marina. A rejeição a Dilma foi a 32%; Marina, 15%; e Aécio, 21%.
No Ibope, também no intervalo de uma semana, Dilma subiu de 32% para 40%, numa coincidência com o placar do outro instituto. Marina, desceu de 29% para 24%, como no Datafolha. Aécio continuou estacionado em 19%, taxa inferior em dois pontos em relação ao outro instituto. A rejeição a Dilma ficou em 37%; Marina, 31%; e Aécio, 32%.
[caption id="attachment_17004" align="alignright" width="620"] Delação premiada do ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa assustou a presidente, inclusive nos debates[/caption]
De tanto ouvir falar em corrupção no governo, a presidente Dilma Rousseff (PT) incorporou a palavra ao vocabulário de referência a obras da própria gestão. “Todo mundo pode cometer corrupção”, respondeu Dilma ao ser questionada sobre os escândalos na Petrobrás e ação eleitoral dos Correios a favor de sua reeleição, na noite do debate da TV Globo, iniciado na quinta-feira, 2.
A corrupção não é novidade, mas chama a atenção o fato de que Dilma abandonou, naquela noite, o uso do eufemismo malfeito quando se refere a roubo de dinheiro público na era PT. “Não quero no governo quem esteja comprometido com malfeito'”, prometeu demitir pessoas delatadas pelo ex-diretor Paulo Roberto Costa como membros de corrupção na Petrobrás.
No contexto de uma entrevista exclusiva em oito de setembro, a presidente incluía o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, teoricamente gestor da Petrobrás e que sumiu de circulação há um mês, desde que vazou a delação de Costa ao Ministério Público e à Polícia Federal. Talvez ele apareça hoje para votar em Edison Lobão Filho (PMDB) ao governo do Maranhão.
“Eu demiti esse ex-diretor que agora está envolvido”, repetiu Dilma, na Globo, a mentira sobre Paulo Roberto Costa, que propalou antes em outro debate na TV Record. Na realidade, Costa pediu demissão da diretoria de Abastecimento da petroleira, como consta de registro em ata de uma reunião do conselho administrativo da empresa. A anotação inclui elogios do conselho a Costa.
Afastou-se em abril de 2012, mas continuou a participar do cotidiano da Petrobrás, no governo Dilma. Mesmo sem operar formalmente, Costa, amigo de Lula desde que o petista passou a trabalhar no Planalto em 2003, recebeu pelo menos 228 telefonemas da empresa. A informação consta de relatório sobre a quebra de seu sigilo bancário.
Às vésperas da eleição de hoje, surgiram informações que comprometem o esquema empresarial de Lula e o PT. Uma delação de Costa indicou que, entre 2010 e 2011, recebeu depósito de 23 milhões de dólares (R$ 57 milhões) em sua conta na Suíça. O dinheiro saiu das empreiteiras OAS e Odebrecht, sócias na montagem da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco.
Outro vazamento da Polícia Federal informou que a empreiteira Camargo Corrêa pagou R$ 40,9 milhões a duas empresas controladas pelo doleiro Alberto Youssef para lavar dinheiro arrecadado na corrupção da Petrobrás, GFD Investimentos e MO Consultoria. A manobra incluiria uma triangulação com a empresa Sanko Sider.
O doleiro Youssef seguiu o exemplo de Paulo Roberto, conterrâneo paranaense, e aderiu, na quinta-feira, à delação premiada para reduzir a pena de punição pelos rombos na Petrobrás, inclusive com a devolução de dinheiro. Os vazamentos da fala de Youssef prometem irrigar a campanha da oposição num provável segundo turno da eleição presidencial.
[caption id="attachment_17000" align="alignright" width="620"] A acusação, às vésperas da votação, diz que o presidente dos Correios, Wagner Pinheiro, foi a BH estruturar campanha petista[/caption]
O projeto de poder do PT esbarra novamente em corrupção na operação dos Correios. Em maio de 2005, os tucanos, na oposição ao governo Lula, montaram no Congresso a CPI dos Correios, gerada a partir de uma fita de vídeo onde um empresário gravou a entrega de propina ao dirigente Maurício Marinho, indicado pelo PTB do Rio para garantir a governabilidade pelo PT.
Era tão pouco dinheiro que coube no bolso do paletó de Marinho. Mas no andar da carruagem, revelou-se o escândalo da formação da base aliada ao Planalto a partir da compra, com dinheiro público, de apoio no Congresso. Era tanto dinheiro que a CPI dos Correios mudou de nome. Passou a ser CPI do Mensalão e deu no que deu. O PT assume o crime até hoje.
Havia tanto requinte que a expressão mensalão foi criação do próprio denunciante do plano, o então deputado Roberto Jefferson, presidente do PTB e responsável pela indicação de Marinho como arrecadador de dinheiro para o partido nos Correios. Entregou o esquema para se defender. Hoje, Jefferson cumpre pena em presídio no Rio por conta de seu mensalinho.
Agora, se descobriu que o PT, sem ser discreto, mobilizou o pessoal dos Correios em Minas para apoiar a reeleição da presidente e a escolha do companheiro e petista histórico Fernando Pimentel a governador. A ideia é forçar a derrota no Estado do presidenciável e mineiro Aécio Neves (PSDB) e seu candidato ao governo, Pimenta da Veiga.
Com essa ideia na cabeça, o presidente da estatal, companheiro Wagner Pinheiro, deixou Brasília e foi a Belo Horizonte participar de uma reunião eleitoral com funcionários da empresa para instruí-los a agir na campanha. No auditório lotado, Pinheiro se integrou à plateia para seguir uma exposição do companheiro e deputado estadual Durval Angelo sobre o trabalho.
Em sua fala, Angelo atribuiu os 40% de apoio com que a reeleição da presidente conta em pesquisas no Estado são possíveis por causa do “dedo forte dos petistas dos Correios”, mobilizados a seu favor. “Se nós hoje temos a capilaridade da campanha do Pimentel e da Dilma em toda Minas Gerais, isso é graças a esta equipe dos Correios”, comunicou o deputado.
A presença de Pinheiro autorizou a abordagem da mobilização eleitoral, mas o próprio disse em Brasília, diante de toda a direção nacional da estatal que não havia nada de mais naquela reunião porque era noturna, fora do expediente. Atribuiu a repercussão do caso a Aécio Neves:
— A candidatura dele está atacando a imagem institucional dos Correios, tentando manchar a imagem junto à população brasileira.
Aécio levou a questão para a campanha eleitoral no país junto com a denúncia de que os Correios boicotaram a entrega em Minas de 5,6 milhões de correspondências a eleitores do PSDB em Minas. Ao mesmo tempo, a estatal teria favorecido a distribuição de 4,8 milhões de panfletos do PT pelo Estado de São Paulo.
Num eventual segundo turno presidencial, o caso continuará na campanha com o PDSB de Aécio ou o PSDB/Rede de Marina Silva. Ambos denunciaram a ação dos Correios ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Acusam a presidente Dilma de manipular eleitoralmente a estrutura dos Correios.
As pesquisas do Ibope e Datafolha indicam que não há mais espaço para oscilações súbitas nas preferências por Dilma, Marina e Aécio
[caption id="attachment_16346" align="alignright" width="620"] Jorge Pontes: “O apequenamento que sofremos foi de cabeça pensada” | Rose Brasil[/caption]
Ex-diretor da Interpol, o delegado aposentado Jorge Barbosa Pontes, em artigo publicado em jornal em defesa da Polícia Federal, respondeu a uma fala da presidente Dilma sobre a disposição do governo em investigar escândalos na Petrobrás. Na abertura do artigo Barbosa se dirige a Dilma:
“A presidente Dilma Rousseff diz que são os órgãos de seu governo que estão investigando os escândalos de corrupção da Petrobrás. Tal assertiva desconsidera que a Polícia Federal é uma instituição permanente do Estado brasileiro, transcendendo este ou aquele governo.”
Na frase seguinte o delegado acusa a presidente de manipulação politica. “Trata-se de uma corporação que vem conseguindo bons resultados em razão da abnegação de seus quadros de servidores”, denuncia Barbosa e prossegue:
— O que vem sendo observado, com razoável frequência é o empenho do governo em controlar politicamente as ações da Polícia Judiciária da União. Poderíamos citar algumas dessas medidas, sempre levadas a cabo disfarçadas em “atos de gestão”.
O delegado menciona um decreto assinado por Dilma em 2012 e que impõe à Polícia Federal autorização prévia do Ministério da Justiça à concessão de diárias a servidores em missão. “Com 123 unidades no país, para atender 5.561 municípios, a PF se vê refém do governo federal ao ter suas missões indiretamente monitoradas”, protesta contra o controle de ações quase sempre sigilosas.
Em entrevista no dia seguinte, o delegado Barbosa, acusou o governo de tentar desmontar a PF. “Acho que essa desconstrução, esse apequenamento que sofremos foi de cabeça pensada”, suspeitou. “Entre 2004 e 2007, alcançamos andares da criminalidade de uma forma que não estava sendo esperada”, emendou. Sutilmente, referiu-se à investigação do mensalão durante a reeleição de Lula.
As manifestações de Barbosa coincidiram com o protesto do vice-presidente Michel Temer, na quinta-feira, sobre a suspeita do PMDB de ação manipulada da Polícia Federal para intimidar o candidato do partido a governador do Maranhão, senador Lobão Filho.
Segundo amigos que estavam com Lobão, 10 homens da PF abordaram o grupo, na noite de quarta-feira, no aeroporto de Imperatriz. Com armas em punho, os policiais teriam revistado as pessoas, carros, malas e o avião da campanha. Provavelmente em busca de dinheiro para caixa dois.
Aparentemente sem saber disso, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, afirmou na manhã seguinte, em Guarulhos, que, quando a PF investiga aliados do governo, pessoas pensam que o “ministro perdeu o controle da polícia”. Mas, quando os investigados são adversários, creem que “a Polícia Federal está sendo instrumentalizada”.
À tarde, Temer, afirmou que o PMDB repudiava a intimidação. “No Estado democrático de direito é inadmissível que forças policiais sejam instrumentalizadas para atingir candidaturas legitimamente constituídas.”
Detalhe: Cardozo e Temer usaram o raríssimo adjetivo instrumentalizado. É claro que o vice, por ironia, quis repetir o termo do ministro, a quem atingiu.
Ao discursar nas Nações Unidas, a presidente Dilma Rousseff sinalizou a intenção de usar o combate à corrupção com maior frequência, na propaganda eleitoral, numa forma de autodefesa contra as denúncias que surgem em coincidência com a campanha pela reeleição. O pronunciamento, na quarta-feira, incluiu três vezes a palavra corrupção como marca de empenho numa nova atitude de governo. Anunciou que sua gestão trava “combate sem tréguas à corrupção”. Em seguida pegou o mote e ensinou aos representantes de 120 países, reunidos na ONU, como se faz o combate: — A história mostra que só existe uma maneira correta e eficiente de combater a corrupção: o fim da impunidade com o fortalecimento das instituições que fiscalizam, investigam e punem atos de corrupção, lavagem de dinheiro e outros crimes financeiros. A fala da candidata coincidiu com o fim da negociação entre o Ministério Público e o doleiro Alberto Youssef, preso pela Operação Lava Jato, pela adesão dele à delação premiada, como aconteceu com Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobrás. Os primeiros depoimentos de Youssef mencionaram a participação de políticos em escândalos na petroleira. Agora é esperar o vazamento de confissões do doleiro, que se juntarão às de Costa. Aí, o risco à reeleição de Dilma, que preventivamente incluiu na agenda eleitoral o tema corrupção como se a ação da Polícia Federal fosse uma obra do governo. Não foi bem assim. O Planalto trabalha para travar vazamentos, especialmente agora na temporada de eleições. Há uma reação na PF contra a manipulação eleitoral do governo sobre as ações policiais. Entre os militares, se o pessoal da ativa deve se calar, os aposentados falam pela corporação sem esconder o rosto. O fato começou a se repetir entre policiais. Na quinta-feira, 25, o delegado aposentado Jorge Barbosa Pontes iniciou o processo com a publicação de um artigo em jornal.
[caption id="attachment_16342" align="alignright" width="620"] Delegado da Polícia Federal, Ricardo Hiroshi Ishida: mandado por Dilma para apurar os erros de divulgação do Pnad | Divulgação/PF[/caption]
Na reta final para o primeiro turno no próximo domingo, a campanha da presidente Dilma se preparou com zelo para demonstrar o rigor administrativo da candidata no caso do erro do IBGE com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad). Mandou chamar um delegado da Polícia Federal, Ricardo Hiroshi Ishida, para ajudar na investigação de responsabilidade pelo erro.
O delegado tem a missão de investigar no IBGE a origem do erro na Pnad. Trata-se de uma intervenção no Instituto, aparelhado por companheiros da presidente, que agiu com um rigor que apenas agora revela depois de quase quatro anos de governo. Na sindicância, o delegado tem a companhia de dois analistas administrativos, Igor Vinicius de Souza Geracy e Erika Lemância Santos. Em caso assim, ditadura chamaria um coronel. Dilma preferiu um delegado.
Encomendou Ishida e embarcou rumo a Nova York com gente do marketing para registrar o discurso nas Nações Unidas com a propaganda de seu governo e a busca de criação de fatos de campanha. Na tribuna, Dilma discursou com o olhar privilegiando o cinegrafista de seus movimentos eleitorais.
O pronunciamento colocou ênfase na sustentação de que a política econômica está no rumo certo - embora o ministro da Fazenda, Guido Mantega, esteja demitido desde já a partir de 31 de dezembro, conforme aquela promessa de campanha feita por Dilma no início do mês. Seria a salvação do país na crise mundial de 2008, como a presidente discursou na ONU:
— Resistimos às suas piores consequências: o desemprego, a redução de salários, a perda de direitos sociais e a paralisia do investimento.
Um pouco mais adiante, Dilma reconheceu que, mesmo assim, o país não está de todo a salvo. “Ainda que tenhamos conseguido resistir às consequências mais danosas da crise global, ela também nos atingiu, de forma mais aguda, nos últimos anos”, recuou no discurso. Mas aí o problema não seria propriamente nosso, e sim planetário:
— Tal fato decorre da persistência, em todas as regiões do mundo, de consideráveis dificuldades econômicas, que impactam negativamente nosso crescimento.
A favor da atual política econômica, a reeleição conta com outra ênfase na campanha, o baixo desemprego nas maiores cidades. O IBGE divulgou, na quinta-feira, 25, a estabilização em agosto do número de pessoas empregadas ou em busca de trabalho – a chamada População Economicamente Ativa. Em agosto, a PEA subiu 0,8% em relação a julho, foi a 5,7%.
Assim, a taxa de desemprego se estabilizou em 5% nas seis principais regiões metropolitanas do país abrangidas pela pesquisa – São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Salvador, Recife e Porto Alegre. A falta de ocupação total foi de 4,9% em julho; 4,8% em junho; e 4,9% em maio. É a menor média desde a adoção da pesquisa mensal em 2002.
A notícia é boa, mas a origem é suspeita porque o IBGE se tornou caso de polícia desde que Dilma mandou o delegado Ishida investigar o erro nos números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios relativa a 2013, divulgados há 10 dias. A Pnad abrange o perfil socioeconômico do país, com dados sobre o mercado de trabalho, educação e a acesso a bens nas famílias.
[caption id="attachment_16339" align="alignright" width="620"] Presidente Dilma Rousseff: limpou o caixa do Fundo Soberano para salvar imagem de gestão às vésperas do pleito | Foto: Ichiro Guerra/ Dilma 13[/caption]
A cada dia mais próxima das urnas da reeleição, a presidente Dilma revela disposição para raspar o tacho e queimar caravelas que possam servir ao PT como transporte de volta à oposição. É uma espécie de jogo sem volta com efeitos capazes de espantar a própria presidente, além de incomodar o aparelho de Estado.
“Estranhérrimo”, a candidata foi a primeira a espantar-se, de forma inadequada, ainda em Nova York, quando soube por repórteres da repercussão negativa do saque de R$ 3,5bilhões que mandou fazer no saldo do estratégico Fundo Soberano, criado pelo governo há seis anos como uma reserva financeira para momentos de crise.
“É estarrecedor que questionem o uso do Fundo Soberano quando o país cresce menos do que crescia quando o Fundo foi formado”, acrescentou Dilma com sua dificuldade para construir frase harmônica. Ainda pairava no ar o novo rebaixamento da expectativa de crescimento do PIB neste ano. Agora, a três meses do fim do ano, com o índice inferior a 1%: 0,9.
O fundo foi criado para emergências, mas agora a candidata limpa o caixa para salvar a má aparência da gestão das contas públicas a quatro semanas do segundo turno presidencial. O fundo tinha R$ 3,8 bilhões. Agora Dilma levou R$ 3,5 bilhões. Sobraram R$ 300 milhões? Não, menos. Há uma semana, o patrimônio do fundo já estava desvalorizado em 10,7 por cento.
Por isso, espantaram-se técnicos do Banco do Brasil, cujos títulos formam o patrimônio do fundo, mas perdem valor por causa da falta de confiança no governo pelo mercado. A súbita presença de R$ 3,5 bilhões em títulos, à venda no mercado, em momento de crise, pressiona para baixo o valor dos papéis, numa espécie de leilão do banco.
Há dois anos, o Fundo Soberano já perdeu dinheiro, com Dilma, ao abrir mão de ações da Petrobras em troca de papéis do Banco do Brasil, como desejava o governo. O prejuízo rondou os R$ 400 milhões na operação. O espanto do pessoal do banco chegou ao Ministério da Fazenda. Lá, responderam que a venda de papeis do fundo não é certeza, mas possibilidade.
Porém, o mercado acredita na venda para maquiar as contas públicas. Ao sacar a grana de bilhões, a presidente gera uma ilusão. Finge que há equilíbrio fiscal. Cria superávit para fazer de conta que arrecada impostos num valor acima do que queima em gastos primários. Vale tudo em reeleição presidencial. É preferível vender os bens do Estado a cortar despesas.
Para poupar o público que vota para presidente, o aumento do imposto sobre a cerveja e refrigerantes foi adiado mais uma vez. Ficou para o ano que vem. Mais urgente, o novo aumento na conta de luz deve vir depois do segundo turno.
O aumento compensará o rombo de R$ 4 bilhões - superior ao dinheiro que estava no Fundo Soberano – para cobrir a grana gasta no pagamento a empresas de eletricidade na temporada de congelamento de tarifas. Prepare-se o eleitor-consumidor: a conta de luz mensal deve ficar 25 por cento mais cara.
Em nome da armação de uma contabilidade com números mais simpáticos nas contas do governo, mesmo que artificiais, a equipe econômica decidiu fazer de conta que o rombo na Previdência Social será menor do que a expectativa externa.
Para fechar as contas deste ano sem cortar gasto em temporada eleitoral, o Ministério da Fazenda passou a prever o rombo de R$ 40,6 bilhões neste 2014. No mercado, o cálculo é outro. O buraco na Previdência estará acima de R$ 50 bilhões. Sem contar o impacto do novo salário, a despesa com pagamento de precatórios, em novembro, deve exigir algo como R$ 3 bilhões.
O tucano cresceu nas duas pesquisas da semana, pelo Ibope e Datafolha; Dilma subiu no primeiro e estabilizou no segundo; e Marina estacionou Ibope e caiu no outro
[caption id="attachment_15702" align="alignleft" width="324"] Aécio saiu no lucro ao ficar de fora do confronto entre Dilma e Marina[/caption]
As pesquisas sobre os presidenciáveis, reveladas durante a semana, mostram que o tucano Aécio Neves foi o único a crescer no Datafolha e no Ibope. Mas não recuperou o patamar que tinha no Datafolha quando Marina Silva (PSB/Rede) entrou no lugar de Eduardo Campos. Agora, Marina caiu no Datafolha e estacionou no Ibope. Dilma subiu no Datafolha e caiu no Ibope.
A semana começou com o Ibope na terça, 16. Dilma com 36%, em queda de três pontos em relação aos 39% que tinha uma semana antes, quando se divulgou o saque de bilhões de reais pelo PT na Petrobras, delatado pelo ex-diretor Paulo Roberto Costa. Há dois meses, com Marina no jogo, tinha 34%. Marina perdeu um ponto: tinha 31% e foi a 30%. Ao entrar em cena tinha 29%. Aécio subiu quatro pontos: saiu dos 15% e voltou aos 19% de há um mês.
No Datafolha de sexta-feira, 19, Dilma se apresentou estável, com 37%, um a mais do que tinha uma semana antes, os mesmos 36% tinha quando Marina surgiu. Marina apresentou queda de três pontos: desceu de 33% para 30%. Entrou em cena com 21% em agosto. Aécio subiu dois pontos: foi de 15% a 17%. Com Marina no jogo, tinha 20% em agosto.
A rejeição de Dilma é parelha nas duas pesquisas: 32% no Ibope contra 33% no Datafolha. A de Marina é discrepante: de 14% no Ibope foi a 22% no Datafolha, ambas na mesma semana. A rejeição de Aécio está dentro do empate técnico, com a margem de erro de 2% nas duas pesquisas: com 19% no Ibope, subiu a 21% no Datafolha.
Num segundo turno medido pelo Ibope, Marina superaria a Dilma por três pontos: 43% a 40%. No Datafolha, Marina também bateria Dilma, mas por dois pontos: 46% a 44%. Aécio perderia o segundo turno para qualquer uma das duas. No Ibope, Dilma teria 44% contra 37% de Aécio. No Datafolha, Dilma venceria com 49% contra 39% de Aécio.
Analistas do Datafolha, Mauro Paulino e Alessandro Janoni afirmam que Aécio foi quem mais ganhou com o confronto de falas entre Dilma e Marina. Eles escreveram que o tucano saiu no lucro porque esteve fora da guerra entre as duas candidatas e ainda tratou de relacionar ambas ao continuísmo do PT, no qual Marina fez carreira:
– A estratégia da campanha de Aécio de reuni-las (Dilma e Marina) sob o rótulo de continuísmo e de se posicionar como o candidato da “mudança de fato”, parece ter surtido efeito em parte. Em 15 dias, o tucano oscilou positivamente três pontos percentuais, destacando-se entre os mais escolarizados e ricos.
[caption id="attachment_15698" align="alignright" width="620"] Entrevista do filósofo José Arthur Giannotti constrangeu, mas, pelo menos, sacudiu o tucanato em São Paulo[/caption]
Quando vinha a Brasília nos anos 90, o filósofo José Arthur Giannotti se hospedava com honras políticas e intelectuais na residência presidencial do Alvorada, a convite do casal de cientistas sociais Ruth e Fernando Henrique Cardoso. Os três professores de humanidades na Universidade de São Paulo, onde foram expurgados pela ditadura, mas reabilitados com honras.
Giannotti desembarcava na cidade para reuniões do Conselho Nacional de Educação, que integrava com o charme intelectual e político de amigo íntimo e hóspede costumeiro, mas discreto, do casal presidencial. Agora, aos 84 anos, Giannotti provocou constrangimento no PSDB ao romper a antiga discrição com uma entrevista de fim de semana ao “Estadão”.
Incomodado com o desempenho modesto do presidenciável Aécio Neves nas pesquisas, Giannotti acusou o PSDB de não saber se articular como oposição. Diagnosticou que o partido ficou sem discurso desde a guinada do PT de Lula para o centro; e não soube se reorganizar, como o filósofo declarou ao repórter Pedro Venceslau:
— Quando você não tem uma oposição organizada, em geral quem ocupa esse espaço é uma dissidência da base aliada.
Lúcido, Giannotti se referiu a Marina Silva, presidenciável pelo PSB/Rede depois de construir a carreira política no PT. Não é que Aécio acusa a concorrente de ainda seguir uma vocação petista? Pois é. Além do mais, antes de Marina, o candidato do PSB era Eduardo Campos, que saiu da base aliada do Planalto para ocupar o vazio visto pelo filósofo, quando Aécio era o virtual concorrente tucano.
Aécio Neves? “Voltará a ser o que sempre foi: uma liderança, mas não mais a ponta da pirâmide”, previu Giannotti que da eleição presidencial sairá “um PSDB estilhaçado”, tendo paulistas novamente na liderança de um partido dividido. À esquerda, José Serra, agora líder na disputa pela vaga no Senado. À direita, o governador Geraldo Alckmin, virtualmente reeleito.
A fala de Giannotti constrangeu, mas, pelo menos, sacudiu o PSDB em São Paulo. Um grupo de políticos tucanos e empresários amigos se juntou numa reunião social, na noite de terça. FHC, ainda elétrico aos 83 anos (no fim deste setembro, Ruth teria um ano a mais, como o filósofo Giannotti), com base no consenso do grupo, apontou o rumo para Aécio, com eles ali na festa:
— O chumbo grosso deve se concentrar no PT e, portanto, na Dilma.
Na opinião de FHC, o discurso de Aécio, tendo Marina como alvo preferencial, serviria apenas para nutrir a reeleição da presidente petista, mesmo que também vinculasse a ambientalista ao petismo. O chumbo grosso contra Dilma poderia chamar de volta os eleitores que o tucano perdeu para Marina. Ele seria mais uma opção contra o PT.
A reunião de terça foi preparada com cuidado. O pretexto era uma homenagem ao governador Alckmin, mas os tucanos trouxeram de Salvador o prefeito ACM Neto. Ele representava ali a solidariedade do DEM, antigo aliado do partido. Neto se contrapunha ao líder do DEM no Senado, José Agripino (RN), aquele que cedo jogou a toalha e defendeu a adesão a Marina.
Houve planejamento, mas os tucanos também receberam ajuda da sorte. Naquela noite, o país soube da nova pesquisa do Ibope que apontou avanço de Aécio, recuo de Marina e Dilma sem sair do lugar. O presidenciável tucano ressurgia com possibilidade de ir ao segundo turno.
Com o novo prestígio de Aécio, o PSDB pode, no mínimo, negociar uma posição mais forte junto a um futuro governo Marina em troca de apoio no segundo turno da eleição. Com um pouco mais de jogo tático e sorte, o tiroteio da concorrente Dilma contra Marina poderá continuar a conter a rival e, no ricochete, empurrar o próprio Aécio ao segundo turno.
[caption id="attachment_15695" align="alignright" width="620"] Marina Silva tirou vantagem dos ataques petistas e lembrou pobreza da infância
Já Dilma Rousseff ironizou ao dizer que “não chega lá quem se sente coitadinho”[/caption]
As aparências não enganam. A origem social humilde é mais visível na presidenciável Marina Silva (PSB/Rede) do que no robusto figurino da presidente Dilma Rousseff (PT). No entanto, o contrassenso da insistência de Dilma em enfrentar aparências e acusar Marina de tramar o fim dos programas sociais transforma a oposicionista em vítima.
Os petistas dizem que a adversária é que se passa por vítima. Mas quem a induz ao papel no teatro da sucessão presidencial? Marina não se queixa de sua origem, sequer a mencionava antes. É a pressão das mentiras de Dilma e seus marqueteiros que leva Marina a invocar sua infância e adolescência na miséria de um seringal no Acre. Evocar como prova de pobreza.
A seu favor no confronto, Dilma conta com a acomodação da clientela pobre dos programas sociais, que pode considerar que tudo está bom demais nas mãos da presidente, como agora. Se melhorar, pode estragar — desconfiará o cliente passivo diante da promessa de aperfeiçoamento no Bolsa Família vindas de Marina e do presidenciável Aécio Neves (PSDB).
Marina não dispõe da mesma riqueza de imagens ameaçadoras aos pobres filmadas pelo aparelho governista para a propaganda na televisão. Mas possui a fala mais bem articulada entre os principais concorrentes. Além disso, Marina pode manejar a emoção com mais convicção e empatia na persuasão do povo.
Na noite de terça-feira, 16, Marina surgiu na propaganda de televisão com um discurso filmado em comício de Fortaleza. Com emoção, defendeu-se de mais um ataque dilmesco mentiroso. “Nós vamos manter o Bolsa Família! Sabe por quê? Porque eu nasci lá no Seringal Bagaço”, situou a origem na floresta do Acre. Com a voz trêmula, foi em frente:
— Eu sei o que é passar fome. Tudo o que a minha mãe tinha era um ovo para oito filhos, um pouco de farinha e sal com uma palhinha de cebola picada. Eu me lembro de ter olhado para o meu pai e a minha mãe e perguntado: “Vocês não vão comer?” E minha mãe respondeu: “Nós não estamos com fome.” Eles não comiam há mais de um dia.
Antes, no domingo, 14, Marina visitou a pobreza na periferia de Brasília. Assegurou aos pobres que não suspenderia o Bolsa Família e outros programas sociais. Em recado a Dilma, acalmou a petista quanto a retaliação. “Presidente, a senhora fique tranquila que não vai receber de mim o mesmo tratamento que está fazendo comigo”, esclareceu e emendou:
“Quem tem essa história, não na teoria, mas no sangue, no corpo magro, não acaba com o Bolsa Família”, invocou a origem humilde em defesa de política social para a população mais modesta. Na véspera, Marina declarou na campanha que é perseguida pelo governo “por ser filha de pobre, preta evangélica.
Dilma pegou o depoimento da concorrente e convocou a imprensa ao palácio residencial no domingo para criticar a lamúria marineira. “Quem levar isso para campo pessoal não vai ser uma boa presidente”, diagnosticou a angústia de Marina como uma fraqueza impensável na Presidência da República e, com arrogância, sentenciou como se desejasse humilhar:
— Não pode chegar lá quem se sente coitadinho.

A irracionalidade assumiu o poder e levou consigo a oposição, o que impede a restauração da compostura na reta final da sucessão presidencial
[caption id="attachment_15060" align="alignleft" width="189"] Crise na Petrobras serviu para Dilma Rousseff marcar presença l Foto: Ichiro Guerra/ Dilma 13[/caption]
A três domingos do primeiro turno, a voltagem na sucessão presidencial permanece alta e acelera a tensão entre os partidos, confirmada, nas pesquisas de opinião, a estabilidade entre os três principais candidatos. Por coincidência, o PT de Lula e Dilma chega amanhã, segunda-feira, ao último dia do prazo para a troca de candidato, que teria de ser aprovada na Justiça.
A tensão reeditou a disputa entre Dilma e Lula pelo comando da campanha da reeleição.Ambos voltaram a se afastar um do outro no momento em que a revista “Veja” divulgou o novo escândalo de corrupção do PT na Petrobras com a coleta de bilhões de reais entre fornecedores da empresa para a compra do apoio de políticos ao governo.
Era o mesmo filme que se viu no mensalão do governo Lula, mas agora em dimensão mais ampla. Assim que a revista revelou o vazamento da delação premiada de Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da petroleira, Dilma deu um novo passo para se afastar de Lula.
Anunciou, a escolha do Ministro do Desenvolvimento Agrário, o companheiro e amigo gaúcho Miguel Rossetto, para a coordenação da campanha da reeleição, ao lado do presidente do PT, Rui Falcão. No dia seguinte, Lula não compareceu à reunião noturna do comando da campanha para discutir, no Alvorada, o impacto do novo escândalo.
É rotina o sumiço de Lula quando surgem denúncias que acionam o instinto de preservação do ex-presidente. Reapareceu apenas na quinta-feira, ao discursar no comício em Manaus. Os repórteres o viram apenas no palco. Havia uma barreira a proteger o ex-presidente contra jornalistas curiosos interessados em ouvir algo sobre a trepidante Petrobras.
Porém, Lula, se tivesse interesse, poderia participar daquela reunião no palácio presidencial, como esteve em outras. Todas reduzidas a um seleto grupo petista, sem plateia. Acontece que a divisão do poder de Rui Falcão com Rossetto foi uma fórmula de esvaziar a presença lulista na chefia da campanha.
Não chegou a durar um mês a delegação informal que Lula concedeu ao companheiro Falcão para intervir na campanha. A concessão veio naquela entrevista que Falcão, à revelia do Planalto, ofereceu ao jornal “Valor”. Nela, o presidente do PT afirmou que Lula terá uma presença maior num segundo governo de Dilma.
Num primeiro passo, Lula luta para mandar na campanha, o que implica influência também no governo desde logo para orientar mudanças que favoreçam a reeleição da presidente. Num segundo ato, conquistar espaço no novo governo para vigiar Dilma e impedir medidas que prejudiquem a volta dele ao Planalto dentro de quatro anos.
Em sua entrevista ao jornal, Falcão foi claro, como se fosse um porta-voz do companheiro Lula:
“Precisamos eleger a Dilma para o Lula voltar em 2018. Isso significa que ela, reeleita, começa o ciclo de debate, de planejamento para que o nosso projeto tenha continuidade com o retorno de Lula, em 2018, que é a maior segurança eleitoral de que o projeto pode continuar.”
Atrevido, Falcão afirmou que um segundo mandato de Dilma será necessariamente melhor do que o primeiro porque ela “aprendeu muitas lições”. Uma delas seria a de partilhar com Lula decisões do governo. Nessa versão, o ex-presidente não foi protagonista até agora apenas porque desejou, espontaneamente, não ofuscar a sucessora.
Dilma não esqueceu o agravo. Aproveitou o mensalão da Petrobras para marcar presença. Coube a Lula se manter discreto quanto ao avanço de Rossetto e não se afastar da sucessora por muito tempo. O prejuízo político seria maior se ele se afastasse demais do Planalto.