Resultados do marcador: Colaboração dos enrolados

O sistema de colaboração é amplamente usado pelo MPF. Mas até onde vão seu risco e eficácia?
[caption id="attachment_277105" align="alignnone" width="620"] Procurador da República em Goiás, Helio Telho esclarece questão das delações | Foto: Fernando Leite/Jornal Opção[/caption]
Em relatório assinado no dia 11 de agosto e que veio a público no dia 16, a Polícia Federal (PF) concluiu que trecho da delação premiada do ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci, fechada em 2018 em ação contra Lula, não tem comprovação fática. Conforme o delegado federal Marcelo Daher, no relatório da PF, os "fatos delatados por Palocci foram desmentidos por todas as testemunhas, declarantes e por outros colaboradores da Justiça”.
Antes disso, no início do mês, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) também anulou acusações produzidas em conjunto por Palocci e pelo ex-juiz Sergio Moro às vésperas da eleição presidencial de 2018, em ação penal contra Lula. Segundo o ministro Ricardo Lewandowski, "a juntada, de ofício, após o encerramento da fase instrução, com o intuito de gerar, ao que tudo indica, um fato político, revela-se em descompasso com o ordenamento constitucional vigente".
Os acontecimentos envolvendo delações do ex-ministro Palocci trouxeram novamente para o centro dos debates o velho questionamento que nasceu junto com a Lava Jato: até que ponto delações premiadas devem ser usadas e creditadas? Até que ponto elas são úteis para verificar corretamente o dolo, ou não, dos investigados numa operação?
Para o procurador da República e representante do Ministério Público Federal (MPF) em Goiás, Helio Telho, aquilo que ele chama de colaboração é, na verdade, uma moeda de duas facetas. O procurador explica que quando um investigado decide delatar, sua cooperação vira um instrumento de acusação, do ponto de vista de quem é delatado, ou uma tática da defesa, do ponto de vista do delator. Porém, pode ajudar nem um e nem outro.
Tudo depende da situação do acusado e do material coletado pela investigação. “O advogado vai avaliar a situação jurídica do cliente e analisar as opções de defesa. Se ele tiver uma opção que não seja a colaboração que possa trazer uma maior vantagem para o cliente dele, ele vai aconselhar o cliente a não colaborar”, esclarece Telho.
Entretanto, mesmo que o investigado manifeste desejo de colaborar, ele pode não obter sucesso. O procurador relata que se o acordo proposto pelo investigado beneficia apenas o seu lado, oferecendo ao MPF informações já apuradas ou sem base fática, o próprio órgão pode recusar a proposta. “Às vezes, a defesa apresenta uma proposta de acordo que para a acusação não é interessante, porque aquilo que a defesa está oferecendo em termos de colaboração, de informação, de prova, a acusação tem outros meios de conseguir, ou a acusação já conseguiu, ou são coisas que não têm relevância quando comparado com o papel do investigado na organização criminosa”, diz.
Comprovação de informações
Se para comprovar o crime do acusado bastasse a simples palavra, meio mundo de processos já estariam finalizados. Todavia, para se apontar a culpa de alguém, deve-se apresentar provas e esse princípio jurídico também se aplica às colaborações feitas por investigados pelo MPF. Conforme o procurador Helio Telho, sob a ótica da investigação, a colaboração tem por objetivo obter informações e provas que, se não fosse pela colaboração, “ou não se conseguiria ou seria muito difícil, custoso e demorado para se conseguir”. Porém, Telho explica que a palavra do delator só tem validade caso ele apresente, junto aos fatos relatados, evidências que confirmem tudo o que contou aos procuradores. Caso contrário, a simples “boa fé” do colaborador não tem serventia alguma. “O colaborador não é aquele criminoso que se arrependeu de ter cometido o crime. Pode até acontecer isso, mas, via de regra, não é isso que acontece. Ele colabora porque é melhor pra ele”, conta Telho. [caption id="attachment_277106" align="alignnone" width="620"]
O que aconteceu no caso Palocci
Se o MPF cobra evidências das colaborações oferecidas ao órgão por investigados, então como Palocci conseguiu que informações falsas fornecidas por ele fossem homologadas no processo contra Lula? A delação de Palocci foi fechada em 2018 pela própria PF e tem 34 anexos. Nesse anexo que levou a uma investigação aberta em São Paulo, o ex-ministro relatou que André Esteves movimentou no banco BTG, em nome de terceiros, valores recebidos por Lula em crimes de corrupção e caixa 2. Em contrapartida, Esteves teria recebido informações privilegiadas do governo sobre a mudança da taxa Selic, que permitiu que ele tivesse lucro e que usasse parte desses recursos para fazer doações para a campanha do PT em 2014. Porém, o delegado da PF, Marcelo Daher, após investigação, acabou constatando que os fatos narrados Palocci parecem ter sido tirados de "pesquisas na internet" e "notícias dos jornais", sem que sejam apresentadas provas que sustentem a continuidade da investigação. [caption id="attachment_277108" align="alignleft" width="300"]