Eduardo Machado, da coordenação política da campanha, e Aguimar Jesuíno,
fundador da Rede candidato ao Senado pelo PSB, são os nomes locais que se
realçam com a subida fenomenal da ex-petista na sucessão presidencial

Eduardo Machado, presidente do PHS: um dos primeiros a entrar na aliança de Campos e Marina
Eduardo Machado, presidente do PHS: um dos primeiros a entrar na aliança de Campos e Marina

Independentemente do modo incomum e trágico com que isso ocorreu, Marina Silva está de volta ao jogo. E agora manda nele. Após uma vitória eleitoral simbólica em 2010 — conquistar 20 milhões de votos pelo nanico Partido Verde (PT) — e uma tentativa malsucedida de viabilizar seu partido, a Rede Sus­tentabilidade, já para este ano, a ex-senadora petista herda o posto vago no PSB com a morte de Eduardo Campos e se coloca como “tertius” no cenário que provavelmente seria dual entre PT e PSDB.

Mais que isso: Marina está forte como nunca. Claramente, a ex-senadora se nutre dos votos de brasileiros não satisfeitos com a dicotomia política de partidos que dominaram os últimos 20 anos, mas, em termos éticos, têm muita semelhança: acordos questionáveis pela governabilidade, mensalões, pragmatismo econômico. Por sobre essas águas turvas, Marina navega de forma consistente. Desde a tragédia com seu parceiro de chapa, em 13 de agosto, passaram-se menos de três semanas. Os índices de intenção de voto em seu partido, que estavam abaixo da casa dos dois dígitos com Eduardo, com ela subiram para 34% na pesquisa divulgada pelo Datafolha na sexta-feira, 29. Em 16 dias, pelo menos 25 pontos a mais. Um fenômeno que, a despeito do resultado final das eleições — mas principalmente se lhe for favorável —, vai ensejar muitos artigos acadêmicos na área da Ciência Política.

Ninguém inclui o imponderável na hora de fazer planos e firmar estratégias. Dessa forma, o fechamento das coligações para a sucessão presidencial, finalizado em julho, apontava para o que era tendência de vitória em julho. A quantidade e a densidade de partidos políticos presentes em cada aliança expressam um ranking que se dá por uma combinação entre expectativa de poder e viés ideológico (este sempre em menor porcentagem) para cerrar determinada fileira. Assim, Dilma Rousseff entrou na corrida eleitoral com nove partidos (PT, PMDB, PSD, Pros, PR, PRB, PP, PDT e PCdoB); Aécio Neves, também com nove (PSDB, DEM, PTB, SD, PMN, PTC, PTdoB, PTN e PEN); e Eduardo Campos, com seis (PSB, PPS, PHS, PSL, PPL e PRP). Em termos de bancada no Congresso, os números ficam mais claros e díspares: Dilma contaria com 340 deputados e 52 senadores; Aécio, com 118 deputados e 23 senadores; já a aliança de Eduardo, agora Marina, com 28 deputados e 4 senadores.

Dos seis partidos que estão com a candidata agora favorita nas eleições de outubro, metade não tem sequer um representante no Congresso: PHS, PSL e PPL. O primeiro deles é conduzido por uma figura que hoje, em Goiás, é bastante conhecida nos bastidores da política local, mas que tende a se tornar, pela conjuntura formada, um dos nomes influentes na política nacional, caso Marina Silva chegue ao poder: Eduardo Machado, presidente nacional do PHS.

Vindo de uma família abastada, dona da concessionária Jorlan, Eduardo optou pela estrada da política. Na conjuntura para 2014, foi um dos primeiros aliados de seu xará do PSB. “Optamos por questão ideológica com Eduardo, queríamos um caminho diferente”, diz, enquanto inicia uma conversa com a reportagem do Jornal Opção por telefone, da sala de embarque do Aeroporto Santa Genoveva, em Goiânia, na manhã da quinta-feira, 28. Em meia hora ele estará decolando para Brasília, onde terá agenda cheia. “Tem reunião do conselho político às 16 horas, às 19 é com a coordenação da campanha”, relata.

Tem sido assim desde que Marina Silva foi elevada ao posto que era de Eduardo Campos. A nova candidata socialista mudou a rotina do presidente do PHS. “Foi uma completa reviravolta. Eu já tinha decidido não participar da campanha nacional, com Eduardo, pois estava muito envolvido com a campanha de Marconi Perillo (PSDB) em Goiás.” O PHS apoia o PSB nacionalmente e os tucanos em Goiás.

Outro motivo que, de certa forma, travava o processo é revelado agora por Eduardo Machado: o centralismo de Campos. O que acaba dizendo muito sobre aparências que enganam — já que é sua substituta que tem fama de radical e autossuficiente. “Marina pede a participação de todo mundo, presta atenção a cada sugestão dada nas reuniões. Isso tem feito toda a diferença. Já Eduardo era mais centralizador”, compara, para abrir o jogo: “A campanha do Eduardo tinha donos, mas o primeiro escalão era ele sozinho. E era sozinho no segundo, no terceiro, até o quarto. No quinto escalão, tinham umas duas ou três pessoas.”

A saída intempestiva e acalorada de Carlos Siqueira, figura histórica do PSB e primeiro-secretário nacional do partido, não significa que as defecções foram muitas. Pelo contrário: o grupo está “fechado”, como se diz no jargão do futebol.

E como Marina se comporta nas reuniões de trabalho? Ela tem a mesma sisudez que deixou transparecer ao reagir sem a menor abertura para um sorriso ao gracejo de Eduardo Jorge (PV), seu ex-companheiro de PT, que disse a ela “se auditar nossa dívida e colocar numa ressonância, ela vai sair magrinha que nem você”? O presidente do PHS diz que a presidenciável é muito focada quando está na reunião de trabalho. “Nesses momentos, ela pode até ter um jeito sisudo, porque ela ‘mergulha’ no que está sendo discutido. Não é crítica a Lula ou a Marconi, que no meio de uma conversa formal contam uma piada. Mas esse não é o costume de Ma­rina.” Quando acaba a reunião, em um bate-papo, a hoje socialista “é uma pessoa normal, simples, como qualquer outra”.

Eduardo Machado admite que as mudanças bruscas tem causado efeito. “O que vou falar não é nenhuma surpresa: está todo mundo assustado com o que houve nas últimas semanas. São ao mesmo tempo realidades dolorosas, como a morte de Eduardo, e maravilhosas, como esses números que deixam todos perplexos”, revela. “Não tem como ser natural o que está acontecendo. Em nosso comitê em São Paulo, em qualquer hora, tem 200 jornalistas no térreo, todas as câmeras estão lá, acompanhando cada passo. Tudo ficou gigantesco para um grupo muito restrito.” E como fica, então? “O primeiro objetivo é não levar gol, não errar bola, porque o sentimento popular todo caminha para Marina”, resume o humanista.

Nesse clima, as discussões sobre os rumos tornam-se por vezes tensas. O líder de um dos partidos maiores da coligação queria colocar o discurso no rumo de alternativa ao governo do PT. Eduardo conta que, então, tomou a palavra para ser contundente: “Temos de ser alternativa a tudo que existe aí, não só ao governo do PT, mas às práticas políticas em geral.”

“Temos a única candidata que faz uma ponte real com as pessoas”

“A primeira pessoa a fazer um discurso diferente, sem buscar o toma lá dá cá. Os políticos assumem compromissos que não cumprem e isso foi criando um divórcio. Marina é a única que conseguiu fazer uma ponte com as pessoas. É a única que consegue dialogar com esses setores que ‘não querem saber de política’.” Essa definição de Marina Silva é dada por Aguimar Jesuíno, o candidato ao Senado pelo PSB em Goiás, na chapa de Vanderlan Cardoso.

Procurador federal, Aguimar está “de passagem” pelo partido socialista, como Marina, que já alertou os socialistas desde o início. Também como Marina, é um ex-petista — “me filiei em 2000, mas nunca tive vida orgânica no PT”; como ela, é um dos 112 signatários do manifesto de criação da Rede Sustentabilidade no Brasil e deve desembarcar no partido assim que ele for consolidado. “Nossa relação com o PSB é muito transparente. Vamos registrar a Rede ainda no próximo ano.”

Dessa forma, entender o que diz Aguimar ajuda a perceber também ecos da fala da candidata. “Que tipo de negociação você vê hoje no governo estadual ou federal? ‘Quero um cargo tal, um ministério tal.’ Ninguém comparece para discutir programa de governo. Marina não vai trocar cargos por base no Congresso, uma Petrobrás em troca do apoio. Ela vai procurar a melhor parte de todos os partidos. Precisamos fazer uma agenda e fazer a discussão com toda a sociedade. Se ganharmos o governo, precisamos fazer uma reforma política, acabar com o poderio econômico na eleição. E limitar as doações de pessoas físicas — não é justo o jogo que se faz hoje.”

Aguimar tem sentido na pele as consequências do desequilíbrio de forças na campanha, concorrendo a um posto majoritário com concorrentes bem mais conhecidos e em partidos mais estruturados. Ele acredita em um governo de sucesso com Marina, inclusive em termos de mudanças profundas e necessárias, “se conseguirmos fazer uma comunicação boa com a população podemos avançar até mesmo para uma reforma política mais radical”. “Foi pela manifestação popular de junho do ano passado que a PEC 37 [proposta de emenda constitucional que tirava prerrogativas do Ministério Público] foi barrada, depois de acordos já fechados com os partidos”, cita.

Para Aguimar, o carimbo de intransigente que tentam impingir a Marina “não vai pegar”. “Ela não é radical. Do ponto de vista econômico, é até conservadora. Mas tem uma coisa: em termos de ética, ela é mesmo intransigente.” Isso ficou claro quando não abriu mão do veto a Ronaldo Caiado na composição em Goiás — o deputado fechava um acordo com Vanderlan para o DEM integrar a chapa. Eduardo Campos teve de ceder e enviar sinal vermelho para seu candidato no Estado.

Os controversos conceitos marineiros, que a oposição ataca como discurso vazio, são, pelo contrário, reforçados por Aguimar. “De­mocracia de alta intensidade”, por exemplo, é usar ferramentas digitais e colocar o povo para discutir o que é importante. “As pessoas precisam ser sujeitos autorais das mudanças. É uma tarefa difícil, mas importante”, diz o candidato ao Senado.

Fazer o caminho das reformas era uma missão que estava no gatilho para o atual governo, principalmente depois dos protestos de 2013. “O PT tinha força política para fazer e não fez. Ganhou o poder e manteve os feudos intactos. Tratava e trata bem os grupos de ACM, Jader Barbalho, Iris Rezende, José Sarney, Renan Calheiros, Romero Jucá [políticos tradicionais de todo o Brasil]. Nesse sentido, não fez a mudança que o Brasil esperava. O PT era uma grande esperança, tirou 40 milhões de pessoas da miséria, mas aconteceram erros crassos na economia e principalmente na questão ética. Um partido que optou pelo caminho mais fácil e agora sente as consequências.”

Dona do Itaú traz lanche do Subway para equipe

Aguimar Jesuíno, candidato ao Senado em Goiás, com Marina: “Em ética, ela é mesmo intransigente”
Aguimar Jesuíno, candidato ao Senado em Goiás, com Marina: “Em ética, ela é mesmo intransigente”

Uma das figuras de proa que estão com Marina Silva e que servem como alvo para atacá-la chama-se Maria Alice Setúbal, mais conhecida como Neca Setúbal. Ela é filha de Olavo Setúbal, morto em 2008 e dono do Banco Itaú. Socióloga, ela tem relações estreitas com a ex-senadora desde as eleições de 2010 e cuidou, ao lado de Maurício Rands, ex-deputado e ex-petista como Marina, do plano de governo. A proximidade da candidata a uma figura herdeira de um complexo financeiro de tal porte leva os antimarineiros a dispararem farpas, alegando contradição.

Eduardo Machado diz que a relação é muito mais desinteressada do que conspiram as mentes do contra. “Neca está na campanha 24 horas por dia, envolvida totalmente. Mas é mais do que uma apoiadora de primeira hora, ela é uma conselheira de Marina no nível pessoal, desde a pré-campanha de 2010.” A doação da socióloga de berço de ouro produz alguns fatos curiosos: recentemente, quando todos estavam sem comer no QG da campanha, ela desceu e foi pessoalmente buscar sanduíches na loja Subway próxima ao prédio.

Mas se a equipe é pequena, será que é grande na qualidade? Eduardo Machado assegura que sim. A começar do economista Eduardo Gianetti que deverá ser “a voz do grande conhecedor” do setor. As pessoas que acompanham hoje Marina já andavam com ela como candidata a vice, quando a perspectiva de pelo menos ir para um segundo turno era algo remoto. Além de Neca e Gianetti, isso se aplica a Walter Feldman (coordenador-adjunto da campanha) e Luiza Erundina (coordenadora-geral). Uma exceção positiva e oposta a Carlos Siqueira é o ex-deputado Maurício Rands, pessoa hoje “da inteira confiança” de Marina, segundo Eduardo Machado. Outro personagem de alta importância para a candidata é o senador Pedro Simon (PMDB-RS), com quem ela conversa todo dia.

E como seria governar com uma coligação tão pequena, sem força no Congresso, já que mais de 90% da bancada total está hoje com Dilma ou Aécio? Eduardo não mostra preocupação: “Marina é como FHC e Lula, uma estrategista. Isso faz diferença. Ela não é uma ‘gerentona’, como Dilma, algo que não serve para um presidente da República — não cabe ao presidente ir ver se a ponte ficou bem feita ou não.”