Vítima de experimento de controle mental da CIA aos 16 anos busca Justiça no Canadá
15 novembro 2025 às 16h52

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Aos 16 anos, Lana Ponting foi enviada por ordem judicial ao Instituto Memorial Allan, em Montreal, para tratar o que o magistrado descreveu como “comportamento desobediente”. O que não sabia, porém, é que seria submetida a experimentos do projeto MK-Ultra, programa secreto da CIA que testou técnicas de controle da mente durante a Guerra Fria.
Hoje, aos 82 anos, Ponting se tornou uma das autoras de uma ação coletiva movida por vítimas canadenses. Na quinta-feira, 13, um juiz rejeitou recurso do Hospital Royal Victoria, abrindo caminho para o processo prosseguir.
Ponting lembra que, ao chegar ao hospital em 1958, o ambiente não se parecia com uma unidade médica. Segundo prontuários que só conseguiu acessar recentemente, ela foi levada ao local após conflitos familiares e mudança repentina para Montreal. “Eu era uma adolescente comum”, lembra.
No instituto, dirigido pelo psiquiatra Ewen Cameron, pacientes eram drogados, submetidos a eletrochoques e forçados a ouvir gravações repetidas milhares de vezes, procedimentos que ele chamava de “exploração” e “direção psíquica”.
Ponting conta que ouviu incessantemente a frase: “Você é uma boa menina, você é uma menina má.”
Registros médicos mostram que ela recebeu LSD, amital sódico, estimulantes e óxido nitroso. Em um dos documentos, Cameron descreve que a jovem ficou “extremamente violenta” ao ser sedada, atirando-se da cama e gritando.
Os experimentos MK-Ultra vieram à tona nos anos 1970, revelando que mais de cem instituições nos EUA e no Canadá participaram do programa. Diversas vítimas tentaram processar os governos, mas poucos casos prosperaram.
Em 1988, nove canadenses receberam indenizações dos EUA. Em 1992, 77 vítimas foram compensadas pelo governo do Canadá, sem reconhecimento de culpa. Ponting não estava entre elas, só décadas depois descobriu que também fora usada como cobaia.
Casada, mãe e avó, Ponting afirma que carrega sequelas psicológicas desde a internação. Sofre pesadelos frequentes e depende, segundo ela, de medicamentos psiquiátricos desde a juventude. “Às vezes acordo gritando por causa do que aconteceu”, diz.
O Hospital Royal Victoria e a Universidade McGill não comentam o caso devido ao litígio. O governo canadense destacou apenas que o acordo dos anos 1990 teve “natureza humanitária”.
Para Ponting, o avanço do processo é um passo para o encerramento emocional. “Quando vejo uma foto do Dr. Cameron, fico com muita raiva”, afirma.
Embora Cameron não soubesse que parte da pesquisa era financiada pela CIA, segundo estudiosos, seu trabalho já era, por si só, eticamente indefensável.
A pesquisadora Jordan Torbay afirmou que o dano é irreparável. “Não há como devolver às vítimas o que perderam. O que se busca é que o sofrimento delas não tenha sido em vão.”
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