Um retrocesso para a educação inclusiva. Autistas e outros serão prejudicados
24 outubro 2025 às 08h48

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Lucelmo Lacerda
Recentemente, o governo federal publicou o Decreto nº 12.686/2025, que impacta diretamente a educação inclusiva no Brasil. Como professor e pesquisador especialista em autismo, sinto-me na obrigação de alertar sobre as consequências desse decreto, que considero injusto e autoritário.
O decreto tem como objetivo, pelo menos no papel, garantir o direito à educação em um sistema educacional inclusivo para estudantes com deficiência, com transtorno do espectro autista e com altas habilidades ou superdotação, sem discriminação e com base na igualdade de oportunidades.
Essa medida, porém, parte da ideia de que todos os estudantes com deficiência devem, obrigatoriamente, estudar em escolas comuns, sem considerar as evidências científicas e as necessidades reais de cada aluno.
Isso restringe ou inviabiliza o funcionamento de escolas e classes especializadas, o que pode prejudicar profundamente os estudantes com deficiências mais severas, como autistas de nível 3 e pessoas com deficiência intelectual grave ou múltipla.
Ele penaliza, sobretudo, famílias de baixa renda. Para aqueles com melhores condições financeiras, é possível contornar algumas dificuldades, mas para milhares de famílias pobres, os efeitos são devastadores.
O que mais preocupa é a forma como o decreto foi implementado. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) já dispõe sobre as escolas especializadas, e qualquer alteração que desconsidere essa legislação deveria passar pelo Legislativo.
Ao publicar um decreto que contraria uma lei vigente, o Executivo ultrapassa seus limites constitucionais, desrespeitando tanto a sociedade quanto o Parlamento. Essa medida, portanto, não é apenas um retrocesso na política de inclusão, mas um ato autoritário que ignora a participação da comunidade educativa.
Não se trata de política partidária, direita ou esquerda. Trata-se de direitos humanos e do compromisso com a educação inclusiva. A comunidade autista é extensa, presente em todos os estados, e merece uma voz ativa no processo de tomada de decisões.
Pais, professores e especialistas precisam ser ouvidos, e os parlamentares devem assumir a responsabilidade de apoiar essa causa. Precisamos unir forças para garantir que todos, independentemente de suas condições financeiras ou grau de comprometimento, tenham acesso a uma educação de qualidade e inclusiva.
É fundamental promover a conscientização social, estimular a atuação responsável dos representantes eleitos e fortalecer o papel do Legislativo na formulação de políticas que assegurem a efetividade dos direitos da comunidade autista.
A educação inclusiva não pode ser tratada como uma prioridade secundária ou sujeita a decisões autoritárias; ela é um direito de todos.
Lucelmo Lacerda é doutor em Educação e autor do livro “Crítica à Pseudociência em Educação Especial”.
