A ameaça do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de aplicar uma tarifa de importação de 50% sobre produtos brasileiros já começa a afetar o mercado interno. Alimentos como carne bovina, frutas e café, que têm os EUA como destino relevante de exportação, registram queda ou oscilação de preços no Brasil.

As carnes brasileiras, um dos principais itens exportados para o mercado americano, já registram queda de preços no atacado. Entre 24 de junho e 21 de julho, o valor da carne caiu 7,8%, enquanto a arroba do boi gordo teve retração de 7,5%. A tendência é que essa redução chegue ao consumidor em agosto.

Ao GLOBO, Thiago Bernardino de Carvalho, pesquisador do Cepea (USP), afirmou que o recuo nas compras pelos EUA obrigou frigoríficos a redirecionarem a produção para o mercado interno, aumentando a oferta e pressionando os preços para baixo.

“É um movimento típico desta época do ano, com menor consumo e maior oferta. A taxação americana acelerou esse efeito”, afirma o especialista. Empresas como JBS e Minerva, com plantas no exterior, devem manter os embarques para os EUA por meio de suas unidades fora do Brasil, concentrando a produção nacional no mercado interno.

O economista Fábio Romão, da LCA 4Intelligence, também observa impacto nas cotações da arroba do boi gordo em São Paulo, praça de referência nacional. Ele projeta que a queda nos preços chegue ao varejo entre agosto e setembro — um alívio antecipado, já que antes do tarifaço, esperava-se redução apenas em 2026.

Apesar disso, o impacto para o consumidor ainda é limitado. Sérgio Capucci, vice-presidente do Sindicato das Indústrias de Frios e Carnes de MS, afirma que os frigoríficos remanejaram a produção para mercados como Chile, China e Oriente Médio, evitando grandes perdas.

“Houve queda de até 5% logo após o anúncio da tarifa, mas ninguém reduziu a produção”, disse Capucci. Enquanto a carne registra recuo, o café segue caminho oposto.

A antecipação da tarifa americana fez o preço do grão subir 6,8% na Bolsa de Nova York entre 14 e 17 de julho. No Brasil, os preços voltaram a subir após meses de queda. De fevereiro a julho, o valor da saca de 60 kg caiu de R$ 2.627 para R$ 1.602.

No entanto, na última semana, já havia subido para R$ 1.803. “A cotação interrompeu a tendência de queda iniciada em junho”, afirma Romão. José Carlos Hausknecht, da MB Agro, acredita que os EUA terão dificuldade para substituir o café brasileiro, que representa 30% das exportações globais.

Marcas americanas dependem do blend brasileiro, e ajustes não são rápidos. No caso das frutas, os efeitos do tarifaço também já são visíveis. No Vale do São Francisco, região que concentra mais de 90% da exportação de mangas e uvas, os preços caíram com o excesso de oferta interna.

A manga tommy, variedade exportada para os EUA, recuou de R$ 1,50 para R$ 1,36 o quilo em apenas uma semana. Segundo Guilherme Coelho, presidente da Abrafrutas, o quilo da manga pode chegar a R$ 0,30 se as 48 mil toneladas previstas para exportação ficarem no Brasil.

“Se cair demais, o produtor pode deixar de colher. Alimentos não deveriam estar no tarifaço”, argumenta. Lucas Bezerra, do Cepea, aponta que o preço da manga caiu 30% entre 3 e 18 de julho, afetado também pelo menor consumo típico do inverno e das férias escolares.

“Frutas são perecíveis. Se não forem exportadas, o mercado interno precisa absorver esse volume”, alerta. Alex Pinheiro, feirante há mais de 30 anos, confirma a mudança no mercado:

“A uva caiu muito. Estava pagando R$ 110 pela caixa, agora pago R$ 40”, diz ele. No varejo, os consumidores ainda observam os efeitos com desconfiança.

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