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Em julho deste ano, Goiânia implementou a Taxa de Limpeza Pública (TLP), fixada em R$ 21,50 por imóvel, a ser paga junto à fatura de água. A Prefeitura justificou que o objetivo é garantir a manutenção da coleta de resíduos para mais de 1,5 milhão de moradores, em conformidade com o Marco Legal do Saneamento, que exige fonte própria de financiamento para os serviços urbanos de saneamento. A cobrança coloca Goiânia entre as 22 capitais brasileiras que aplicam a taxa como fonte para a coleta, transporte e destinação final dos resíduos sólidos.

A cobrança, entretanto, não veio sem controvérsia. Argumentando que a TLP é impopular e onera contribuintes, o vereador Lucas Vergílio (MDB), solicitou o desarquivamento de seu projeto de lei que propõe a revogação integral da taxa. Em 27 de agosto, o projeto foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Municipal de Goiânia. Ele agora segue para a primeira votação em plenário, onde será apreciado por todos os vereadores.

Em entrevista ao Jornal Opção, o Procurador-Geral do Município (PGM) de Goiânia compartilhou seu ponto de vista sobre o impasse. Segundo Wandir Allan de Oliveira, há possibilidade de a revogação da TLP ser questionada judicialmente. O PGM acredita ainda que a revogação da taxa teria um alto preço, a ser pago pelo município a longo prazo — um preço não apenas financeiro, mas de justiça tributária.

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“Há uma lógica em motivar o cidadão a produzir menos resíduos”, diz o PGM, Wandir Allan | Foto: Guilherme Alves / Jornal Opção

Jornal Opção — O prefeito Sandro Mabel (UB) pretende judicializar a questão caso a revogação seja aprovada? O senhor não acredita que judicializar decisões da Câmara pode desgastar a relação entre Executivo e Legislativo?

Wandir Allan de Oliveira — Eu posso falar do ponto de vista técnico. Do ponto de vista político, essa é uma análise que deve ser feita pelo prefeito. Como advogado do município, se identifico uma ilegalidade ou um vício de constitucionalidade em determinada lei ou proposta legislativa, meu dever funcional é informar o prefeito e apontar os caminhos possíveis.

Com relação à taxa do lixo, identifico várias fragilidades técnicas, algumas passíveis de questionamento judicial. A análise sobre a conveniência disso é política, portanto submeto ao prefeito, que vai avaliar.

Na minha opinião, toda lei que nasce com uma deficiência em relação ao cumprimento de uma norma maior deve ser questionada. Isso traz implicações políticas? Sim. Mas todo gestor público tem um compromisso com a história — não apenas com a popularidade ou com uma situação eleitoral.

Acredito que, no caso da revogação da taxa do lixo, existe um preço histórico muito alto a ser pago pelo município. A taxa foi criada dentro do marco do saneamento básico com o objetivo, claro, de financiar o serviço, mas também cumpre uma função importante: a do poluidor-pagador.

Há uma lógica em motivar o cidadão a produzir menos resíduos a partir da dinâmica de que, quanto mais resíduo ele gera, mais paga. Portanto, há um objetivo de educação e de política ambiental por trás dessa taxa. O marco do saneamento não determina apenas a obrigatoriedade da taxa do lixo — ele também permite a criação de outras taxas, como a de drenagem.

Às vezes, não se tem clareza de que o imposto não implica uma contraprestação direta de serviço. Pagamos impostos porque firmamos um contrato social: elegemos um Estado para cuidar das necessidades básicas da sociedade — saúde, educação, segurança, entre outras.

Por outro lado, existem serviços específicos e divisíveis prestados pelo Estado que são remunerados não por impostos, mas por taxas ou preços públicos. Serviços como coleta e destinação final do lixo, abastecimento de água, tratamento de esgoto, entre outros.

A contribuição para custeio da iluminação pública (COSIP) é um exemplo. É um serviço universal, mas divisível — é possível calcular seu custo e distribuí-lo entre os cidadãos. Por isso, quando se trata de serviços públicos que podem ser remunerados por taxas, isso deve ser feito, porque é uma questão de justiça fiscal: quem usa, paga. Quanto mais usa, mais paga. Portanto, além do custeio, há uma questão importante de justiça tributária envolvida.

Eu não posso te afirmar se Sandro Mabel vai ou não questionar judicialmente o projeto de lei de Lucas Vergílio. O que eu posso afirmar é que existem elementos de inconstitucionalidade na lei, caso ela venha a ser aprovada, que podem provocar seu questionamento. A partir daí, a decisão política cabe ao prefeito, mas, juridicamente, há elementos muito concretos para declarar a inconstitucionalidade dessa lei.