Francisco Tavares criticou 10 Medidas contra Corrupção, do Ministério Público, que para ele cria um superpoder sem efetividade e que atenta contra direitos fundamentais

Cientista político Francisco Tavares: “Brasil não vive ‘falência’ de modelo político, mas atravessa uma crise” | Foto: Fernando Leite/Jornal Opção
“Ninguém está à favor da supressão de normas penais como o único caminho possível”, defende Francisco | Foto: Fernando Leite/Jornal Opção

Assunto de audiência pública na Câmara dos Deputados, o pacote de 10 Medidas contra a Corrupção, editado pelo Ministério Público Federal (MPF), mal começou a ser debatido e já causa polêmica. Em entrevista ao Jornal Opção, o cientista político e professor da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás (UFG), Francisco Tavares, endossou as críticas às medidas que, na sua opinião, atentam contra direitos fundamentais.

Para ele, o primeiro ponto a ser ressaltado é que as críticas ao projeto têm um caráter técnico e não podem ser consideradas uma ação à favor da corrupção. “O primeiro ponto é que ninguém comparece ao espaço público para defender a corrupção”, destaca. “O que ninguém está à favor é da supressão de normas penais como o único caminho possível para combater a corrupção”.

[relacionadas artigos=”69633,73357″]

Francisco critica a postura do Ministério Público de apresentar as 10 medidas como se fossem a única solução viável para a diminuição da corrupção o que, aponta, não tem nenhum embasamento teórico. “Que pesquisa atesta que aumentar o poder da instituição em que eu atuo vai resolver o problema da corrupção? É isso que quem defende as medidas tem que provar”.

“Não existe nenhum estudo científico que indica que nulidade ou redução de direitos fundamentais e o aumento de poder de órgãos persecutórios reduzam a corrupção”, afirma. “Pelo contrário, estas medidas criam formas não democráticas que suprimem os direitos fundamentais dos cidadãos. Maior transparência, tributação progressiva e controle de fluxo de capitais, por outro lado, de fato melhoram a situação”.

O professor destaca principalmente a aceitação de provas ilícitas obtidas de boa fé, medida contida no projeto. “Em todo o mundo civilizado, a regra é a da Doutrina dos Frutos da Árvore Envenenada, que coíbe erros de boa fé”, destaca. “Essa nova lei institucionalizaria tortura, falsear provas e flagrantes, enfim, por trás de um certo combate, o que aquelas medidas de fato encerram é a criação de um superpoder”.

Na opinião do professor, o pacote vai enfrentar muita dificuldade para ser aprovado. “Em um primeiro momento, os membros do Ministério Público, em especial do Paraná, fizeram um bom trabalho de obtenção de apoio político, mas não explicaram para ninguém o que eram essas medidas”, comenta. “Agora vai ter audiência pública, advogados vão falar, cientistas políticos vão mostrar estudos… Elas terão que ser publicamente sustentadas em um ambiente do contraditório”.

Medidas mais efetivas

Questionado sobre quais medidas seriam, na sua opinião, mais eficazes para combater a corrupção, o professor aponta três aspectos: “Uma primeira questão que ajuda a reduzir efetivamente a corrupção é a relativização das normas de sigilo, tanto bancário quanto de investimento, para que se possa distinguir o que é dinheiro de economia lícita que que é economia ilícita”.

“Depois, temos a criação de legislações que oportunizam o maior acesso as informações principalmente as fiscais, e a instituição de uma política educacional que permita entender o orçamento de Estado e o funcionamento da máquina estatal”, lista. “E também tem a questão da influência do dinheiro e na separação do que é publico e privado, que também é importante. Aí entramos no financiamento de campanha que ajuda na coibição de guerras fiscais e no controle de privatizações da máquina estatal”.

Medidas punitivas, aponta ele, não são as que apresentam melhores resultados. ” Elas vêm, limpam tudo e a corrupção se reinstaura de forma ainda mais eficiente”, pontua. “Basta ver o caso da Itália, com a Operação Mãos Limpas. Combateu a máfia, mandou todo mundo para a cadeia, mas depois vimos a ascensão de Berlusconi [Ex-primeiro-ministro da Itália, condenado por corrupção]”, disse.