Presidente do PT admite que partido tem dificuldade em dialogar com a nova classe trabalhadora

22 agosto 2025 às 14h48

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O presidente nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), Edinho Silva, reconheceu, em entrevista à BBC News Brasil, que o partido enfrenta dificuldades em compreender e dialogar com a chamada “nova classe trabalhadora” formada por profissionais informais, autônomos e ligados às plataformas digitais.
“Não estamos conseguindo dialogar com a nova classe trabalhadora”, disse Edinho. A declaração tem peso simbólico para um partido fundado a partir do sindicalismo operário no final dos anos 1970 e que carrega no nome a identidade dos trabalhadores.
Sociólogo de formação, Edinho atribui a dificuldade às raízes do partido. Segundo ele, o PT foi moldado para defender direitos de trabalhadores com carteira assinada e vínculo formal. Hoje, porém, crescem os setores informais, como motoristas de aplicativo, entregadores e jovens que atuam em atividades digitais.
“O motorista de aplicativo não quer vínculo formal. O entregador não quer vínculo formal. O trabalhador em home office, muitas vezes, não quer o vínculo formal. Nós temos que entender isso”, avaliou. Para ele, o caminho pode ser o cooperativismo, com linhas de crédito e organização coletiva, mas fora da lógica tradicional da CLT.
A dificuldade de diálogo já se refletiu nas urnas. Em 2024, o PT obteve leve recuperação, passando de 183 para 252 prefeituras, mas conquistou apenas uma capital, Fortaleza. Segundo Edinho, parte da classe média, sobretudo das periferias urbanas, “virou as costas” para o partido. “Há uma nova classe trabalhadora se formando e nós temos que aprender a dialogar com ela”, disse.
Força do Congresso
À BBC, o presidente do PT também criticou a concentração de poder do Congresso sobre a execução do Orçamento, estimada em R$ 52 bilhões via emendas parlamentares. Para Edinho, o arranjo descaracteriza o presidencialismo. “Não é segredo que o governo não tem maioria no Congresso. Quando o Congresso vira executor do Orçamento, a coalizão não se efetiva”, afirmou.
Ele reconheceu ainda que Lula não conseguiu cumprir a promessa de acabar com o chamado “orçamento secreto”. “Não houve correlação de forças para alterar esse quadro”, admitiu.
Edinho, no entanto, aposta que Lula chegará competitivo à eleição presidencial de 2026, apesar das dificuldades. “Nunca vi o presidente Lula tão bem de saúde e tão disposto. Ele vai disputar as eleições em um dos melhores momentos da sua vida”, declarou. O dirigente destacou, no entanto, que o PT precisa se preparar para o cenário pós-Lula. “O sucessor não será um nome, será o partido. Se o PT estiver forte, vai produzir novas lideranças”, afirmou.
Evangélicos e segurança pública
Outro ponto de dificuldade admitido por Edinho é o diálogo com a comunidade evangélica, cada vez mais próxima da direita. Ele defendeu maior presença do PT nesse segmento e lembrou que políticas sociais do governo também beneficiam as famílias evangélicas.
Sobre segurança pública, o petista defendeu a formulação de uma proposta nacional, com uso de tecnologia e prevenção voltada a jovens em conflito com a lei. Mas admitiu que será preciso ouvir governadores e prefeitos, inclusive sobre problemas em estados administrados pelo próprio PT, como a Bahia.
Bolsonaro
Por fim, Edinho comentou o processo judicial contra Jair Bolsonaro por tentativa de golpe. Para ele, as instituições brasileiras devem investigar sem recuar diante de pressões externas. “O Brasil não vai abrir mão da sua democracia. Se um golpe não for punido, qualquer partido que perder a eleição se sentirá autorizado a tentar outro”, disse.
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