“Ou paga, ou fecha as portas”, diz médico sobre esquema das UTIs
22 junho 2016 às 20h44

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Médico coordenador de UTI de um hospital particular de Goiânia afirma que a relação ilícita entre hospitais particulares e Samu é prática comum na capital
O esquema de fraude envolvendo funcionários do Samu responsáveis pelo encaminhamento de pacientes conveniados a planos de saúde a determinadas UTIs de hospitais particulares em Goiânia indignou muita gente, mas, aparentemente, para quem é do ramo, a existência do pagamento de propina não é novidade.
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O Jornal Opção conversou na manhã desta quarta-feira (22/6) com um médico coordenador de uma Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) de um hospital particular de Goiânia. Apesar de negar saber de qualquer irregularidade dentro da empresa em que trabalha, ele afirma que, no geral, todo mundo sabe que acontece. “Em Goiânia existem os feudos, todo mundo sabe disso. Principalmente para os hospitais menores, que não são referência na cidade, muitas vezes o administrador tem duas opções: ou paga para ter pacientes ou fecha as portas”.
“Quando digo que aqui não tem esquema com funcionários do Samu, eu falo por mim e também porque não fomos procurados por ninguém para prestar esclarecimentos. Mas no geral, quem é da área sabe que a prática é muito comum”.
Segundo investigações da operação SOS. Samu, deflagrada na última terça-feira (21/6) pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), funcionários do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência de Goiânia tinham um acordo com médicos e administradores responsáveis por UTIs terceirizadas e de hospitais particulares para fazer o encaminhamento de pacientes que tivessem vínculo com planos de saúde, mediante pagamento de propina.
Dentro do esquema, eram considerados pacientes “mais valiosos” aqueles que tinha um plano de saúde melhor, que paga mais ao hospital, ou pacientes em pior estado de saúde, uma vez que necessitam de mais equipamentos e medicamentos e também tem probabilidade de ficarem mais tempo na Unidade.
A lista das 24 pessoas que tiveram prisão temporária decretada, publicada com exclusividade pelo Jornal Opção, mostra que a maioria dos investigados são funcionários do Samu. Segundo o coordenador entrevistado pelo jornal, o esquema é ainda mais endêmico dentro da instituição. “Não são todos os funcionários do Samu [que recebem propina], mas uma grande parte”, sustentou. “A informação que chegou a mim é de que a funcionária que fez a denúncia só o fez porque ela havia sido transferida para trabalhar em um Cais, onde seria muito mais difícil conseguir pacientes para entrar no esquema”, disse o médico que comparou o caso com escândalos de corrupção na política. “Só denuncia quem estava no esquema e, por algum motivo, não está mais”.
Ainda sobre o esquema, o coordenador de UTI lembrou de uma outra investigação do MP-GO, que em 2008 desvendou o pagamento de propina para o encaminhamento de pacientes com plano de saúde que estivessem internados no Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo). “É a mesma história. Todos estão indignados porque essa é a bola da vez. Acontece que o sistema é assim e quando essa história esfriar, tudo vai voltar a ser como era ou o sistema vai se adaptar. Mas duvido muito que acabe”.
Um dos envolvidos na operação deflagrada esta semana, o médico Rafael Haddad, preso na última terça-feira (22/6) pela operação SOS. Samu, também esteve envolvido no esquema investigado em 2008.