A Comissão de Liberdade Religiosa (CELR) da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB-GO) manifestou repúdio às declarações do deputado estadual Amauri Ribeiro (União Brasil), feitas no plenário da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego) na última quarta-feira, 5. O parlamentar criticou a Exposição Coletivo Onã, instalada no saguão da Casa, classificando elementos simbólicos das religiões de matriz africana e indígena como “demoníacos”.

As falas, segundo a comissão, configuram intolerância religiosa e violam princípios constitucionais. A Exposição Coletivo Onã, proposta pelo deputado Mauro Rubem (PT), celebra práticas e símbolos espirituais afro-brasileiros.

Durante discurso em plenário, Amauri Ribeiro alegou ter se sentido incomodado com a presença de itens ligados às referidas tradições. De acordo com o político, o espaço exibiria “tranca rua, exu, pomba gira, cabeça de vaca, velas e oferendas”. Ele afirmou respeitar outras doutrinas, mas reforçou que apenas reconhece religiões que têm conexão com “um único Deus, que é Jesus Cristo”.

Veja abaixo.

Para o parlamentar, “Adoração a demônio dentro dessa Casa não é de boa espiritualidade para nós, deputados”. Além disso, pediu que colegas pastores realizassem oração para “tirar as coisas ruins” do local.

A CELR ressaltou que as declarações afrontam diretamente o ordenamento jurídico brasileiro. A comissão enfatiza que o Estado é laico, conforme o artigo 19, inciso I, da Constituição Federal, sendo vedado ao poder público “estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança”.

O mesmo texto constitucional assegura, no artigo 5º, inciso VI, a liberdade de consciência e crença, garantindo o livre exercício das manifestações religiosas e a proteção dos seus espaços e liturgias.

A entidade da OAB-GO afirma que falas como as proferidas na Alego representam ato de intolerância religiosa e violam garantias fundamentais. A defesa da liberdade de culto, observa a comissão, constitui expressão da dignidade humana e elemento essencial da democracia. Inclusive, o Supremo Tribunal Federal, em julgamentos como ADI 4439 e ADPF 811, consolidou entendimento de que o pluralismo e a diversidade religiosa são valores que devem ser protegidos pelo Estado.

Além disso, a comissão relembra que a Lei nº 7.716/1989 tipifica como crime a prática, indução ou incitação ao preconceito religioso, prevendo pena de reclusão. A CELR alerta que discursos de desqualificação ou inferiorização de crenças favorecem a disseminação do racismo religioso, fenômeno que atinge especialmente tradições afro-brasileiras e indígenas.

Segundo a OAB-GO, a exposição no saguão da Alego não apenas integra o direito à expressão cultural e espiritual, como também contribui para o reconhecimento das raízes afro-indígenas presentes na formação do país. Exatamente por ocorrer no mês da Consciência Negra, a mostra ganha ainda mais relevância ao promover respeito, diálogo e valorização das contribuições históricas dessas comunidades.

Ainda conforme a CELR, eventos como a Exposição Coletivo Onã ajudam a combater preconceitos estruturais ao fomentar visibilidade a religiões frequentemente vítimas de discriminação. A comissão afirma que a fala depreciativa de autoridades públicas pode fortalecer estigmas, incentivando atos de violência contra pessoas de fé afro-brasileira ou indígena.

Em nota, a OAB-GO declarou solidariedade às comunidades afetadas e convocou o poder público a promover o respeito inter-religioso e a efetiva garantia dos direitos assegurados pela Constituição. A comissão reforçou que a intolerância não deve ser confundida com liberdade de expressão: desqualificar crenças e seus símbolos constitui ataque aos fundamentos do Estado Democrático de Direito.

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