“O palhaço é promotor de saúde”: goiano se forma na primeira pós-graduação em palhaçaria hospitalar do mundo

10 outubro 2025 às 22h00

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Palhaçaria é coisa séria, com formação e tudo. Mais do que entretenimento e titulação, é cultura e saúde. Primeiro goiano pós graduado em palhaçaria hospitalar, Juan Rocha disse ao Jornal Opção que o curso desenvolveu técnicas teatrais, musicais, de palhaçaria, magia e humanidades. “A palhaçaria hospitalar é cultura e muitas vezes é o único acesso à cultura, é o único encontro que aquela pessoa vai ter com a cultura dentro de um hospital. Isso transforma o hospital num ponto de cultura”, conta.
A pós-graduação, oferecida pela PUC do Paraná, é a primeira do mundo dedicada à palhaçaria hospitalar. A formação foi idealizada por Marcelo Marcon, com contribuições significativas da Dra. Alessandra Shirley, Dagoberto Feliz e Helderson Mariani, e produção da N Produções Culturais, de Flávia Bertoldi e Jefferson Bertoldi. A primeira turma contou com 25 alunos selecionados em todo o Brasil, dos quais 22 concluíram o curso, em formato híbrido, com 360 horas de aulas presenciais e online.

Segundo ele, o curso também trabalha aspectos de autoconhecimento e relação humana. “A gente acredita que jamais serás quem tu não és. O palhaço nunca vai ser tão bom querendo ser outro. Todo palhaço é único. A gente traz esse lugar do risível de cada um, das nossas características pessoais.”
Para Juan, compreender a si mesmo é parte essencial do processo.
Esse autoconhecimento também nos conecta aos outros. Ainda mais nesse lugar da palhaçaria relacional, precisamos estar prontos para nos conectar ao jogo — conectar com as pessoas, com o ambiente, com o momento.
A formação incluiu práticas de biossegurança e estudos baseados no Plano Nacional de Humanização, abordando também os fundamentos teóricos da relação entre arte, saúde e empatia.
A gente acredita no palhaço como promotor de saúde. Mais do que acolher, promovemos bem-estar físico, emocional e mental. O riso libera oxitocina, endorfina e serotonina. Há pesquisas que comprovam a eficácia da palhaçaria, por exemplo, em tratamentos de fertilização in vitro e em pacientes queimados, ajudando a reduzir a dor, explica.
Mais Espalhadrapo que Juan
Formado em produção cênica pela Escola do Futuro em Artes Basileu França, Rocha, ou ‘Espalhadrapo’, diz que está chegando a fase da vida onde ele é mais palhaço do que já foi “só um humano a paisana”. Ele conta que despertou o interesse pela palhaçaria aos 17 anos de idade, a convite de uma amiga para participar de uma reunião de voluntários do grupo que hoje ele coordena: o Trupcando em sonhos.

“Conheci os voluntários e acabei me apaixonando pelas pessoas. Elas tocavam músicas que eu gostava até que fui convidado para uma visita ao antigo materno infantil e o que aconteceu nessa visita me impactou muito e faz com que eu até hoje atue”, lembra.
Hoje, aos 36 anos, ele diz que achou que a experiência seria fácil. “Vou tirar de letra porque eu sou um ser meio falante”, rememora. Em um dos corredores, ele viu uma mãe que havia acabado de perder o filho. “Olhei para trás e não tinha mais ninguém. Pensei: ah meu Deus, eu quero correr. Mas não corri, parei. Ela veio, em abraçou e disse chorando que perdeu o filho”.
Palhaço, palhaço, palhaço
Palhaço de primeira viagem tentou elaborar alguma coisa para dizer pra ela ou “tentar trazer alguma entidade divina para falar sobre isso para ela se sentir melhor”. “Mas não falei nada, não consegui falar nada com ela falando que perdeu o filho”.

Foi só depois do choro e do “soltar do abraço” que aquela mãe parou e agradeceu. “Obrigada, você foi a única pessoa que me deixou chorar”. Rocha lembra que parou e ofereceu o outro ombro também.
“Aí ela começou a rir e falava: você é muito palhaço, você é muito palhaço e sorrindo porque eu tinha oferecido o outro ombro para ela continuar chorando quando ela quisesse. Aquilo me deu um start na vida de que era isso que eu queria, que era mudar tempos presentes”.
A mudança desse tempo presente, segundo Rocha, é reconfortar, mesmo que por 5 segundo, a dor de alguém que perdeu o filho, através do nariz de palhaço.
Ressignificar o tempo presente
Para o artista, a essência da palhaçaria está em ressignificar o tempo presente — tanto para o público quanto para o próprio palhaço.
Nem todo dia é bom. Tem dias que são noites. Mas a ideia é ressignificar o tempo e as relações. Essa é a arma do palhaço: transformar o instante. Fazer com que a pessoa esqueça a dor que sente ou o ambiente em que está, nem que seja por alguns segundos.
Ele diz que essa transformação também vale para quem atua.
Às vezes, o palhaço acabou de bater o carro e vai direto para o hospital fazer uma intervenção. Como ele vai ressignificar isso? Ele precisa mudar o próprio tempo presente e o tempo do público. A gente chama isso de encontro de eus: o meu eu encontra o seu eu, e nesse encontro, há graça — há Deus.
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