O Brasil na COP30 e a vergonha causada por uma minoria oportunista

03 agosto 2025 às 01h00

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Parto do princípio de que nos tornamos mais patrióticos quando estamos longe da nossa terra de origem. Claro que algumas comparações surgem naturalmente, muitas vezes até de forma inconsciente. Quem já teve algum contato com a cultura de outros países, sobretudo os europeus, provavelmente já se pegou dizendo um “Ah, podia ser assim no Brasil” diante de certas situações.
Como dito, algumas comparações são inevitáveis de se fazer. Mas quando voltamos à nossa terra, ah… Penso que o sentimento pode ser resumido com um simples: ser brasileiro é uma dádiva.
No geral, e apesar dos pesares, somos um povo acolhedor, perseverante, afetuoso, honesto e produtivo, com uma cultura tão rica, bela e diversa que é difícil descrevê-la: é preciso vivê-la. E reconhecer tudo isso é que verdadeiramente faz de uma pessoa um patriota (leia-se, não é bater continência para pneu e nem cantar o Hino Nacional acampado na porta do quartel).
Contudo, há aquelas situações e momentos em que o sentimento patriótico tremula e hesita como a chama de uma vela em uma ventania. E isso por conta de uma minoria. O caso da COP 30 é um deles.
Nosso país foi escolhido formalmente para sediar a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025, mais conhecida como COP30, em dezembro 2023. Foi uma festa, euforia total. Afinal, seria no Brasil a trigésima edição de um dos maiores encontros climáticos do mundo.
Conforme estimativas da Fundação Getúlio Vargas, cerca de 40 mil visitantes são aguardados ao longo dos principais dias do encontro anual onde líderes mundiais, representantes da sociedade civil, organizações governamentais e cientistas do mundo inteiro discutem ações para combater as mudanças climáticas.
Mas agora, faltando menos de 100 dias para o evento, que está previsto para ter início em 10 de novembro, confesso que o sentimento é outro.
Na última semana, o presidente da COP30, André Corrêa do Lago, durante um encontro realizado pela Associação de Correspondentes Estrangeiros (AIE) em parceria com o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), informou que países estão pressionando o Brasil para transferir a conferência climática de Belém para outra cidade. O motivo: o preço absurdo cobrado por hotéis e até cidadãos comuns, que decidiram alugar suas casas durante os dias do evento.

“Há uma sensação de revolta, sobretudo por parte dos países em desenvolvimento, que estão dizendo que não poderão vir à COP por causa dos preços extorsivos que estão sendo cobrados”, afirmou ele.
Uma reportagem da revista Veja revelou hotéis de duas estrelas em Belém cobrando R$ 25 mil pelos 11 dias do evento, preço mais alto do que hospedagens em Nova York e Paris na mesma época. A reportagem mostrou ainda uma casa de alto padrão sendo oferecida pela bagatela de R$ 2,2 milhões para os 11 dias. Para efeito de comparação, ainda segundo a reportagem da Veja, o hotel Four Seasons Hotel George V, apelidado de “palácio”, cobra o valor de R$ 140 mil pelo mesmo período.
Já uma busca feita pelo jornal Estado de S. Paulo encontrou anúncios de estadia para duas pessoas em Belém por mais de R$ 500 mil pelos 11 dias da COP30. Em um bairro nobre da capital paraense, uma casa foi oferecida pelo valor de R$ 1,5 milhão para os dias da conferência.
É preciso destacar: na lei da oferta e da demanda, é claro que os valores padrões não se manteriam durante um evento de tamanha magnitude. Mas agir com tamanha ganância a ponto de cobrar valores tão exorbitantes e desproporcionais, ainda mais quando se trata de um evento cuja finalidade é o bem estar coletivo, é simplesmente a maior demonstração de mau-caratismo que pode haver.
Em meio a série de denúncias de valores abusivos, o Ministério do Turismo anunciou que promove vistorias em obras de infraestrutura e na rede hoteleira na capital paraense, e que “o governo tem trabalhado para que não haja qualquer tipo de empecilho para realização da conferência”. “Posso garantir a você que temos hospedagens e temos preços justos”, destacou.
Pelas reportagens publicadas sobre a questão até agora, é possível notar que boa parte (se não a maioria) dos preços absurdos relatados tem origem em bairros nobres de Belém. Ou seja, não é coisa do cidadão médio, do assalariado, do autônomo, do cidadão que faz do Brasil, Brasil. Mas sim de uma minoria abastada, tanto em poder aquisitivo quanto em malandragem, que parece nunca ter entendido o que, de fato, é ser brasileiro.
A COP30 deveria ser um marco de orgulho nacional, mas corre o risco de virar um vexame diplomático. Enquanto o mundo discute o futuro do planeta, uma minoria oportunista faz questão de mostrar o pior do Brasil: a ganância travestida de esperteza. Não adianta querer palco global se, nos bastidores, alguns agem como se o coletivo não valesse nada.