Novo Plano Nacional de Educação propõe metas ambiciosas, mas professores alertam para entraves orçamentários e sobrecarga docente

16 outubro 2025 às 07h53

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O novo relatório do Plano Nacional de Educação (PNE) 2025-2035, apresentado na terça-feira, 14, pelo deputado Moses Rodrigues (União Brasil-CE) à Comissão Especial da Câmara dos Deputados, estabelece 19 metas para orientar as políticas públicas de ensino no país, e foi recebido com expectativa e também com críticas de especialistas que apontam contradições entre os objetivos propostos e as limitações financeiras impostas pelo atual cenário econômico.
O documento, considerado um avanço em relação ao PNE anterior, está sob análise do colegiado presidido pela deputada Tabata Amaral (PSB-SP). Entre as principais diretrizes, o plano prevê formação, valorização e melhores condições de trabalho para os profissionais da educação básica, além de metas intermediárias que buscam medir a aprendizagem dos estudantes em diferentes etapas do ensino.
De acordo com o texto, em dez anos, todos os alunos deverão alcançar a aprendizagem considerada adequada para cada etapa escolar. Há ainda prazos intermediários: em cinco anos, 70% dos estudantes dos anos iniciais, 65% dos anos finais e 60% do ensino médio precisam atingir esse patamar. Contudo, apesar da estrutura detalhada, o plano já nasce sob questionamentos sobre sua viabilidade financeira e operacional.
Em entrevista ao Jornal Opção, o professor titular de Geografia da UFG e coordenador do Observatório do Estado Social Brasileiro, Tadeu Alencar Arrais, avalia que o documento mantém a tradição de definir metas, mas sem resolver o problema central: o financiamento. Segundo ele, todas as metas, tanto da educação básica quanto superior, dependem diretamente de recursos financeiros.

Arrais explica que o país vive “sob a égide de um ajuste fiscal e de um teto de gastos que vai travar, que já trava os investimentos em educação básica e superior”. Para ele, há uma incompatibilidade evidente entre planejar metas de aprendizagem e manter o controle rígido dos gastos públicos. “Há uma incompatibilidade, ao meu juízo, entre a planificação com metas de aprendizagem, maior investimento, etc., e o chamado arcabouço fiscal, que é um eufemismo para teto de gastos”, afirmou.
O professor também chamou atenção para o impacto dessa limitação nas redes públicas. Ele lembrou que os professores representam entre 20% e 38% do total do funcionalismo público em muitas redes estaduais e municipais. “Quando eu estou falando em reforma administrativa, eu estou falando sobre reforma da educação”, disse. Diante desse cenário, Arrais questiona como o governo conseguirá conciliar metas ousadas com a política de austeridade fiscal. “Não sei que mágica ele vai conseguir fazer. Que exercício e que ginástica para cumprir ou para estabelecer metas futuras num ambiente de austeridade fiscal”, ponderou.
“A própria universidade já começa a acumular demandas de infraestrutura e investimentos. Então pensando nisso, não sei qual vai ser a saída”, concluiu.
A preocupação com as condições de trabalho dos professores também é compartilhada por educadores que vivem diariamente a realidade das escolas. Em entrevista ao Jornal Opção, a professora do Centro Estadual de Educação de Jovens e Adultos (CEEJA), Inez Maria Milhome Viana, afirmou que o modelo de metas numéricas pressiona o docente e prejudica a qualidade do ensino.

Ela destacou que, se houvesse mais tempo e estrutura, o ensino poderia alcançar resultados reais. “Se a gente tivesse uma condição melhor e um tempo maior para que se discutisse, para que se estudasse, para a partir daí praticar efetivamente com esses estudantes, nós teríamos resultados”, explicou. Para ela, o problema está na forma como o sistema educacional mede a qualidade do ensino.
A docente citou as avaliações externas, como o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), e questionou sua efetividade. “Hoje tudo que se conta é número. Mas número de que forma? A troca de quê? A troca da sobrecarga do professor? A troca do adoecimento do professor?”, questionou. Segundo Inez, a pressão constante por resultados tem levado ao esgotamento físico e emocional dos educadores. “Ele tem nos adoecido diante das cobranças que são feitas e diante da falta de condições que não são oferecidas”, lamentou.
O PNE é o principal instrumento de planejamento da educação no país e serve de base para os Planos Estaduais e Municipais de Educação, que devem seguir suas diretrizes adaptadas às realidades locais. O último plano foi instituído em 2014 e prorrogado até o final deste ano, enquanto o novo texto pretende vigorar até 2035.
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) ainda não definiu quais parâmetros serão utilizados para avaliar a aprendizagem adequada. Apesar disso, algumas métricas já são aplicadas por órgãos da sociedade civil e pelo próprio Ministério da Educação. Segundo essas estimativas, menos de 10% dos alunos do terceiro ano do ensino médio têm aprendizagem considerada satisfatória em Matemática, um dado que, segundo pesquisadores, torna a meta proposta “irrealista”.