Negar o racismo é analfabetismo? Uma resposta ao professor Carlos André Pereira Nunes
24 novembro 2025 às 10h27

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Fernando Rassi Nader
Há debates que engrandecem a sociedade e há debates que a diminuem.
Quando um articulista inicia uma discussão pública afirmando que quem discorda dele é “analfabeto funcional”, o que se enfraquece não é o adversário, mas a própria elegância do argumento.
Rotular, atacar e desqualificar não é método científico, muito menos pedagógico. É apenas arrogância travestida de autoridade.
A história do Brasil não precisa ser reescrita com tintas ideológicas para ser compreendida.
Somos uma nação miscigenada, formada por encontros e desencontros, marcada por dores e injustiças, mas também por integração e convivência.
O Brasil nunca institucionalizou segregação racial como outros países, não tivemos leis de separação racial, não tivemos banheiros proibidos, escolas exclusivas por cor ou sistemas jurídicos diferenciados; temos problemas reais, mas transformar todos eles em racismo estrutural não é análise — é narrativa.
O articulista afirma que negar o racismo é “analfabetismo”. Não! Negar é exercer o direito legítimo de discordar e discordar não transforma ninguém em inimigo da razão, apenas revela que existem mais de uma lente possível para interpretar o país, se alguém precisa desqualificar o outro para vencer o debate, já perdeu antes de começar.
A escravidão existiu, foi brutal, injusta, errada e ninguém nega isso, mas ela não foi um fenômeno exclusivamente brasileiro, nem exclusivamente racial; povos de todos os continentes escravizaram e foram escravizados.
No Brasil, sua extinção não foi fruto de luta identitária moderna, mas de uma consciência moral cristã que apontava para algo maior, a dignidade intrínseca de toda pessoa humana.
A Princesa Isabel assinou a Lei Áurea movida por essa visão, não por teorias sociológicas que só surgiriam um século depois.

E aqui está um ponto fundamental que o articulista ignora: não é o brasileiro comum que perpetua desigualdades, é a estrutura política, econômica e educacional que falha há décadas e falha miseravelmente.
O Brasil não é atrasado porque seu povo é racista, o Brasil é atrasado porque não tem liberdade econômica, porque sufoca quem trabalha e produz, porque temos uma educação (e o novo PNE mostra muito bem isso) que desconstrói a importância da família, da religião, que não busca o conhecimento, não busca semear sabedoria, o desenvolvimento da ciência e muito menos a elevação do espírito através do que é bom, belo e verdadeiro; um plano nacional de educação que favorece pautas sociais, ideológicas, identitárias, linguagem neutra e a necessidade de controle social.
Se queremos explicar por que tantos brasileiros negros, brancos e mestiços enfrentam pobreza persistente, devemos olhar para essas causas, e não para uma narrativa simplificada que reduz tudo à cor da pele. Essa narrativa não emancipa ninguém, apenas acomoda e divide.
Na educação, a insistência em “currículos antirracistas” que já pressupõem opressores e oprimidos não educa, condiciona, ensina a criança a se enxergar como vítima antes de aprender a se enxergar como pessoa, ensina que sua identidade determina seu destino, e não seus talentos, virtudes e escolhas, ensina que existe uma “dívida” eterna e que, portanto, não há mérito possível.
Uma educação assim não forma cidadãos, forma ressentidos e é justamente isso que precisamos romper, a cultura da vitimização que limita o potencial das crianças brasileiras.
Somos chamados a reconstruir o Brasil com fundamentos verdadeiros: moralizar a política, fortalecer as famílias e educar as crianças sob a luz da verdade, não sob a sombra de narrativas ideológicas.
Aqui entra o que Aristóteles ensinou e São Tomás de Aquino aperfeiçoou: a verdadeira grandeza humana nasce dos bens da alma — sabedoria, prudência, justiça, coragem, temperança e não dos bens materiais ou das identidades transitórias.
Quando uma nação educa seus filhos para a virtude, para a busca da verdade, para o cultivo do intelecto e para a elevação do espírito, ela se liberta das paixões rasas, das narrativas divisórias, das desculpas coletivas.
Povo não precisa de vitimização
Um povo bem formado não precisa de vitimização, nem de determinismo social, nem de rótulos identitários para explicar sua própria existência, ele simplesmente cresce, floresce, supera e eleva consigo toda a nação.
Antes de concluir, deixo uma pergunta que não pode mais ser adiada: um povo que trabalha metade do ano para sustentar um Estado que o impede de prosperar, que não devolve segurança, saúde, saneamento básico, educação nem dignidade, e que assiste, dia após dia, ao desvio milionário do dinheiro público é um povo livre ou um povo mantido em servidão pelo próprio sistema que deveria servi-lo?
E mais: que tipo de escravidão é essa?
Certamente, não é uma escravidão de pele ou de raça. É uma escravidão econômica, alimentada por um Estado voraz.
É uma escravidão moral, sustentada pela corrupção que corrói a esperança.
É uma escravidão intelectual, fruto da ignorância produzida por um modelo educacional que não liberta, mas condiciona e emburrece.
Somos escravos sim, mas não uns dos outros, somos escravos de um sistema que impede o brasileiro de se tornar aquilo que, em dignidade e potencial, ele foi criado para ser.
Fernando Rassi Nader, médico pediatra, é especialista em Neurociência, Comportamento, Desenvolvimento Infantil e Educação. É diretor-geral da Interschool Brasil, 1° vice-presidente nacional do Instituto Harpia Brasil. (O artigo “Negar o racismo é analfabetismo”, do professor Carlos André Pereira Nunes, foi publicado no jornal “O Popular”.)
