Governos, empresas e organizações ambientais travam uma disputa silenciosa sobre o futuro da mineração em águas profundas. Com promessas de acesso a metais estratégicos para a transição energética, a atividade levanta alertas sobre os impactos ambientais em regiões ainda pouco conhecidas dos oceanos. A movimentação ocorre em meio à indefinição da Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISA), responsável por regular a exploração de áreas fora das zonas econômicas exclusivas dos países.

Atualmente, não há um marco legal internacional que permita a mineração comercial no fundo do mar. Mesmo assim, empresas como a canadense The Metals Company (TMC), em parceria com estados insulares como Nauru, pressionam a ISA para liberar os primeiros contratos de exploração, ainda que de forma provisória.

A expectativa era que um código global para a mineração em águas profundas fosse aprovado em julho de 2023, mas os debates se estenderam e devem seguir pelo menos até 2025. A TMC, no entanto, afirma que pretende iniciar a exploração já no próximo ano, alegando respaldo jurídico com base em lacunas do próprio sistema regulatório da ISA.

No centro da disputa estão as chamadas nódulas polimetálicas — formações ricas em manganês, níquel, cobalto e cobre, encontradas a até 6 mil metros de profundidade. Esses metais são considerados fundamentais para a produção de baterias e tecnologias limpas, essenciais para a descarbonização da economia global.

Empresas do setor argumentam que a mineração submarina pode ser mais eficiente e menos impactante do que a mineração terrestre, que costuma afetar áreas habitadas e florestas tropicais. A TMC, por exemplo, defende que a atividade representa uma alternativa mais sustentável, capaz de suprir a demanda crescente por insumos da chamada “economia verde”.

Danos aos ecossistemas marinhos

Ambientalistas, por outro lado, alertam para os danos profundos aos ecossistemas marinhos. O fundo do mar abriga espécies pouco conhecidas e formações geológicas que levam milhões de anos para se formar. A perturbação causada por máquinas, barulho e partículas em suspensão pode prejudicar cadeias alimentares inteiras, liberar carbono estocado nos sedimentos e afetar mamíferos marinhos.

A urgência das empresas por licenças se intensificou após julho de 2021, quando Nauru acionou uma cláusula da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar que obriga a ISA a analisar pedidos de exploração no prazo de dois anos, mesmo sem a existência de regras definitivas.

Até o momento, cerca de 30 contratos de exploração mineral em águas internacionais já foram assinados, todos em fase de pesquisa e coleta de dados. A maioria deles está concentrada na Zona Clarion-Clipperton, no Oceano Pacífico.

Diante da pressão, um grupo de mais de 20 países, incluindo o Brasil, defende a adoção de uma moratória global. A proposta é suspender qualquer autorização para mineração até que existam estudos científicos robustos sobre os impactos da atividade e regras claras para evitar danos ambientais irreparáveis. A postura brasileira acompanha a de nações como Alemanha, Chile, Suíça, Espanha e França, que pedem mais tempo e cautela.

A discussão segue no Conselho da ISA, sediado em Kingston, na Jamaica, onde diplomatas, cientistas e representantes da indústria tentam construir um consenso sobre o futuro da mineração no fundo do mar. Enquanto isso, o risco de uma corrida desordenada e sem regulamentação cresce. A próxima rodada de negociações está prevista para novembro.

Leia também

Mineração no fundo do oceano pode começar em breve; riscos são desconhecidos