O cantor Milton Nascimento, de 82 anos, foi diagnosticado com demência por corpos de Lewy (DCL), uma das formas mais comuns da doença neurodegenerativa que afeta funções cognitivas, motoras e comportamentais. A revelação foi feita por seu filho e empresário, Augusto Nascimento, em entrevista à revista Piauí. 

Para compreender melhor a condição, o Jornal Opção conversou com o médico geriatra Dyenys Caetano, que destacou sintomas, formas de prevenção e os principais desafios enfrentados por pacientes em Goiás.

Segundo Augusto, os problemas começaram a se intensificar no início deste ano, período em que Milton foi homenageado pela escola de samba Portela e teve sua última turnê eternizada em documentário. Apesar da agenda cheia, o artista começou a apresentar episódios de esquecimento, olhar fixo, repetição de histórias e até mudanças no apetite.

Médico geriatra Dyenys Caetano | Foto: Divulgação

Em abril, o clínico geral Weverton Siqueira, que acompanha Milton há dez anos, decidiu realizar uma bateria de testes cognitivos, avaliando memória, atenção, fala, orientação espacial e capacidade de cálculo. Segundo Augusto, foi a primeira vez em dez anos que o médico se assustou com o estado do músico.

A situação levou pai e filho a buscarem uma forma de lidar com o momento delicado. “Quando vi que o meu pai apresentava uma piora brusca no quadro cognitivo, perguntei ao médico se seria uma loucura fazer uma viagem de motorhome com ele pelos Estados Unidos”, relatou Augusto. O clínico apoiou a ideia.

Assim, em maio, os dois embarcaram para Dallas, no Texas, e de lá seguiram para Phoenix, no Arizona, onde alugaram um motorhome. A aventura os levou por estados como Utah, Idaho, Wyoming e Montana. Foram mais de 4 mil quilômetros em 17 dias. “Meu pai contava para todo mundo como se tivesse sido a melhor coisa da vida dele”, disse Augusto. Poucas semanas depois, o diagnóstico médico confirmou a suspeita de DCL.

Entendendo a demência por corpos de Lewy

A demência por corpos de Lewy é causada pelo acúmulo anormal de proteínas chamadas alfa-sinucleínas no cérebro. Esses depósitos, conhecidos como corpos de Lewy, provocam degeneração e morte de células nervosas, resultando em sintomas semelhantes aos do Alzheimer e também de distúrbios motores típicos do Parkinson.

Questionado sobre como identificar os sinais iniciais, o doutor Dyenys Caetano conta que “normalmente, os sinais mais visualizados no paciente que está iniciando a demência é a perda de memória de informações recentes, dificuldade de reter novas informações, alterações no humor ou personalidade”.

Ele explicou ainda como diferenciar o esquecimento natural do envelhecimento dos sintomas de uma doença neurodegenerativa. “Normalmente, o esquecimento senil costuma ser mais leve e sutil, sem grandes prejuízos nas atividades de vida diária. Já a demência costuma trazer declínio cognitivo mais grave levando o paciente a prejuízo de suas atividades diárias, com perda de funcionalidade e autonomia”.

Diagnóstico e exames disponíveis

O geriatra destacou que a medicina dispõe de diferentes métodos para detectar a doença de forma precoce. “Existem vários testes para avaliação cognitiva para avaliar demência no idoso, dentre eles os testes de avaliação cognitiva como MiniMental, MoCa, teste do relógio, dentre outros. Além disso, os exames de imagem também nos dão ideia de alguns tipos de demências, sendo os mais utilizados Ressonância Magnética de Crânio, Tomografia Computadorizada de Crânio, Spect Cerebral. Há ainda os biomarcadores no liquor e sangue, os quais ainda estão em desenvolvimento mas bastante promissores”.

Quando questionado sobre a estrutura disponível em Goiás, o especialista reforçou que o acompanhamento precisa ser contínuo e multidisciplinar. “O tratamento usual das demências é a nível ambulatorial, normalmente com seus respectivos médicos (neurologista ou geriatra) e com acompanhamento diário. Além disso o paciente e familiares têm melhor suporte quando acompanhados por equipe multidisciplinar, ou mesmo sob cuidado de cuidadores capacitados”.

Ele também destacou as barreiras locais. “O principal desafio ainda é o acesso do paciente a médicos devidamente capacitados para realizar um devido diagnóstico e iniciar tratamento correto de cada demência, além de suporte familiar incorreto, daí a necessidade de uma equipe multiprofissional, principalmente composta por cuidadores, os quais ficam mais atentos ao sinais e sintomas do paciente demenciado”.

Fatores de risco e prevenção

O doutor Dyenys Caetano também ressaltou que alguns hábitos de vida podem aumentar a vulnerabilidade ao desenvolvimento de demências. “Há estudos que evidenciam o risco aumentado de demência em pessoas tabagistas, com estilo de vida sedentário, com alimentação não balanceada, além de pessoas com transtornos psiquiátricos prévios, como Transtorno Afetivo Bipolar, e pessoas com baixo nível de escolaridade”.

Apesar disso, há medidas de prevenção. “Até o momento, a melhor prevenção às demências é o estilo de vida saudável, com uma alimentação equilibrada, atividade física, evitar tabagismo e etilismo, além de estimulação cognitiva contínua, como estudar e/ou a prática de ler”.

Leia também: Milton Nascimento emociona em show que revisita seus 56 anos de carreira