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A Justiça de Goiás determinou que a Amazon Serviços de Varejo do Brasil Ltda suspenda, em até 30 dias, a veiculação de propagandas publicitárias interruptivas no serviço de streaming Prime Video para todos os consumidores que contrataram o serviço antes da implementação da prática. A decisão, que tem abrangência nacional, foi proferida pelo juiz Marcelo Pereira de Amorim, da 21ª Vara Cível de Goiânia, ao julgar procedentes os pedidos do Ministério Público de Goiás (MPGO) em ação civil pública.

O magistrado considerou abusiva a mudança unilateral nos contratos de prestação de serviço feita pela Amazon, que inseriu anúncios durante a exibição de filmes e séries e passou a cobrar R$ 10 adicionais para a remoção dessas propagandas. A sentença estabelece ainda multa de R$ 50 mil por dia em caso de descumprimento, limitada a R$ 3 milhões, valor que será revertido ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos.

A ação foi proposta pelo promotor de Justiça Élvio Vicente da Silva, da 70ª Promotoria de Goiânia, após instauração de inquérito civil que investigou a alteração no serviço de streaming. “A prática impugnada afeta substancialmente milhões de consumidores brasileiros assinantes do serviço Prime Video, transcendendo interesses meramente individuais e atingindo a coletividade de forma ampla e difusa, o que evidencia o relevante interesse social subjacente à demanda”, destacou o juiz na sentença.

A abrangência da decisão é nacional, conforme entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O juiz argumenta que restringir os efeitos à base territorial da comarca de Goiânia violaria o princípio da isonomia, já que a prática impugnada é uniforme em todo o país. “Determino que os efeitos desta decisão alcancem todos os consumidores brasileiros afetados pela prática abusiva da requerida, independentemente de sua localização geográfica”, frisou Marcelo Pereira de Amorim.

A sentença determina que a Amazon:

  • suspenda os anúncios interruptivos para os consumidores antigos, que contrataram o serviço antes da implementação da prática;
  • abstenha-se de cobrar qualquer valor adicional para remoção dos anúncios nos contratos firmados antes da mudança;
  • mantenha o preço originalmente contratado para os consumidores antigos sem redução da qualidade do serviço;
  • comunique individualmente e de forma clara todos os clientes sobre seus direitos;
  • disponibilize canal específico de atendimento para reclamações relacionadas ao caso;
  • apresente ao MPGO e ao Procon Goiás, no prazo de 60 dias, relatório detalhado com as medidas adotadas para cumprimento da decisão.

Além disso, a empresa deverá, nos novos contratos, esclarecer previamente a quantidade, duração, frequência e forma de inserção dos anúncios, discriminando claramente as diferenças entre os planos com e sem propaganda.

A Amazon também foi condenada a devolver, de forma simples, os valores pagos por consumidores que contrataram a opção sem anúncios. A devolução deverá ser corrigida monetariamente e acrescida de juros legais, mas sem restituição em dobro, pois o juiz entendeu que havia controvérsia jurídica sobre o tema e um “engano justificável” por parte da empresa.

Na avaliação do magistrado, a cobrança de R$ 10 adicionais para remover os anúncios configura venda casada indireta. “A estratégia da Amazon degrada artificialmente o serviço original ao incluir anúncios, para depois oferecer como ‘produto’ separado a mesma experiência já contratada, agora com cobrança extra”, escreveu na sentença.

O juiz sustentou que a modificação violou a confiança legítima do consumidor. “A ausência de publicidade era uma característica essencial do serviço e sua supressão representa quebra da base objetiva do contrato, frustrando expectativa legítima dos usuários”, argumentou. A sentença também considerou insuficiente a comunicação feita pela empresa aos usuários sobre a mudança, contrariando o artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que trata do direito à informação clara e adequada.

Amazon alega legalidade

Em sua defesa, a Amazon alegou ilegitimidade do MPGO para ajuizar a ação, afirmando que os direitos discutidos seriam meramente individuais. No entanto, o juiz rejeitou a preliminar, reconhecendo que a prática denunciada impacta milhões de consumidores e, portanto, justifica a atuação do Ministério Público na defesa de direitos coletivos e difusos, conforme jurisprudência pacífica do STJ.

Nos autos, a Amazon defendeu que a prática era permitida pelos Termos de Uso, que preveem possibilidade de alteração contratual, e afirmou que houve comunicação prévia por e-mail, SMS e mensagens na área do cliente. A empresa também argumentou que os usuários poderiam cancelar a assinatura a qualquer momento, com reembolso proporcional.

O juiz, no entanto, rejeitou os argumentos, observando que “a continuidade do uso de um serviço após modificações unilaterais não configura anuência do consumidor às novas condições”, especialmente quando há assimetria informacional e técnica entre fornecedor e cliente.

A sentença foi publicada nesta terça-feira, 15, e ainda cabe recurso. Caso não seja reformada, a Amazon terá de cumprir as determinações sob pena de multa e de nova responsabilização judicial. O caso é acompanhado por órgãos de defesa do consumidor em todo o país.

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