Homem negro vira réu por injúria racial após cobrar dívida de italiano

18 janeiro 2024 às 16h13

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A Justiça de Alagoas aceitou, nesta segunda-feira, 15, a denúncia do Ministério Público contra um homem negro por prática de racismo. De acordo com a denúncia, o denunciado afirmou que o homem que se apresenta como vítima de racismo tinha “cabeça europeia branca escravagista”.
O caso foi registrado no ano passado após o italiano alegar ter sido supostamente ofendido pelo sobrinho da companheira que teria lhe cobrado uma dívida. Nas mensagens, o denunciado teria dito que o patrão não conseguia enxergar nada além de si por causa da “cabeça branca, europeia e escravagista”.
Lei equiparou injúria ao racismo
A Lei nº 14.532/2023, que equipara a injúria racial ao crime de racismo, foi publicada em janeiro de 2023. A norma alterou a Lei do Crime Racial (7.716/1989) e o Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848/1940) para tipificar como racismo a injúria racial.
A mudança prevê pena de suspensão de direito em caso de racismo praticado no contexto de atividade esportiva ou artística, e reclusão para o racismo praticado por funcionário público, bem como para o racismo religioso e recreativo. Conforme a nova Lei, “injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional” pode gerar pena de reclusão (de dois a cinco anos) e multa.
A pena será aumentada quando o crime for cometido por duas ou mais pessoas. A legislação orienta que, na interpretação da norma, os juízes considerem como “discriminatória qualquer atitude ou tratamento dado à pessoa ou a grupos minoritários que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida, e que usualmente não se dispensaria a outros grupos em razão da cor, etnia, religião ou procedência”.
O texto também define que “se qualquer dos crimes for cometido por intermédio dos meios de comunicação social, de publicação em redes sociais, da rede mundial de computadores ou de publicação de qualquer natureza” ou mesmo “se qualquer dos crimes for cometido no contexto de atividades esportivas, religiosas, artísticas ou culturais destinadas ao público”, a pena é de reclusão (de dois a cinco anos), além da proibição de frequência por três anos aos locais destinados a práticas esportivas, artísticas ou culturais destinadas ao público, conforme o caso.
AGRAVANTE — Os crimes previstos na Lei terão penas aumentadas de um terço (1/3) até a metade, quando ocorrerem “em contexto ou com intuito de descontração, diversão ou recreação”. Da mesma forma, terão as penas aumentadas os crimes praticados por funcionário público, conforme definição prevista no Código Penal, “no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las”.
Confira a nota do Ministério Público de Alagoas
- O Ministério Público do Estado de Alagoas informa que, a respeito do caso ocorrido em Coruripe, em 2023, onde um homem italiano apresentou uma queixa-crime contra um cidadão que morava em sua residência (ele era sobrinho do companheira do italiano), foi ajuizada uma ação penal por injúria racial. Tal denúncia foi proposta com base nas provas apresentadas pelo advogado do italiano.
- O caso em questão se trata de crime de injúria racial, que é configurado quando alguém tem o objetivo de ofender outra pessoa em razão de raça, cor, etnia, religião ou origem. A Lei nº 14.532/23, sancionada ano passado, estabeleceu que esse ilícito penal passou a ser crime de ação penal pública incondicionada, ou seja, ele não depende mais de qualquer queixa formalizada pela vítima, passando, o Ministério Público, a ser o titular da ação penal.
- O Ministério Público, ao analisar o caso concreto, leva em consideração as provas acostadas aos autos, _ in casu_ que foi protocolado pela defesa do italiano. Dentre essas provas, estão conversas em que um homem profere palavras ofensivas à vítima, referindo-se, de forma pejorativa, à sua nacionalidade italiana. Ao ajuizar uma denúncia contra um acusado, o MPAL não pode se ater a cor da pele ou a qualquer outra característica que ele possua, uma vez que tal questão não está relacionada ao suposto ato praticado.
- Por fim, o MPAL esclarece que, dentro da instrução processual, ambas as partes envolvidas na ação penal terão a oportunidade de apresentar seus argumentos e defesas, conforme estabelece o Código de Processo Penal. E, caso seja comprovado que o réu foi vítima de algum crime praticado pelo italiano, a Promotoria de Justiça de Coruripe solicitará instauração de inquérito policial para a devida apuração.
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