Pela primeira vez na história, negros estão à frente da prefeitura e da câmara de Goiânia.Nas últimas eleições, dos 57.608 vereadores eleitos, apenas 6,16% são pretos. Representatividade é baixa, visto que 56,2% da população é negra

Romário Policarpo e Rogério Cruz lutam pela igualdade racial em Goiânia. | Foto: Fernando Leite

Goiânia está entre os 32% das cidades brasileiras comandadas por prefeitos negros. A liderança política de Rogério Cruz representa a responsabilidade de se construir uma gestão voltada para uma luta histórica. Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostram que, apesar do espaço, é preciso investir em políticas afirmativas para estimular participação deste grupo, que é maioria da população.

Em 2020, foram eleitos 5,4 mil prefeitos no Brasil, 1,7 mil negros. Embora o número seja significativamente inferior à quantidade de prefeitos brancos (3,7 mil), foi maior do que o atingido em 2016. Segundo dados do TSE, de um período para outro, o comando por prefeitos pretos nas cidades passou de 26% para 32%. O pleito também teve a maior proporção e o maior número de candidatos negros registrados pelo TSE.

No Dia da Consciência Negra, o chefe do executivo municipal ressaltou a representatividade da data. “Como todo negro, eu convivi com o preconceito em vários momentos da minha vida. Mas nunca me abati. Sigo firme e hoje tenho muito orgulho de ser o primeiro prefeito negro de Goiânia”, disse Rogério Cruz.

Vice de Maguito Vilela nas eleições 2020, Rogério Cruz assumiu o comando da capital em 15 de janeiro. O emedebista morreu por complicações da Covid-19. Logo no início da gestão, o inédito prefeito de Goiânia instalou em no gabinete uma imagem de Nelson Mandela, principal líder político da África do Sul. O quadro é assinado pelo artista goiano Selvo Afonso.

A inspiração representa a luta pela desigualdade racial que se propõe Rogério Cruz. “Novas lideranças que foram vítimas de preconceito por raça, cor ou religião começam a surgir. O interessante é que elas têm um olhar mais sensível e atento a questões como esta, justamente por já terem sido discriminadas”, analisou o prefeito.

Rogério Cruz tem quadro de Nelson Mandela em seu gabinete. | Foto: divulgação

TSE

A observação de Rogério Cruz tem amparo nos dados do TSE. Nas últimas eleições municipais, dos 57.608 vereadores eleitos, 6,16% eram pretos e 38,8% pardos. Os brancos foram maioria (53,56%), e amarelos não chegaram a 1%.

Em 283 municípios brasileiros, a Câmara dos Vereadores foi completamente preenchida por negros. No entanto, o número total no país representa apenas 10% das candidaturas registradas.

Segundo a Agência Senado, o número de ocupantes negros nas Câmaras Municipais das capitais brasileiras subiu de 42%, em 2016, para 44% em 2020. A representatividade é considerada baixa ao se levar em conta que, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 56,2% da população brasileira é negra.

Legislativo

A representatividade também é presente na Câmara Municipal de Goiânia. Romário Policarpo, presidente da Casa, é negro. Segundo o cientista política Guilherme Carvalho, a parceria entre executivo e legislativo é essencial para a luta. “Sempre que possível, Rogério e Romário enfatizam a questão étnica e isso é muito importante para a conscientização”, pontuou o especialista.

Alvo de racismo, o vereador é atento e vigilante à demanda racial. “Sabemos que a exclusão afeta em maior proporção a população negra. O prefeito Rogério Cruz e eu ainda somos exceção em funções de liderança política, mas, sem dúvidas, estamos avançando”, relatou Romário Policarpo.

O Dia da Consciência Negra é visto pelo vereador como uma oportunidade de reafirmar o compromisso. “O prefeito Rogério, por sua formação e origem, tem demonstrado muita sensibilidade no atendimento a essas demandas”, analisou o presidente da Câmara.

Gestão representativa

Feiras das Pretas incentiva afroempreendedorismo. | Foto: divulgação

Uma das propostas de Rogério Cruz para a representatividade foi o lançamento da Feira das Pretas. O evento exibe e vende peças criadas por mulheres negras da comunidade local para incentivar o afroempreendedorismo e valorizar a cultura. Neste fim de semana, será realizada a quarta edição. Além disso, o prefeito foi responsável por propor a lei que instituiu o Dia de Combate à Intolerância Religiosa.

Guilherme Carvalho ressaltou a importância das ações e a necessidade de perpetuação da luta. “É simbólico ter representantes nos maiores cargos do Município, mas é necessário que mais pessoas consigam se fazer representar pelo voto ou pela ocupação de espaços. Para que a sociedade tome consciência, tem de se tornar tradicional falar do problema para que todos entendam”, explicou o cientista político.