Geólogo explica origem das águas termais de Caldas Novas e diz que não há risco de resfriamento

08 outubro 2025 às 12h04

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O geólogo Fábio Haesbaert, pesquisador dos aquíferos da região das Águas Quentes, explicou ao Jornal Opção a origem, o funcionamento e a estabilidade das fontes termais de Caldas Novas. Segundo ele, as águas não estão esfriando e a temperatura das nascentes permanece estável e controlada, com monitoramento constante.
“Não está esfriando, isso é um absurdo. A temperatura das águas é estável, o que pode variar é a temperatura das piscinas, que se resfriam durante a noite ou quando ficam abertas por muito tempo”, afirmou o especialista.
Haesbaert explica que o fenômeno que torna Caldas Novas a maior estância hidrotermal do mundo tem origem puramente natural. “Essas águas são de chuva. Elas se infiltram na Serra de Caldas, descem por fraturas da crosta terrestre até profundidades de mais de mil metros e, lá embaixo, são aquecidas pelo calor natural do interior da Terra. Esse aquecimento se chama gradiente geotérmico”, explicou.
O geólogo informou que, historicamente, a comunidade cientifica acrediava que a Serra de Caldas fosse um vulcão extinto, por causa do formato elíptico da formação geológica. “Durante muito tempo se pensou que a Serra de Caldas fosse um vulcão. Quando se observa por satélite, o relevo parece uma cratera antiga. No século XIX, naturalistas franceses e portugueses registraram essa hipótese, mas ela foi descartada porque não existem rochas vulcânicas na região”, disse.
Segundo ele, o formato da serra é resultado de processos tectônicos antigos, e não de erupções. “O que existe aqui é uma estrutura arqueada, formada há centenas de milhões de anos por dobramentos da crosta. Depois, a erosão deu o formato que temos hoje. Não há nenhuma relação com vulcanismo.”
Aquíferos Araxá e Paranoá
Caldas Novas está assentada sobre dois grandes aquíferos, o Araxá e o Paranoá, que armazenam a água mineral em camadas profundas. “Essas rochas, formadas há cerca de 600 milhões a 1 bilhão de anos, guardam as águas termais que hoje abastecem os poços e balneários”, explicou.
“O aquífero Araxá é mais raso e tem águas com temperaturas entre 32 °C e 44 °C. Já o aquífero Paranoá é mais profundo e tem águas acima de 50 °C”, disse. Segundo ele, “a água do Paranoá é tão quente que, se usada diretamente, pode causar queimaduras”. Por isso, hotéis e parques costumam misturar as águas dos dois aquíferos para chegar à temperatura ideal de banho.
“As águas de Caldas são minerais e termais, com presença de bicarbonato e magnésio, e uma leve radioatividade natural que traz benefícios terapêuticos. Desde o Império, essas águas são usadas para saúde e bem-estar. Os registros históricos de uso datam de antes de 1600”, lembrou Haesbaert.
Controle e monitoramento permanente
O geólogo ressaltou que toda a exploração das águas é controlada por telemetria e acompanhada em tempo real por órgãos técnicos. “Hoje cada poço é monitorado minuto a minuto. A extração é controlada pela Agência Nacional de Mineração (ANM) e pela Associação das Águas Termais (Amat). Há uma sala de situação que acompanha temperatura, vazão e qualquer variação possível”, disse.
Ele explica que o sistema é considerado modelo no país. “Caldas Novas é um exemplo para o Brasil inteiro. O controle é rigoroso e tecnicamente fundamentado. Nenhum poço pode bombear além do limite autorizado”, afirmou.
Durante a pandemia de Covid-19, o monitoramento mostrou um fenômeno curioso: a recuperação natural dos níveis de água. “Com a cidade parada, os poços reduziram o bombeamento e o lençol freático subiu. O sistema de telemetria registrou isso claramente. As antigas nascentes voltaram a jorrar no Ribeirão de Caldas. Foi uma comprovação científica de que o aquífero está vivo e se recupera quando o uso diminui.”
Uso turístico
Questionado sobre o impacto do uso turístico intenso, com centenas de hotéis, pousadas e parques aquáticos, Haesbaert afirmou que o sistema é sustentável. “O turismo não ameaça o aquífero, porque o uso é ordenado. Cada empreendimento tem autorização específica e segue regras de exploração. O que existia antes, nas décadas de 1960 e 1970, era um cenário sem controle, quando a perfuração de poços cresceu de forma desordenada. Hoje é completamente diferente”, explicou.
Ele recorda que a perfuração do primeiro poço, na década de 1960, marcou o início da expansão da cidade. “A partir do primeiro poço, houve uma corrida por novas captações. Depois, o antigo Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM), hoje ANM, organizou o processo, dividindo as áreas e regulando o uso. Foi isso que permitiu o crescimento equilibrado de Caldas Novas e Rio Quente.”
“A água é limpa e pura”
Haesbaert também comentou críticas de que a água termal seria desperdiçada. Ele explicou que, após uso, a água é tratada e pode ser reutilizada. “As águas são puras, limpas e de altíssima qualidade. Elas passam por tratamento antes de serem devolvidas à natureza. Há um Termo de Ajustamento de Conduta com o Ministério Público que permite o reuso para fins diversos, inclusive lavagem e irrigação”, disse.
Segundo o geólogo, o mito de que as águas estariam poluindo o Ribeirão de Caldas foi resultado de desinformação. “O que poluía o ribeirão era o esgoto da cidade, não as águas termais. As águas quentes, pelo contrário, ajudavam a diluir e limpar o curso d’água.”
Fábio coordena, desde 2005, o projeto Preserva das Serras, em parceria com universidades brasileiras e estrangeiras. O programa monitora a dinâmica dos aquíferos e propõe medidas de conservação. “Trabalhamos com pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Técnica de Berlim. O modelo é matemático, contínuo e serve de base para toda a gestão de recursos hídricos da região”, explicou.
Para ele, a combinação de pesquisa científica e gestão técnica garante a segurança do sistema. “O estudo é permanente. Não existe risco de resfriamento, não existe risco de esgotamento. As águas de Caldas são um patrimônio natural e estão sendo geridas com responsabilidade e ciência”, completou.
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