Futuro do transporte público em Goiânia: BNDES aponta que número de usuários pode triplicar em 30 anos

02 agosto 2025 às 21h00

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Por dia, 82 mil pessoas usam o sistema de transporte coletivo na Região Metropolitana de Goiânia — que reúne Goiânia e mais 18 municípios integrados —, segundo o Estudo Nacional de Mobilidade Urbana (ENMU), conduzido pelo BNDES. Dentre as 21 regiões metropolitanas que foram analisadas neste estudo, a capital goiana apresentou o índice mais baixo: apenas 17,2% das viagens motorizadas são feitas por transporte público, percentual inferior ao de todas as outras regiões.
Para calcular os usuários diários, o estudo considerou dados obtidos pela bilhetagem eletrônica de 2023, mas o número foi confirmado pela Companhia Metropolitana de Transportes Coletivos (CMTC) de Goiânia. Segundo a empresa, o BRT Leste-Oeste conta com 9 linhas e transporta 41.741 passageiros por mês, em média. Já o BRT Norte-Sul, com 5 linhas, soma 40.165 usuários diários. Isso totaliza mais de 576 mil pessoas por mês.
Projeção
O estudo do BNDES fez uma projeção dos possíveis resultados para daqui a 30 anos, caso Goiânia continue com a implantação das Redes Futuras propostas pelo ENMU, esse número pode chegar a 43,4%. Isso só será possível com a aplicação de políticas públicas adicionais sugeridas pelo estudo, como tarifa módica, integração plena, corredores exclusivos e desincentivo ao carro. A participação do transporte público nas viagens motorizadas pode ir de 17,2%, até 43,4% em 2054, o que transformaria o transporte coletivo no principal modo de deslocamento urbano na região. Em Goiânia, esses avanços começaram principalmente no BRT, em funcionamento após 10 anos de obras.
Ao Jornal Opção, o secretário de Engenharia de Trânsito de Goiânia, Tarcísio Abreu, disse que o trânsito é o “maior desafio” da gestão na cidade. Goiânia têm mais de 1,3 milhão de veículos circulando, segundo Tarcísio, quase 1 veículo por habitante. Por isso, a política pública também tenta incentivar o uso de transporte público para “desafogar” o trânsito. “O transporte público será a referência e o ponto de virada da mobilidade de Goiânia”, disse ele.

O BRT é uma grande aposta porque, para o secretário, objetiva suprir as maiores reclamações dos usuários: tempo de espera, infraestrutura e quantidade de viagens. “Sem dúvida nenhuma, o BRT é uma das melhores soluções que nós temos hoje para transporte público. Se nós queremos migrar as pessoas para o sistema, o BRT é um forte condutor”, explicou ele.
Obras
O secretário não deixou de reforçar que as reformas e obras devem ser finalizadas para que esse cenário seja possível. Segundo a CMTC, Goiânia conta com dois corredores de BRT em operação: o Eixo Leste-Oeste (Anhanguera) e o BRT Norte-Sul. Cinco terminais do Eixo Leste-Oeste estão atualmente em obras, enquanto o Terminal Novo Mundo já foi entregue e o da Praça da Bíblia será inaugurado em setembro. Os quatro últimos — Praça A, Dergo, Padre Pelágio e Senador Canedo — têm entrega prevista para dezembro. As 19 estações do Eixo Anhanguera também foram totalmente revitalizadas e a expectativa é de que toda a frota da Rede Metropolitana de Transporte Coletivo (RMTC) seja renovada até o fim de 2026.
Segundo o secretário, a pasta deve concluir as últimas duas etapas da obra do corredor viário BRT Norte-Sul, entregue em 2024, para uma possível expansão do trecho no futuro. Essas etapas correspondem aos trechos finais da obra entre o Terminal Isidória e o município de Aparecida de Goiânia, pela avenida 4º Radial, e o Terminal Isidória e o Setor Parque Atheneu, pela avenida 3º Radial. “O projeto [de conclusão] está pronto, o edital será publicado para poder realmente concluir essa etapa”, afirmou.
No levantamento, as instituições apontam que Goiânia tem capacidade para a ampliação da chamada Rede Futura em mais de 104 quilômetros, dos atuais 31 quilômetros que se encontram na cidade, uma ampliação na ordem de 340%. Hoje, apenas 13% da população da RM Goiânia vive a até 1 km de uma estação de BRT. Com os investimentos propostos, esse índice poderá chegar a 36,4%. A população mais pobre, com renda de até dois salários mínimos, seria uma das mais beneficiadas, com um aumento de 34,8 pontos percentuais na cobertura. O impacto estimado no número de passageiros transportados diariamente também é expressivo: aumento de 229% até 2054.
Usuária de transporte público na capital desde os 13 anos, Maria* (nome fictício porque a pessoa preferiu não ser identificada), hoje aos 50 anos, vai do Terminal de Aparecida até o Isidória pelo menos três vezes por semana e garante que a capital está em uma “fase boa” nesse quesito. O trecho, hoje, é atendido pelo BRT. Mesmo com a promessa de modernização, no presente, a experiência dos usuários revela um sistema que ainda enfrenta problemas estruturais básicos.

Experiência dos usuários
A implementação de faixas exclusivas, a climatização dos veículos e a regularidade foram os benefícios mais apontados pelos usuários, em levantamento feito pelo Jornal Opção, principalmente quando comparado ao sistema convencional. Ainda que o transporte coletivo goianiense tenha desafios evidentes, os usuários do BRT reconhecem melhorias na rotina de deslocamento. No trajeto entre o Terminal Isidória e o Terminal Veiga Jardim, Augusto Sobrinho, 25 anos, costuma usar o BRT de duas a três vezes por semana. Ele considera que a principal mudança está no conforto. “Acho ele muito bom, principalmente pela climatização dentro do ônibus. Além disso, em relação ao ônibus tradicional, ele anda mais rápido e com intervalo menor entre os ônibus devido à faixa exclusiva”, destaca.
Moradora da região central, Rafaela Anjos, 29 anos, faz o caminho entre a Praça Cívica e o setor Pedro Ludovico até quatro vezes por semana. Ela diz que o BRT trouxe benefícios visíveis em relação ao sistema comum. “A frequência é boa, o ar-condicionado funciona bem e até as tomadas ajudam muito. Raramente vou em pé”, afirma. Já Paula Thamine, 26 anos, percorre semanalmente o trajeto entre Aparecida de Goiânia e o Terminal Cruzeiro, de onde segue para o setor Pedro Ludovico. Ela destaca que a integração entre o BRT e linhas alimentadoras contribuiu para reduzir o tempo de espera.
Superlotação e acessibilidade

Raquel Moura, 26 anos, utiliza o BRT cerca de quatro vezes por semana em um único trajeto: do Terminal Cruzeiro até a Praça Cívica, sem a necessidade de integrações com outras linhas. Para Raquel, o maior benefício está na existência de corredores exclusivos, o que garante um fluxo mais direto. “Ele consegue pegar um corredor só dele, então isso é uma vantagem”, afirma. Ela também reconhece que, apesar dos desafios urbanos, a estrutura do BRT oferece recursos que favorecem a mobilidade cotidiana. “Tem rampa, tem acessibilidade, isso tem. Tem painel com informações de horários, com horas do dia, tem sempre uma pessoa nas plataformas durante o período do dia, que é o horário em que tem mais movimentação. Eu nunca presenciei uma plataforma que não tem alguém para informar”, relata.
Apesar do corredor exclusivo, Raquel nota que o tempo de deslocamento não melhorou significativamente, especialmente porque viaja nos horários de pico. “Em relação a melhorar meu tempo, não faz tanta diferença, porque depende dos horários de pico também. Como eu uso um horário de pico, continua pra mim mantendo o mesmo tempo, sabe?”, diz. Outros usuários também apontam os horários de maior movimentação e a demora para embarcar nos terminais de bairro como problemas. Augusto, por exemplo, observa que o trajeto principal funciona bem, mas as conexões periféricas nem tanto. “Meu problema com o BRT/ônibus é a superlotação nos horários de pico e, além disso, o intervalo grande entre um ônibus e outro nos terminais”, comenta.
Bartolomeu Pereira, 22 anos, que costuma viajar entre o Terminal Padre Pelágio e a Praça Cívica, destaca falhas de acessibilidade que acabam prejudicando pessoas com mobilidade reduzida. “As plataformas de ônibus ali do BRT têm muitos problemas estruturais. A porta automática, por exemplo, é um sistema que falha, a questão da distância que o ônibus passa entre a porta e a plataforma, que deixa um vão muito grande e pessoas que não conseguem fazer uma abertura muito grande da perna, ou às vezes até um cadeirante que está esperando para entrar dentro do ônibus, uma pessoa que está utilizando a muleta, ele não vai conseguir fazer essa travessia para dentro do ônibus. Então, acaba se tornando muito perigoso”, disse.
Para ele, faltam funcionários de apoio em algumas estações, o que deixa os usuários que precisam de auxílio vulneráveis. Raquel Moura também identifica esses riscos: “o espaço entre o ônibus e a plataforma ainda deixa uma distância. Conheço umas três pessoas que já viram outras caindo ali”, afirma.
A segurança de quem precisa de assistência também desperta a atenção de Augusto, que teme que a lotação impeça motoristas de atender passageiros com deficiência. “Minha preocupação é com os horários de pico e os cadeirantes, devido a lotação, já vi motoristas não parando para pegá-los”, observa. Ele também disse que presenciou idosos e pessoas com mobilidade reduzida com dificuldade para entrar e sair do ônibus, além dos problemas de acesso de pessoas obesas nas catracas. Mesmo assim, ele reconhece o preparo de grande parte dos motoristas. “Eles são pacientes, vez ou outra presencio situações de falta de educação”, disse.
Rafaela ainda menciona que há pouca divulgação de informações sobre as mudanças nas rotas nos fins de semana. Para Paula, o reforço na operação aos sábados e domingos também seria um avanço necessário. “A estrutura é boa, mas ainda demora”, completa.
BRT Eixo Leste-Oeste (Anhanguera)
De onde até onde:
- Início: Terminal Padre Pelágio (extremo oeste, saída para Trindade)
- Término: Terminal Novo Mundo (região leste, próximo à divisa com Aparecida de Goiânia)
- Extensão: Cerca de 14 km na via central, com extensões metropolitanas até os terminais em Senador Canedo e Goianira (através de linhas integradas)
BRT Eixo Norte-Sul
De onde até onde:
- Início: Terminal Recanto do Bosque (zona norte)
- Término: Terminal Veiga Jardim (Aparecida de Goiânia, zona sul da RM)
- Extensão: Cerca de 29,6 km, com 31 estações
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