Entenda porque cientistas brasileiros estão enviando alimentos para o espaço

09 julho 2025 às 15h45

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A produção de alimentos no espaço está cada vez mais próxima de se tornar realidade — e o Brasil tem papel de destaque nessa jornada. Em abril de 2025, uma equipe de pesquisadores brasileiros, liderada pela Embrapa e pela Agência Espacial Brasileira (AEB), enviou uma muda de batata-doce e sementes de grão-de-bico ao espaço a bordo da missão NS-31 da Blue Origin.
O objetivo é entender como essas plantas se comportam em ambientes de microgravidade, com uso restrito de água e insumos, para que futuramente possam ser cultivadas fora da Terra — como na Estação Espacial Internacional, na Lua ou até em missões a Marte.
Por que batata-doce e grão-de-bico?
Segundo a pesquisadora Alessandra Fávero, da Rede Space Farming Brazil, essas espécies foram escolhidas por seus altos valores nutricionais e resistência. A batata-doce roxa é rica em carboidratos e antioxidantes, enquanto o grão-de-bico fornece proteínas, fibras e possui ampla versatilidade alimentar, podendo ser usado em hambúrgueres, saladas ou homus.
Além de potencial para o cultivo espacial, os pesquisadores esperam que os resultados ajudem também no aperfeiçoamento agrícola na Terra, especialmente em regiões afetadas por mudanças climáticas extremas.
Agricultura espacial: como funciona o experimento?
Os materiais enviados não foram geneticamente modificados. O que precisou ser adaptado foram os invólucros das sementes, com requisitos técnicos rígidos para resistirem à decolagem e não representarem risco de contaminação dentro da cápsula.
Agora, os cientistas aguardam o retorno da missão para comparar o desenvolvimento das plantas no espaço com aquelas cultivadas em solo terrestre. A ideia é avaliar diferenças de crescimento, morfologia e tolerância ao estresse, especialmente em ambientes de microgravidade e alta radiação.
“Se essas espécies demonstrarem boa performance no espaço, poderão ser fortes candidatas para missões de longa duração”, explica Fávero.
Cultivo fora da Terra: os principais desafios
O maior desafio da agricultura espacial é justamente a ausência ou redução da gravidade, que altera processos celulares fundamentais — como o transporte de cálcio nas células e o crescimento radicular.
Além disso, há a exposição à radiação cósmica e a necessidade de criar sistemas fechados, como ambientes pressurizados com luz artificial, para simular condições ideais. Uma das alternativas estudadas para a Lua são os tubos de lava, cavernas naturais que oferecem proteção contra a radiação solar.
Brasil já desenvolveu sistema para plantar morangos em Marte
O professor Paulo Hercílio Viegas Rodrigues, da Esalq/USP, também envolvido no projeto atual, coordenou em 2021 uma pesquisa premiada pela NASA. O grupo criou um módulo de produção de morangos em ambiente simulado de Marte, garantindo produção de alimentos frescos em ambientes controlados.
O sistema brasileiro foi um dos dez projetos selecionados no mundo na primeira fase do Deep Space Food Challenge, concurso da NASA que busca soluções para alimentar astronautas em missões de longa duração.
Benefícios das tecnologias espaciais na Terra
Além de contribuir para a autossuficiência alimentar no espaço, os estudos da Rede Space Farming Brazil podem trazer soluções para problemas terrestres. A ideia é usar as tecnologias desenvolvidas para cultivar plantas mais eficientes no uso de água, energia e nutrientes — algo essencial em um cenário de crise climática e segurança alimentar.
“Essas tecnologias podem ajudar agricultores a lidar com extremos, como secas prolongadas ou chuvas excessivas”, afirma Fávero.
Nos próximos anos, mais alimentos populares entre os brasileiros devem ser testados para cultivo no espaço, como alface, tomate e batata. Quanto mais adaptadas ao cultivo indoor, mais úteis serão para as futuras gerações de astronautas — e também para os habitantes de regiões vulneráveis na Terra.