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A decisão da Câmara dos Deputados de retirar da pauta a Medida Provisória que aumentava tributos e buscava reforçar a arrecadação federal escancarou a fragilidade da articulação política do governo e antecipou a disputa eleitoral de 2026. Com 251 votos favoráveis ao requerimento de retirada e 193 contrários, a derrota imposta ao Palácio do Planalto nesta quarta-feira, 8, foi mais política do que fiscal.

A MP, que perderá validade nesta quinta, 9, era tratada pelo Ministério da Fazenda como peça essencial para fechar as contas de 2025 e sustentar a meta de equilíbrio orçamentário. Estimava-se arrecadação extra de até R$ 17 bilhões após ajustes feitos pelo relator, deputado Carlos Zarattini (PT-SP). Sem o texto, a equipe econômica já admite cortes, inclusive de emendas parlamentares, e ajustes de até R$ 35 bilhões no orçamento de 2026.

Nos bastidores, o revés é visto como um recado direto do Centrão e da bancada ruralista ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Governistas apontam que as duas frentes atuaram de forma coordenada para restringir a margem fiscal do Executivo no ano eleitoral, sob influência do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), provável adversário de Lula em 2026. A oposição nega o componente eleitoral e argumenta que a MP “onerava o setor produtivo” e refletia “arrogância do governo”.

A proposta previa unificar a alíquota de Imposto de Renda sobre rendimentos financeiros em 17,5%, taxar ganhos com criptomoedas, elevar de 9% para 15% a CSLL das fintechs e reduzir isenções sobre investimentos imobiliários e do agronegócio. Mesmo após o Planalto ceder em pontos sensíveis — mantendo a isenção sobre LCI, LCA e apostando em taxação menor para as casas de apostas — o Congresso manteve resistência.

A leitura política é de que o governo perdeu capacidade de articulação e enfrenta crescente isolamento entre partidos que compõem a base formal, mas operam sob lógica de independência. “Entramos no modo disputa eleitoral”, admitiu Zarattini, ao responsabilizar Tarcísio e líderes do Centrão por pressionarem parlamentares contra a medida.

Lula reagiu afirmando que a derrubada da MP representa “pobreza de espírito” e “um voto contra o Brasil”, por limitar recursos para políticas sociais e comprometer o equilíbrio das contas públicas. Mas o discurso de justiça tributária não sensibilizou o plenário.

O episódio expõe, além da dificuldade em aprovar medidas econômicas impopulares, o início de uma nova etapa no embate político em Brasília: a transição entre o desgaste da governabilidade e o acirramento da corrida presidencial.

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