Defensoria Pública de Goiás revela preocupação com números de casos de violência sexual no estado

20 junho 2024 às 12h29

COMPARTILHAR
O Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023 mostra que o país registrou o maior número de estupros da história. Ao todo, foram 74.930 vítimas, sendo 56.820 casos de estupro de vulnerável, ou seja, envolvendo menores de idade. O levantamento, de responsabilidade do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), aponta crescimento de 8,2% em relação ao ano de 2021.
Em entrevista ao Jornal Opção, a defensora pública e coordenadora do núcleo especializado de defesa e promoção dos direitos da mulher da Defensoria Pública de Goiás (DPE-GO), Tatiana Maria Bronzato Nogueira, destacou a subnotificação como um ponto que complica ainda mais o cenário. Levantamento de 2023 do Ipea mostra que a subnotificação ultrapassa a marca dos 90% dos casos. Os registros que chegam à polícia representam 8,5% do total e só 4,2% no sistema de saúde, conforme revela estudo. “É só o começo da ponta de um iceberg dos casos de violência sexual”, concluiu Tatiana.
Se considerarmos os casos registrados e a expectativa de subnotificação, acontecem cerca de 822 mil estupros em todo o país por ano, conforme previsão do Ipea.
A defensora pública explica ainda como funciona a atuação da instituição em casos de violência sexual para menores e maiores de idade, a fim de orientar a população. Atendimento de saúde voltado para profilaxia pós exposição, educação sobre direitos ligados à saúde sexual e reprodutiva, ações voltadas para assegurar garantias legais ligadas à aborto e proteção à vítima, e responsabilização parental (em caso de estupros de vulnerável por parentes próximos) são algumas medidas que a DPE pode adotar.
“Dos registros que a gente tem aqui da DPE, só no ano de 2024 a gente já teve mais de 1000 registros de atendimentos oriundos de violência sexual”, compartilhou.
Violência sexual contra meninas e adolescentes
O Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc), do Ministério da Saúde, mostra que, de 2018 a 2022, 287 meninas de 10 a 14 anos foram mães, em Goiânia. Em paralelo, o levantamento “O cenário brasileiro de injustiça reprodutiva para meninas e mulheres negras” aponta 17.579 nascidos vivos em partos de meninas de 10 a 14 anos em todo o país. Vale destacar que, segundo a lei, qualquer contato sexual com meninas de menos de 14 anos é considerado estupro de vulnerável.
O estudo, feito pela Rede Feminista de Saúde, Portal Catarinas, Grupo Curumim e Anis – Instituto de Bioética e Direitos Humanos, revela ainda que de 2010 à 2019 foram 252.786 registros de meninas de 10 a 14 anos gravidas dando à luz crianças com vida. A média anual seria de 25.280 casos, o que representa 69 estupros de meninas por dia no Brasil. Casos de morte dessas meninas vítimas de violência durante o parto são contabilizados como mortalidade materna, o que aumentaria ainda mais o número.
Veja abaixo gráfico elaborado pelo Ipea, com dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), que mostra a quantidade de registros de violência sexual relacionados com a idade da vítima:

Tatiana afirma que “cerca de 70% dos casos de estupros [de menores] são por parentes próximos, às vezes pai e padrasto” e nesse sentido, a DPE pode ativar a rede de proteção familiar, buscar destituição do poder familiar (quando o agressor é parente próximo da vítima), além de acionar a Justiça para cumprimento de direitos legais, como o aborto, e as medidas protetivas à vítima.
Como forma de coibir esse tipo de violência, a defensora coloca a educação sexual, a expansão da rede de atendimento habilitada a tratar esses casos, realização de campanhas anti-estupro e a capacitação das equipes de atendimento podem ser ações que colaborem para mitigação do atual cenário.
PL 1904/24
Quando questionada sobre o Projeto de Lei que tramita no Congresso Nacional (que visa igualar o aborto após 22° semana ao crime de homicídio), Tatiana diz que “a descoberta tardia da gestação decorre muitas vezes não da vontade da vítima”. A defensora conta que a atuação do agressor (comumente próximo ao ciclo social da vítima), as características fisiológicas das vítimas e as distâncias e burocracias que envolvem a solicitação do aborto legal acabam por atrasar a realização do procedimento.
O aumento do risco de mortalidade materna em gestações em crianças e adolescentes é reforçado por Tatiana. “Aumenta em cinco vezes a mortalidade materna”, compartilhou. “Pela atual legislação não há limite de idade gestacional para interrupção” afirmou ao dizer que “eventualmente, diante de alguma negativa é possível também que a gente [DPE-GO] judicialize para que ocorra”.
Por fim, a coordenadora núcleo especializado de defesa e promoção dos direitos da mulher afirma que em todos os municípios que possuem defensorias públicas, possuem núcleos específicos para atendimento da infância e juventude. Em Goiás, denúncias podem ser feitas e mais informações obtidas, via Whatsapp, pelo número (62) 3157-1039.
Leia também: Votação do PL do Aborto pode ser adiada, mas até que ponto o projeto influi nas eleições 2024?
Empresário é preso por criar ‘pirâmide’ de pedofilia para estuprar adolescentes