Consciência Negra deve ser mais do que um feriado nacional
18 novembro 2025 às 15h00

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O Dia Nacional da Consciência Negra é comemorado nesta quinta-feira, 20. A data foi escolhida para relembrar a morte de Zumbi dos Palmares, que lutou e resistiu contra a escravidão. Essa luta, entretanto, ainda continua. Em pleno século XXI, ela acontece em moldes diferentes, mas com o mesmo objetivo: a busca pelo respeito. Pessoas pretas ainda sentem na pele atitudes racistas e, por isso, se tornam resistentes. O combate acontece até mesmo em gestos sutis, para que se sintam pertencentes aos lugares.
A luta é diária porque ainda há dados que chocam quando falamos de pessoas serem tratadas diferentes apenas pela cor da pele. Uma pesquisa apoiada pelo Ministério da Igualdade Racial mostra que, de cada 100 pessoas pretas, 84 já relataram ter sofrido discriminação por conta de serem pretas. A análise ainda vai além: 51,2% pontuaram que já foram tratados com menos gentileza do que pessoas brancas. Quando recortamos esse cenário por gênero, as mulheres são as maiores vítimas, sendo 72% delas afirmando que já sofreram algum tipo de preconceito racial.
Os dados ainda mostram uma desigualdade racial brutal existente no Brasil. Aquela que ainda segrega, humilha, despreza e mata. Ainda é perceptível como a população preta do Brasil ainda não se enxerga como pertencente ao país que ajudou a desenvolver e que muitas vezes teve seu sangue espalhado por essas terras. Voltando no contexto de um país escravocrata, os negros ficaram anos trabalhando em lavouras de cafés, produto esse que se tornou um símbolo de poderio e que, inclusive, determinava os rumos políticos do nosso país. Quantas mulheres negras escravizadas não tiveram que abrir mão dos seus filhos naquela época para servirem de ama de leite e amamentarem os filhos de barões e outras autoridades para que esses não morressem de fome. Atitude vista como nobre, mas carregada de violência.
Diante de tudo isso, eu me pergunto: o que leva um ser humano a achar que é melhor do que o outro apenas por ser branco? Por que, na visão dessas pessoas, o preto tem menos “valor”? E que valor seria esse que é medido pela cor de pele? Parece que a sociedade trava uma luta interna em que não vale caminhar com equidade e, sim, com a exclusão.
Seria medo? Já que os pretos vêm com uma sabedoria que adquiriram com a vida, escola essa que, pode passar o tempo que for, é a que mais nos proporciona os maiores aprendizados. Seria incômodo? Pelo fato de que, mesmo devagar, os pretos estão ocupando lugares que ainda eram apenas destinados às pessoas brancas, já que estavam acostumadas a verem os pretos como subservientes?
Seria inveja? Pelo fato da própria sociedade exigir que o preto se prepare mais, se cobre mais, para não fracassar e não ouvir que a culpa é da cor da sua pele e não pelo fato de que vive em um país que não oferece uma equidade de serviços públicos de qualidade para poder lutar de de igual para igual com um privilegiado.
Os questionamentos são muitos. A data serve para refletir e debater. Mas debate com fundamento e não com achismo ou, pela falta de argumento, tratar a discussão como “mimimi”. O racismo existe. Infelizmente perdurando até mais do que deveria – o certo era nem existir – e nós, enquanto sociedade, entender que a luta não é apenas dos pretos, mas de todos aqueles que acreditam e buscam viver uma sociedade melhor.
Uma sociedade que não enxerga a carne negra como a mais barata do mercado, que não vê o sangue do negro com menos importância do que qualquer outro. Que não enxerga o preto no lugar de servir, que respeita as religiões de matriz africana como qualquer outra. Que entende que a Consciência Negra não é apenas o mais novo feriado nacional com possibilidade de folga no trabalho, mas um ponto de partida de um processo evolutivo para que o grito dos excluídos ecoe cada vez mais. Pois, como está escrito na canção Canto das Três Raças: “E de guerra em paz, de paz em guerra, todo o povo dessa terra, quando pode cantar, canta de dor.”
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