A decisão da Warner Bros. Discovery de rejeitar a proposta da Paramount e avançar na venda de seus ativos para a Netflix aumentou o debate sobre a concentração do mercado audiovisual global e seus impactos para países como o Brasil. Para o professor de Cinema da Universidade Federal de Goiás (UFG), Lisandro Nogueira, o movimento consolida um cenário de poder excessivo nas mãos das plataformas de streaming e pode aprofundar a fragilidade do cinema nacional.

Segundo o professor, a possível incorporação do catálogo da Warner, que inclui estúdios históricos, franquias consolidadas e a HBO, pela Netflix representa “o pior dos mundos” para o audiovisual. “Se a Netflix comprar a Warner e a HBO, teremos um monopólio mundial ainda mais forte. Isso diminui empregos, reduz diversidade e concentra decisões editoriais em uma única empresa, que passa a definir o que será produzido, exibido e financiado”, afirmou ao Jornal Opção.

Lisandro afirma que a Netflix já deixou de ser apenas uma distribuidora para se tornar uma força dominante no setor. “Ela não concorria com os grandes estúdios, mas se impôs. Hoje, tem mais de 200 milhões de assinantes no mundo. É um poder gigantesco. Com essa compra, ela pode simplesmente ditar regras, inclusive sobre a exibição de filmes em salas de cinema”, avalia.

Professor Lisandro Nogueira. | Foto: Guilherme Alves/Jornal Opção

Para o professor, a concentração tende a agravar a crise das salas de cinema, que já enfrentam queda de público e custos elevados. “Os grandes lançamentos que ainda levam público ao cinema são, em sua maioria, da Disney, Warner e Netflix. Ao mesmo tempo em que lucram nas bilheterias, o objetivo da Netflix é passar um trator nas salas de cinema e centralizar tudo no streaming”, diz.

Ele alerta que o enfraquecimento das salas compromete não apenas a experiência coletiva do cinema, mas toda a cadeia econômica ligada ao setor. “Cinema fomenta transporte, alimentação, empregos indiretos. Países como China e Coreia do Sul entenderam isso e investem pesado para manter o público nas salas. Aqui, estamos indo no sentido oposto”, afirma.

Lisandro também chama atenção para os efeitos no mercado interno de trabalho. “Vai afetar atores, diretores, técnicos. Se houver produção, será diminuta e totalmente subordinada aos interesses da plataforma. O dinheiro circula pouco no mercado independente”, avalia.

Na análise do professor, a compra da Warner pela Netflix simboliza um ponto de inflexão na chamada “guerra do streaming”. “Não é apenas uma disputa empresarial. É uma reorganização profunda do mercado audiovisual mundial. Quem controla catálogos históricos e plataformas globais passa a controlar narrativas, empregos e fluxos econômicos”, conclui.

O acordo ainda depende da aprovação de órgãos reguladores dos Estados Unidos, mas causa reações no setor cultural e entre especialistas, que veem na operação um avanço significativo da concentração de poder no audiovisual.

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