Associação investigada pela PF recebeu quase R$ 690 mil da Prefeitura de Anápolis

30 julho 2025 às 12h54

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A Associação Moriá, considerada uma Organização da Sociedade Civil (OSC), recebeu pelo menos R$ 696.552,00 da Prefeitura de Anápolis entre julho de 2018 e dezembro de 2021. A instituição é investigada pela Polícia Federal (PF) e pela Controladoria-Geral da União (CGU) por possíveis irregularidades envolvendo valores milionários recebidos por emendas parlamentares. Ao Jornal Opção, o ex-prefeito Roberto Naves disse a investigação atual não tem relação com os serviços prestados ao município.
“A Associação Moriá tinha sede na Lapa [bairro Jardim da Lapa, em Anápolis] e participou de alguns chamamentos da Prefeitura, assim como toda e qualquer associação que presta serviço para crianças em vulnerabilidade social. E logo que houve uma alteração e ela saiu de Anápolis e mudou também a sua equipe diretiva, nunca mais nós tivemos contato com a associação e ela nunca mais participou de nada na Prefeitura. Então o problema atual não tem nada a ver com a ex-equipe diretiva e muito menos com a época em que ela prestou serviço à Prefeitura de Anápolis”, disse Roberto Naves.
O levantamento foi realizado pelo Jornal Opção via Portal da Transparência e Diário Oficial. Foram três Termos de Fomento, usando recursos do Fundo da Infância e Adolescência (FIA) e dois Termos de Colaboração de prestação de serviços para “projetos de cunho social” e serviços de “prática esportiva”. A Associação é presidida pelo ex-cabo do Exército, Gustavo Henrique Fonseca de Deus, de Valparaíso de Goiás, e tem como diretora operacional a esteticista Thais Pinheiro Freitas, que mora em Posse. Um motorista também é sócio da instituição.
Todos os contratos foram assinados durante a gestão do ex-prefeito Roberto Naves (Republicanos), que atualmente preside a Agência Estadual de Turismo (Goiás Turismo). A Associação citou essas parcerias em Anápolis para comprovar experiência e capacidade técnica para realizar os Jogos Educacionais Digitais (Jedis) em Goiás usando emendas parlamentares.
Contrato ou convênio | Valor final |
Termo de Colaboração 019/2018 (Natal) | R$ 508.532,00 |
Convênio 041/2019 (Esporte em Ação) | R$ 165.000,00 |
Convênio 016/2019 (FIA) | R$ 10.000,00 |
Termo de Fomento 003/2020 (FIA) | R$ 13.020,00 |
Total | R$ 696.552,00 |
Confira alguns dos Convênios firmados entre a Associação Moriá e a Prefeitura de Anápolis:
- Chamamento Público nº 006/2018
Projeto voltado à promoção e defesa dos direitos da criança e do adolescente, homologado em 12/11/2018
Valor: R$ 8.000,00
- Termo de Fomento nº 016/2019
Apoio a projetos de cunho social
Valor: R$ 10.000,00
Vigência: 11/03/2019 a 08/06/2019
- Chamamento Público nº 003/2020
Valor adjudicado: R$ 13.020,00
Homologação: 14/12/2020
- Termo de Colaboração nº 019/2018 (Processo: 000047156/2018)
Natal de Coração
Valor inicial: R$ 498.900,00 (com acréscimo de R$ 9.632,00)
Valor total após aditivo: R$ 508.532,00
Vigência: 3 meses a partir de 08/11/2018
- Termo de Colaboração nº 041/2019 (Processo: 000060137/2019)
Prestação de serviços de práticas esportivas no Programa “Esporte em Ação”
Valor Inicial: R$ 187.500,00 (houve acréscimo e ajuste)
1º Aditivo (2019–2020): + R$ 82.500,00
2º Aditivo (2020–2021): + R$ 82.500,00
Aditivo de ajuste (2021): – R$ 187.500,00
Valor total após aditivos: R$ 165.000,00
Vigência inicial: Até 31/12/2019 (houve acréscimo)
Nova vigência: 01/01/2021 a 31/12/2021
A reportagem não localizou eventuais contratos feitos depois de 2021. Esse valor não inclui repasses indiretos (por emendas, subvenções ou parcerias com outros entes).
O Jornal Opção entrou em contato com a Associação Moriá solicitando posicionamento por mensagem de telefone. No entanto, não recebeu resposta até a última atualização desta matéria. O espaço continua aberto para manifestação.
Repasses federais
A Associação Moriá recebeu R$ 46 milhões de parlamentares do Distrito Federal em apenas dois anos. O recurso foi encaminhado para um programa que ensinava crianças e adolescentes a jogar Free Fire, Valorant, LoL, Teamfight Tactics e eFootball.
As emendas foram destinadas entre 2023 e 2024. Desse valor, já foram pagos R$ 8 milhões e o restante já foi empenhado, de acordo com o Portal da Transparência do Governo Federal. Veja os deputados e quanto cada um deles enviou para o projeto:
- deputado federal Fred Linhares (Republicanos): R$ 27,6 milhões;
- senador Izalci Lucas (PL): R$ 15,5 milhões;
- deputada federal Bia Kicis (PL): R$ 1,5 milhão;
- deputado federal Julio Cesar (Republicanos): R$ 800 mil; e
- deputada distrital Paula Belmonte (Cidadania): R$ 500 mil.
Investigação da PF
Cinco dirigentes da Associação, seis empresas subcontratadas pela empresa, e os seus sócios da Associação são os alvos da operação. Foram cumpridos 16 mandados de busca e apreensão, expedidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF), nos estados de Goiás, Acre, Paraná e Distrito Federal. Ainda foram determinadas medidas de sequestro de bens, como veículos e imóveis, e o bloqueio de contas bancárias dos investigados. A associação também não pode receber novos repasses de recursos federais ou transferir valores às empresas subcontratadas, informou a PF.
A PF informou que essa operação investiga irregularidades na “execução de cerca de R$ 15 milhões em recursos públicos federais”, que foram repassados por meio de termos de fomento com o Ministério do Esporte – financiados com as emendas mencionadas.
Segundo a decisão da CGU, a investigação aponta irregularidades na execução de quatro Termos de Fomento (TF) de Jedis firmados entre a Associação Moriá e o Ministério do Esporte, entre 2022 e 2023. Em um contratos, a CGU informou que “foram executados em valores de 315% mais caros que os valores executados” quanto a locação de computadores gamers, que não foram sequer comprados.
A CGU apontou que aproximadamente 90% dos recursos públicos federais recebidos pela Moriá foram redestinados a outras pessoas jurídicas ou físicas para a execução dos eventos, as subempresas já mencionadas. “A própria entidade assume que não dispõe de funcionários ou pessoas capacitadas para execução dos serviços vinculados à execução desses eventos”, diz a decisão.
Associação Moriá
A Associação é presidida pelo ex-cabo do Exército, Gustavo Henrique Fonseca de Deus, de Valparaíso de Goiás, e tem como diretora operacional a esteticista Thais Pinheiro Freitas, que mora em Posse. Um motorista também é sócio da instituição.
Documentos e apurações revelam conexões diretas entre a ONG e a Millennium Eventos, empresa do empresário Alejandro Ruben Parrilla, que recebeu R$ 1 milhão da entidade para prestar serviços durante a realização de um projeto gamer no Rio de Janeiro.
A Millennium foi contratada para fornecer estrutura de evento, como aluguel de equipamentos, ambulância, água mineral e kits de alimentação aos participantes. Apesar de parecer uma contratação de rotina, o vínculo entre a ONG e a empresa levanta questionamentos.
O endereço oficial da Associação Moriá, registrado na Receita Federal como Setor de Rádio e TV Norte, Quadra 701, Conjunto C, Ala B, Sala 603 – Asa Norte, Brasília, pertence, segundo matrícula do imóvel, a um familiar direto de Alejandro Parrilla. A reportagem também apurou que a ONG não funciona efetivamente nesse local. Suas atividades eram realizadas no Millennium Convention Center, situado dentro da Ascade (Associação dos Servidores da Câmara dos Deputados), espaço onde Parrilla figura como sócio.
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