Aos 23 anos, a sul-mato-grossense Dryka Brenda vive uma rotina marcada por exames, restrições alimentares e incertezas. Diagnosticada com Polipose Adenomatosa Familiar (PAF), uma doença genética rara e hereditária que provoca o surgimento de dezenas a centenas de pólipos com alto potencial pré-cancerígeno, ela agora buscar um tratamento especializado nos Estados Unidos.

“É uma doença rara, genética, hereditária, tudo de ruim”, resumiu Dryka ao Jornal Opção. Ela explicou que a condição é causada por uma mutação no gene APC, a mesma encontrada em seu pai. A PAF afeta não só o intestino grosso, mas pode comprometer estômago, duodeno, intestino delgado, tireoide, pâncreas e outros órgãos. Sem acompanhamento, a evolução para câncer é considerada quase inevitável.

Diagnóstico começou com o pai

A descoberta da doença na família ocorreu em 2023, quando o pai de Dryka recebeu o diagnóstico de dois tumores síncronos no intestino. “Meu pai estava com um tumor no reto e outro no cólon. Quase um câncer metastático, porque ele já estava em estágio 4”, lembra.

Foi durante a consulta oncológica que os médicos identificaram a mutação genética. Em seguida, Dryka foi alertada que poderia ter 50% de chance de carregar o mesmo gene. “O médico virou pra mim e falou: ‘Você vai ter que fazer colonoscopia. Se tiver a mesma doença, vai ter que tirar seu intestino grosso igual seu pai’. Foi um baque”, recorda.

O exame revelou entre 50 e 70 pólipos no intestino da jovem. “O médico disse: ‘Esses pólipos são pré-cancerígenos. Não é um, nem dois, são mais de cem ao longo da vida’. Ali eu entendi que não era algo simples.”

Após a confirmação, Dryka passou por cirurgia para retirar o intestino grosso. Contudo, a doença continuou avançando para outros órgãos. “Me falaram que era só tirar o intestino e acabou. Mas não acabou. Depois descobriram pólipos no estômago e no duodeno. A doença continuou evoluindo”, relata.

Ela afirma que o impacto emocional foi profundo. “Eu sempre tive sintomas e os médicos diziam que era coisa da minha cabeça. Depois do diagnóstico, minha depressão piorou muito. Eu parei a faculdade, vi minha vida parar, enquanto todo mundo seguia.”

Cirurgia de alto risco

Em nova avaliação, Dryka ouviu que o tratamento ideal seria ainda mais agressivo. “Me disseram: ‘Se você tivesse que tirar o estômago, não seria só ele. Seria o estômago, parte do pâncreas e o duodeno’. Eu fiquei em choque.”

Segundo ela, a equipe médica alertou para o risco extremo do procedimento. “A médica falou: ‘Tem paciente forte, bem nutrido, que foi pra essa cirurgia e morreu’.” Com desnutrição severa e peso instável, a cirurgia foi considerada inviável. “Eu ouvi do médico: ‘Se você tirar agora, você morre’. Foi desesperador.”

Busca por alternativas fora do Brasil

Sem opções terapêuticas no país além de novas cirurgias, Dryka passou a procurar centros internacionais especializados. “Eu falei: ‘Eu não quero tirar mais órgãos. Eu quero um tratamento que não seja cirúrgico’. Foi aí que encontrei pesquisas experimentais e mandei mensagens para hospitais de fora.”

A jovem e o pai foram aceitos pela Mayo Clinic, nos Estados Unidos, referência mundial em doenças raras e genéticas. O objetivo é avaliar terapias que possam controlar o avanço dos pólipos e reduzir o risco de câncer. “É literalmente a minha vida em risco. Essa pode ser a virada no meu tratamento”, afirma.

Rotina pesada e risco constante

Hoje, Dryka realiza exames a cada quatro meses, como endoscopia e retossigmoidoscopia, além de ultrassom de tireoide. “Eu tenho risco de câncer em outros órgãos. Tenho nódulos no pescoço e estou em acompanhamento.”

A alimentação também se tornou um desafio. “Eu desidrato muito fácil. Tenho que beber muita água, comer pouco e cuidar de tudo que como. Já fui internada por comer coisas que não devia. Às vezes só quero comer como todo mundo.”

A jovem critica a falta de preparo da rede de saúde para lidar com doenças raras. “Ter uma condição rara é isso: você que tem que pesquisar. Muitas vezes o médico não sabe.”

Ela lembra que ouviu informações equivocadas no início. “Quando me disseram que era só tirar o intestino, isso gerou um transtorno psicológico enorme. Se tivessem explicado que a doença era progressiva, eu estaria mais preparada.”

No Brasil, ela afirma, há pouquíssimos estudos e pouca conscientização. “Eu pesquisava e não achava ninguém com PAF. Não conhecia ninguém. Era como se essa doença nem existisse.” Hoje, Dryka participa de um grupo com pouco mais de 40 pacientes no país. “Tem gente que descobriu tarde demais. Tem gente que é a primeira da família e nem sabia que podia ter isso.”

Vaquinhas arrecadam recursos para tratamento nos EUA

Sem condições financeiras para arcar com os custos da viagem e do tratamento, Dryka e a família criaram duas campanhas online. As arrecadações cobrirão passaportes, vistos, passagens, hospedagem, alimentação, traduções médicas e despesas emergenciais. A mãe acompanhará os dois como cuidadora.

As doações podem ser feitas pelos links:

“É difícil pedir ajuda, mas eu quero viver com qualidade. Eu quero ter a chance que minha avó não teve, que meu irmão não teve. Eu quero ter uma vida”, diz.

Após anos lidando com sintomas ignorados, Dryka decidiu usar as redes sociais para dar visibilidade à PAF. “Eu comecei a falar da minha condição porque ninguém falava. Eu queria ter ouvido antes tudo o que eu só descobri depois. Se eu puder ajudar alguém a descobrir cedo, já vale a pena.”

Enquanto aguarda o tratamento nos EUA, ela segue sob risco contínuo. Ainda assim, mantém um pedido simples. “Eu não quero sentir que minha vida acabou aos 23 anos. Eu só quero continuar.”

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