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Luiz Carlos Bordoni

Especial para o Jornal Opção

O modelo das emendas impositivas distorce a separação entre os poderes e cria uma anomalia institucional que hoje desequilibra a democracia representativa.

Começa pelo princípio constitucional ferido. A Constituição é clara: o Executivo executa o orçamento e responde pela política fiscal e financeira. O Legislativo fiscaliza e legisla, não executa.

A PEC das emendas impositivas, ao obrigar o Executivo a executar despesas definidas por parlamentares, inverte essa lógica — e fere o art. 2º da Constituição, que estabelece a independência e harmonia dos Poderes.

Na prática, o Congresso passou a ser executor de parte do orçamento, algo que contraria a essência do presidencialismo brasileiro.

Segundo ponto: o desvio de finalidade e desequilíbrio eleitoral. Está claro, explícito, o uso político-eleitoral das emendas. Elas transformaram o mandato parlamentar em instrumento permanente de campanha, permitindo a deputados e senadores canalizarem recursos diretamente às bases eleitorais, consolidando poder local e dificultando a alternância democrática.

Promulgação da Constituição de 1988 | Foto: Reprodução

Esse desequilíbrio viola princípios como: isonomia eleitoral (art. 14, §9º); moralidade administrativa (art. 37, caput); impessoalidade e finalidade pública (art. 37, caput).

Ao vincular bilhões de reais em recursos à decisão política de um parlamentar, cria-se o terreno fértil para a troca de favores e clientelismo; parlamentares agindo como “mini-executivos”; e distorção da prioridade pública — o dinheiro vai para onde rende voto, não para onde há necessidade.

Não é por acaso que países com sistemas maduros de democracia não adotam esse modelo. Nos EUA, na França ou no Reino Unido, emendas parlamentares são apenas sugestões, sem caráter obrigatório.

Isso tem que ser questionado no Supremo Tribunal Federal. Há base jurídica para isso. É cabível uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ou uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), sustentando a violação ao art. 2º (separação dos poderes); violação ao art. 84, II e VI (competência privativa do Executivo para elaborar e executar o orçamento); violação aos princípios da moralidade, impessoalidade e eficiência (art. 37).

Há nesse caso acentuada relevância política e moral e esta ação interposta com certeza causará impacto moral e institucional, colocando o país num debate necessário: quem governa o Brasil: o Executivo eleito ou o Parlamento orçamentário?

Hoje, as emendas se tornaram moeda de poder — e o Executivo, refém.

Questionar isso no STF não é apenas uma questão técnica, mas um ato de defesa da República e do equilíbrio democrático.

Luiz Carlos Bordoni, jornalista, é colaborador do Jornal Opção.