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Jales Guedes Coelho Mendonça

Completam-se hoje 90 anos da Constituição que autorizou a construção de Goiânia. No dia 04 de agosto de 1935, promulgou-se a segunda Carta Magna Estadual, cujo artigo 5º, de suas disposições transitórias, constitucionalizou o projeto mudancista, ao acolher uma fórmula conciliatória, que ordenou, ao mesmo tempo, o prosseguimento da edificação da nova cidade e o amparo à antiga capital, resguardando-a da decadência.

As obras de Goiânia não esperaram a chegada em 1935 da Assembleia Constituinte – produtora da Constituição –, tendo início ainda em 1933, durante o período discricionário do Governo Provisório (1930-1934). Contudo, com a entrada em vigor da Constituição Federal de 16 de julho de 1934, todos os Estados da federação brasileira deveriam convocar suas respectivas Constituintes e, na sequência, aprovarem seus estatutos constitucionais, de acordo com o sistema de reconstitucionalização escalonado adotado no país.

Foto: Reprodução/Correio Official

Em Goiás, após a disputada eleição de 14 de outubro de 1934, que sufragou 16 parlamentares do Partido Social Republicano (governista) e 8 da Coligação Libertadora (oposicionista), a Assembleia Constituinte abriu suas portas em abril de 1935. Em seguida, elegeu o interventor federal Pedro Ludovico para Governador, bem como Nero Macedo e Mário Caiado para Senadores da República, além do deputado Hermógenes Coelho para presidente da Casa (acumulando também a função de Vice-Governador).

Considerando que a Constituição é a “Lei Maior” do ordenamento jurídico, ou seja, sua norma suprema, os integrantes da Assembleia Constituinte de 1935 possuíam então ampla liberdade para deliberarem sobre as obras de Goiânia, iniciadas dois anos antes, no município de Campinas, inclusive impedirem sua continuidade.

No entanto, após intensos debates e o percurso das 12 fases do regimento interno, a Constituinte, ante a presença da majoritária bancada governista, aprovou o prosseguimento da construção de Goiânia, com a cláusula de amparo à antiga capital.

Sem grande esforço interpretativo, a relevância da Constituição de 1935 para a efetivação da transferência da capital pode ser extraída facilmente da leitura do decreto nº 1816, de 23 de março de 1937, da lavra do Governador de Goiás, que determinou na ocasião a remoção definitiva dos poderes para Goiânia.

No referido decreto de apenas dois artigos, mas de nove “considerandos”, a Carta Magna de 1935 é muito mencionada, o que deixa patente sua imprescindibilidade para o desiderato almejado. Em verdade, a Constituição significou o verdadeiro fundamento de validade do decreto mudancista, até porque a lei – norma superior ao decreto – não restou aprovada pela Assembleia Legislativa em 1936, por razões que encontram-se descritas pormenorizadamente em nosso livro “A Invenção de Goiânia: o outro lado da mudança” (Ed. UFG, 2018).

Por fim, o valor atribuído à Constituição de Goiás de 1935 era tão evidente à época que o dia 4 de agosto, data de sua promulgação, transformou-se em feriado estadual, por força da Lei nº 28 de 20 de novembro de 1935, e foi inclusive pomposamente celebrado no ano seguinte com a realização de diversos desfiles cívicos.     

Jales Guedes Coelho Mendonça é Promotor de Justiça, Doutor em História (UFG), presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás (IHGG), Sócio Correspondente Brasileiro do IHGB, autor em livro “A Invenção de Goiânia: o outro lado da mudança” (Ed. UFG, 2018, 688 p.) e colaborador do Jornal Opção.

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