“Seria um tiro na cabeça”: Secretário de Saúde explica que saúde em Goiás pode colapsar caso Brasil faça retaliação aos EUA

29 julho 2025 às 09h52

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O secretário de Saúde de Goiás, Rasível Santos, fez um alerta contundente sobre os impactos das tarifas de 50% impostas pelos Estados Unidos a produtos brasileiros e, principalmente, sobre os riscos de uma retaliação do Brasil. Em entrevista exclusiva ao Jornal Opção, Rasível Santos afirmou que uma resposta tarifária brasileira poderia provocar um verdadeiro colapso no sistema de saúde nacional, afetando tanto a rede pública quanto a privada.
“A maior preocupação nossa não é nem a tarifa de 50%, apesar de ser desastrosa. O problema real é se houver uma retaliação por parte do Brasil taxando produtos americanos. Aí sim, teremos um caos na saúde. Pedimos imunidade tarifária para o setor de saúde. Se isso não for possível, que o governo federal pelo menos não faça a reciprocidade, pois seria um tiro na cabeça. Isso poderia inviabilizar o SUS”, declarou o secretário.
Segundo Rasível Santos, o impacto inicial da tarifa norte-americana já é significativo para a indústria farmacêutica brasileira. O Brasil exporta medicamentos, inclusive para os EUA, e a taxação compromete tanto a produção quanto a competitividade do setor.
“Um estudo do André Mice aponta impacto de 6,7% na produção e 8% nas exportações. Isso prejudica empresas que investiram para atender o exigente mercado americano, com normas do FDA. O prejuízo atinge medicamentos, insumos farmacêuticos, dispositivos médicos e equipamentos hospitalares”, explicou.
Impacto no setor farmacêutico
O secretário lembrou que Goiás abriga o segundo maior polo farmacêutico do país, em Anápolis, e que o aumento nos custos pode comprometer a sustentabilidade do setor.
“Mas o que seria catastrófico mesmo é o Brasil retaliar. Quando os EUA taxam, eles dificultam nossa exportação. Mas se o Brasil responde, encarece a importação de produtos fundamentais, muitos dos quais vêm ou são distribuídos por empresas americanas.”
Entre os itens mais sensíveis, Rasível Santos cita imunobiológicos, medicamentos para câncer, materiais hospitalares, ressonâncias, tomógrafos e peças de manutenção.
“Nossa economia em saúde é extremamente sensível ao dólar. Um aumento da taxa de câmbio pode inviabilizar hospitais. Um levantamento mostra que o impacto seria de US$ 1,6 bilhão no SUS e US$ 1,65 bilhão no setor privado. Somando, são mais de R$ 19 bilhões ao câmbio atual. Isso pode ser a diferença entre manter ou fechar unidades de saúde”, alerta o secretário.
Fórum e medidas emergenciais
Para lidar com os efeitos da crise, o governador Ronaldo Caiado (UB) antecipou sua volta do Japão e convocou reuniões com empresários e representantes da saúde. Rasível Santos foi designado para liderar o acompanhamento dos impactos no setor.
“Já fizemos uma reunião com o setor farmacêutico e de saúde privada. A partir daí, criamos um fórum permanente para discutir medidas emergenciais e estruturar respostas.”
Dentre as ações, estão a possível abertura de linhas de crédito emergencial por meio do Fundo de Estabilização Econômica e do Fundo de Direitos Creditórios, além da solicitação ao governo federal e aos EUA para isentar a saúde das taxações.
Rasível Santos destacou ainda que o fórum identificou estoques em queda entre distribuidoras americanas e alertou para riscos de desabastecimento, como o ocorrido na pandemia de COVID-19.
“Já vimos sinais de redução de estoques por parte de distribuidoras americanas. Se houver escassez, como vimos na pandemia, podemos enfrentar falta de medicamentos e insumos críticos novamente.”
Além disso, o fórum discutirá a liberação de medicamentos parados na Anvisa e a utilização de capacidade ociosa da rede privada para absorver parte da demanda do SUS.
“Estamos avaliando se hospitais e clínicas privados têm capacidade ociosa para atender pacientes do SUS. Isso pode gerar fluxo de caixa para o setor e desafogar a rede pública”, apontou.
Governadores tentarão sensibilizar os EUA
Ronaldo Caiado articula junto ao Fórum dos Governadores uma proposta para que os Estados Unidos excluam o setor de saúde da tarifação. Segundo Rasível Santos, o movimento esbarra em resistências políticas.
“Alguns governadores, por ideologia ligados ao governo, têm dificultado o avanço da pauta. Mas o governador Caiado está firme. Já declarou que não vê problema em chamar o vice-presidente Geraldo Alckmin para ajudar na articulação.”
Retaliação comercial ameaça vidas, alerta setor farmacêutico
O presidente do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), Nelson Mussolini, alertou para os riscos à saúde pública caso o Brasil adote tarifas retaliatórias contra produtos dos Estados Unidos. Segundo ele, cerca de 60% dos medicamentos de alta complexidade que abastecem o Sistema Único de Saúde (SUS) são importados do país norte-americano.
“Esses remédios, usados em tratamentos de ponta, são a diferença entre a vida e a morte para muitos pacientes”, afirmou Mussolini. Ele destaca que, com a aplicação de tarifas, os custos desses produtos podem aumentar de forma expressiva, comprometendo a capacidade de aquisição pelo sistema público.
Entre os medicamentos ameaçados estão tratamentos essenciais para doenças graves, como câncer, artrite reumatoide e enfermidades raras. A possível alta nos preços pode inviabilizar o acesso a esses tratamentos, sobrecarregando ainda mais o SUS e afetando milhões de brasileiros que dependem desses fármacos.
“O que está em jogo é a vida de milhões de pessoas que não têm outra alternativa a não ser contar com o SUS para receber medicamentos de última geração”, alertou o presidente do Sindusfarma.
Maternidades em Goiânia
Rasível Santos comentou sobre a troca da organização social que administra maternidades em Goiânia, que passam por reformulação na gestão.
“No ano passado, o município estava sem liderança. Hoje temos um prefeito atuante e um secretário municipal trabalhando. A mudança visa melhorar a sustentabilidade e a eficiência das unidades. É uma decisão municipal, que estamos acompanhando e apoiando quando solicitados.”
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