Estar e continuar bem: o Sesi e a manutenção da saúde do trabalhador no pós-pandemia

13 outubro 2023 às 14h05

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Todos os dias de segunda a sexta-feira, e também em alguns sábados, por volta de 4h45 da madrugada, o técnico em segurança do trabalho Deidson Martins está de pé. É esse o horário que o rapaz de 35 anos costuma acordar para sair de sua casa em Trindade, Região Metropolitana de Goiânia, às 6h e estar no trabalho, uma obra na avenida 85, setor Marista, na capital goiana, às 7h em ponto.
Deidson atua como técnico em segurança do trabalho junto à construtora Consciente há cerca de 6 anos e meio, cumprindo seus horários religiosamente. No entanto, em novembro de 2021, a rotina precisou ser interrompida. Ao ser transferido de uma obra para outra, Deidson foi pego pela ameaça biológica mais temida no Brasil e no mundo nos últimos anos.
“Dentro do nosso núcleo de segurança, a gente via que muitos estavam pegando Covid. Então, pra prevenir minha equipe interna, fiz o teste rápido e foi constatado que eu estava com o coronavírus”, relembra Deidson, que entrou para o registro de 1,9 milhão de pessoas que contraíram o Sars-CoV-2, causador da Covid-19, em Goiás desde o início da pandemia até outubro deste ano, conforme dados da Secretaria Estadual de Saúde.
O técnico, mesmo assintomático, foi afastado de suas funções por 14 dias, mantendo isolamento em casa. No entanto, mesmo não tendo experimentado os tão temidos (e tradicionais) sintomas da Covid – tais como perda do olfato e paladar, febre alta, dores pelo corpo -, o rapaz, que praticava esportes profissionalmente antes de adquirir sua atual formação, revelou ter percebido que seu fôlego já não era o mesmo.
“Antes de ser técnico em segurança, eu era corredor de longa distância, então eu entendia que às vezes corria cinco, dez quilômetros tranquilamente, sem perder o fôlego. E depois da Covid eu vi que meu fôlego caiu lá embaixo. Eu não conseguia correr aqueles cinco quilômetros com a mesma disposição”, destaca.
Cumprindo uma carga horária integral, morando em uma cidade e trabalhando em outra e tendo responsabilidades com esposa e filha, Deidson se viu em uma difícil situação para retomar suas atividades físicas, algo que poderia fazê-lo recuperar parte da saúde perdida com o coronavírus. Foi quando, em novembro de 2022, chegou à obra um projeto que mudou todo o cenário.
Batizada de Academia na Obra, o projeto itinerante é fruto de uma parceria entre a construtora Consciente e o Sesi – componente do sistema da Federação das Indústrias do Estado de Goiás, a Fieg – e oferece, literalmente dentro do canteiro de obras, uma estrutura com todos os aparelhos de atividades físicas normalmente à disposição em uma academia de bairro, além de instrutores e personal trainers disponibilizados pelo Sesi.

A academia, cujo acesso é exclusivo para os trabalhadores e sem custos para eles, provocou uma mudança radical e positiva na rotina da obra. De segunda a quinta-feira ao fim do expediente, em vez de irem direto para casa com o cansaço do trabalho, os funcionários trocavam de roupa, andavam poucos metros dentro da obra e, acompanhados do instrutor, faziam uma série de exercícios avaliados para cada um individualmente.
Segundo Deidson, um dos funcionários assíduos na academia, a melhora na saúde veio como consequência. “Antes eu não conseguia correr nem cinco quilômetros, e depois fui evoluindo. De cinco foi pra cinco e meio, depois seis, até comecei a correr num pique mais forte que era parecido com o ritmo de quando eu corria maratonas. Sempre acompanhado do instrutor”, ressaltou.
Se o trabalhador não vai “à montanha”, a “montanha” vai ao trabalhador
O técnico Deidson Martins, assim como inúmeros outros funcionários, confessa que, não fosse a Academia na Obra, não haveria tempo e nem disposição para procurar uma atividade física diariamente após o expediente. “Ali era no quintal de casa. Porque, como dizem, o trabalho da gente é nossa segunda casa”, comenta. E foi justamente o conceito de levar ao trabalhador, em seu local de trabalho, uma estrutura de bem-estar físico, oferecendo facilidade e praticidade no acesso, o maior motivador do projeto fruto da parceria entre a construtora e o Sesi.
De acordo com Lenyta Barbosa, psicóloga organizacional da Consciente, a empresa conta hoje com pouco mais de 800 colaboradores, englobando operacional e administrativo. A psicóloga conta que a Academia na Obra, de modo geral, abrange praticamente todos eles, uma vez que funciona de modo itinerante.

“A obra finalizou, a gente leva a academia para a próxima que estiver ativa, em processo de construção. Essa estava no WTC [World Trade Center]. Como está finalizando, ela foi desmontada e vai para a [obra da] Casa Brasileira. Lá, a gente prepara uma outra estrutura. Tem todos os aparelhos, tem professor que fica lá pra acompanhar esses alunos. É uma academia de fato, mas no local de trabalho deles”, detalha.
A Academia na Obra não é exclusividade de uma só empresa. De acordo com dados do Sesi, o projeto de academia corporativa é colocado em prática por outras quatro empresas parceiras da entidade. E, em questão de saúde itinerante antes, durante e depois da pandemia, a lista de serviços viabilizados pela parceria com o Sesi não é pequena.
Além da ginástica laboral, que acontece semanalmente nas empresas parceiras do Sesi com a presença de educadores físicos da entidade (na construtora Consciente, os profissionais estão presentes na sede da empresa de segunda a quarta-feira, segundo Lenyta Barbosa), e hoje inclui até a técnica chinesa milenar tai chi chuan, há também o serviço de vacinação in loco contra a gripe.
Para se ter uma ideia, em 2023, 421 empresas foram atendidas em Goiás – o que representa mais de 54 mil pessoas vacinadas pelo Sesi no estado neste ano. Em 2022, esse número chegou a 67 mil. Vale destacar que, na ação de vacinação na empresa, familiares do trabalhador podem comparecer e também receber a dose contra a influenza.

Saúde mental também é saúde
Importante como cuidar do corpo, cuidar da mente também é essencial. De acordo com o técnico em segurança Deidson, o preenchimento de seus domingos com a ida, com esposa e filha, ao clube do trabalhador do Sesi se transforma na “válvula de escape” das demandas e problemas no trabalho e da correria da semana.
“Poder descansar a cabeça, espairecer. Levar minha esposa e minha filha pra poder divertir ajuda não só meu bem-estar mental, mas de todos os envolvidos”, pontua.
O clube em questão é o reconhecido Ferreira Pacheco, em Goiânia. Trata-se de uma gigantesca estrutura com parque aquático, piscinas, quadras polivalentes cobertas, quadras de tênis de campo, campos de futebol gramado, salão de jogos, sauna, academia de musculação, churrascaria e lago com pedalinhos.
A adesão, segundo Deidson, também é feita in loco. “De vez em quando passa um representante do Sesi pra fazer a adesão. Esse ano ainda teve a carteirinha digital”, diz.
E enquanto uns buscaram, em meio e após a pandemia, formas de desanuviar a mente, outros foram atrás de meios para exercitá-la. É o caso de Aila Aparecida, de 32 anos. Logo quando começou a trabalhar na empresa Consciente, em 2021, a auxiliar de limpeza recebeu uma proposta para algo que já havia desistido de tentar.
“Perguntaram se eu tinha interesse de terminar o ensino médio. Falei que eu queria, porque era um sonho. Eu sempre tentava, mas parava no meio do caminho”, conta Aila, que, até então, tinha somente o 1º ano do ensino médio incompleto.
A rotina de trabalho e os cuidados constantes com os dois filhos, de 10 e 3 anos, haviam tornado ainda mais difícil a possibilidade de voltar a estudar. Porém, assim como a Academia na Obra, uma escola itinerante levou até Aila, em seu local de trabalho, aquilo que em outras situações ela só poderia encontrar fora dele.
Também fruto de uma parceria com o Sesi, o Ensino Consciente é um projeto sem custos ao trabalhador que leva, literalmente, uma escola para dentro do local de trabalho de pessoas que, por vários motivos, não conseguiram concluir o ensino fundamental e médio, mas que têm vontade de fazê-lo. “Era de segunda a quinta-feira. Eu vinha trabalhar, e depois do expediente eu ia para a escola, à noite”, recorda Aila, que contava com dois professores enviados pelo Sesi.

Com a facilidade de ter uma escola dentro do local de trabalho e o horário flexível, Aila conquistou, em abril deste ano, o sonho de ter um certificado de conclusão do ensino médio. Segundo ela, junto com a pandemia, foi embora também o sentimento de constrangimento.
“Eu sempre quis ter terminado e as pessoas falavam, que eu não tinha conseguido terminar os estudos. Agora eu falo com a boca cheia: ‘Eu tenho o ensino médio’. Foi muito importante pra mim, porque sem esse projeto, eu não teria conseguido”, comemora.
De acordo com Felipe Alvarenga, presidente do Instituto Consciente (responsável pela parte social e das parcerias da empresa com o Sesi), o sentimento é de realização. “Se não tivesse ela [parceria com o Sesi], não teríamos esse entendimento de ajudar esse colaborador”.
“É um passo muito significativo pra nós, levar isso para os colaboradores, seus familiares, para a comunidade. É muito mais prazeroso. As pessoas estão crescendo e despertando esse empoderamento. O ensino, o estudo tem isso, de dar essa dignidade para as pessoas”, conclui.

Estar bem antes, durante e depois
Se está mal na mente, fica mal no corpo. É o que explica Luana Correia, especialista em Fenomenologia Existencial e Neuropsicologia e psicóloga clínica do Sesi CAT Goiânia. Segundo ela, é preciso lembrar que, após a pandemia, houve um aumento significativo de quadros de depressão e ansiedade, e um alerta foi emitido inclusive pela OMS a respeito dessa realidade.
“Entre tantos outros, alguns deles são desânimo, cansaço mental e claro afetando o físico”, expõe. O conjunto de males que pode recair sobre o trabalhador, tanto físicos quanto mentais, de acordo com Luana, torna imprescindível o acompanhamento de profissionais competentes para que haja a manutenção da saúde do indivíduo.
Conforme a psicóloga, além desse acompanhamento, “o descanso é, sim, importante alinhado com uma rede de apoio e ambiente saudável, gerando um bem-estar ao indivíduo”. E para isso, Luana explica que a presença de projetos que oferecem ao trabalhador um suporte físico e mental, seja de lazer ou desenvolvimento, faz com que ele fique bem e, mais importante, continue assim.

“O lazer proporciona liberação de hormônios positivos, gerando sensações de bem-estar e descanso físico e mental, além de fazer com que o indivíduo realize atividades físicas, seja ativo e valorizado, obtendo acesso a esses serviços essenciais. São movimentos necessários para voltar à ativa pós-isolamento, pois nosso corpo e mente precisam estar sempre em movimento para uma saúde mais efetiva”, arremata.
Trabalhador saudável, economia em movimento
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que durante a primeira onda da Covid-19, em 2020, cerca de 716 mil empresas encerraram suas operações, sendo 99,8% delas de menor porte. Além disso, conforme relatório de um estudo conduzido pela Universidade do Chile e Universidade da Columbia (nos Estados Unidos), com a colaboração da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) – Covid-19 Health Care Workers Study – sobre a saúde mental do trabalhador durante a pandemia, entre 14,7% e 22% dos trabalhadores de saúde entrevistados em 2020 apresentaram sintomas que levaram à suspeita de um episódio depressivo.
Os dados mostram um efeito devastador do coronavírus tanto sobre as empresas quanto sobre o trabalhador em si, afetado mental e fisicamente pelo vírus. E para Bruno Godinho, diretor de Saúde e Segurança do Sesi, é justamente o cuidado com a saúde do trabalhador no período pós-pandêmico que funcionará como a chave para o reaquecimento do cenário econômico.
Segundo Godinho, os principais desafios do Sesi eram entender a dinâmica dessa pandemia, “as relações de contaminação do vírus, os métodos preventivos mais eficazes”. “O Sesi tinha uma responsabilidade de sair na frente justamente para levar às empresas as condutas, os protocolos para atuar diante de um vírus que, até então, era desconhecido de todo mundo”.
Superada essa etapa, o diretor de Saúde enfatiza que, o objetivo do Sesi, hoje, é dar o suporte e acompanhar a adaptação do trabalhador em uma época em que os entendimentos e dinâmicas sobre saúde física e mental passaram por uma transformação, devido ao coronavírus. “Se por um lado a gente está falando de preparar o ambiente [de trabalho] pra receber esse trabalhador, e não haja o adoecimento, por outro lado a gente precisa falar de como promover a saúde desse trabalhador, e o Sesi atua em uma série de premissas de saúde integral”, aponta.
Passando pelos serviços de telemedicina, assessoria psicossocial nas empresas, cursos de liderança, assessoramento de criação de políticas de saúde mental até o oferecimento de ginástica laboral, academias e escolas corporativas, atendimentos odontológicos e psicológicos, Godinho afirma que, hoje, o Sesi conta com uma estrutura completa de atendimento à empresa e ao trabalhador no que tange à saúde tanto de um, quanto de outro, mesmo nas situações que demandem a mais delicada atenção.
O diretor, cita, como exemplo, o projeto da Brigada de Emergência Psicossocial, criada para socorrer o trabalhador em situações extremas. “Se o trabalhador tem um surto no ambiente de trabalho, por exemplo. Se ele tem uma crise de pânico, uma crise de choro, uma depressão profunda no meio do expediente. A Brigada realmente prepara um grupo de pessoas pra lidar com essas situações dentro da empresa”.
“Quando o Sesi atua com essas ações, e a empresa é parceira, a gente tem trabalhadores mais engajados, mais produtivos. Isso é um aumento de mão de obra, é redução do desemprego, é o crescimento no cenário econômico, um crescimento de riqueza […]. Uma vez que o trabalhador está mais satisfeito, saudável e engajado, ele também fica mais produtivo”, finaliza.