Afinal, a “velhice” pode ser considerada uma doença?

27 outubro 2022 às 11h57

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A Organização Mundial da Saúde (OMS) já chegou a inserir a velhice como doença na nova versão da Classificação Internacional de Doenças (CID-11), mas, em janeiro deste ano, voltou atrás na decisão após inúmeras críticas entre especialistas na área. A Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG) e o Comitê Latinoamericano (COMLAT) da Associação Internacional de Gerontologia e Geriatria (IAGG) foram algumas entidades que protestaram contra a mudança na época.
De acordo com a ex-presidente da SBGG, Elisa Franco, em conversa com o Jornal Opção, a velhice não pode ser considerada uma doença porque é uma etapa da vida. “É difícil separar o que se convencionou chamar de senescência (envelhecimento fisiológico) e senilidade (envelhecimento patológico) porque são dois fenômenos que se completam e que podem existir em um mesmo indivíduo”, explica. A médica ainda usa de exemplo uma pessoa com doença de Alzheimer que pode estar senil mentalmente, e ser robusta fisicamente, ou seja, senescente.
“Os idosos são o grupo mais heterogêneo que existe. Podemos ter um de 60 anos frágil e um de 89 robusto, por exemplo”, afirma a geriatra, destacando que a idade cronológica não pode ser a base da classificação como doença. “Dessa forma, tudo que um indivíduo de mais 60 anos apresentasse poderia ser classificado como ‘velhice’. O que deixa de lado a busca por doenças e situações clínicas que pudessem ser amenizadas, modificadas ou mesmo curadas”, completa.
Estatísticas
Franco ainda destaca que a classificação da “velhice” como doença pode causar impactos nas estatísticas e planejamento na área da saúde. Segundo ela, dados sobre doenças que acometem e matam a população seriam perdidos porque idosos caíram apenas em tal código. O que atrapalha na organização e gestão da saúde pública.
Entretanto, o registro da condição como causa da morte não é ilegal em muitos países, incluindo o Brasil, apesar de não ser recomendado por aqui. Um exemplo recente famoso aconteceu no Reino Unido, onde não há uma regra bem estabelecida sobre. A velhice foi apontada como causa da morte da rainha Elizabeth II, provavelmente por uma questão de protocolos que protejam a privacidade da família real.
Para Elisa, o registro não adequado da causa de morte não afeta apenas as estatísticas de ocorrência de condições médicas, mas causa impacto nas políticas de saúde, tanto no investimento quanto no gerenciamento.
Termos como ‘debilidade da velhice’ e ‘senilidade’ devem ser evitados porque além de inespecíficos, arcaicos, gerarem preconceito, atrapalharem as estatísticas e planejamento de saúde, ainda podem ser ofensivas para os familiares enlutados. Quando a causa é desconhecida é melhor colocar causas inespecíficas de morte”, afirmou a especialista.