Gestores de cidades que circundam Brasília estão divididos em relação à ideia de criar uma nova unidade federativa que englobaria municípios goianos vizinhos à capital federal. Proposta já é antiga e há políticos interessados em sua viabilidade

Frederico Vitor

O projeto é antigo e pa­rece ser o sonho de mui­tos políticos goianos que detêm bases eleitorais na região goiana do En­torno do Distrito Federal. A criação de um novo Estado formado basicamente por municípios goianos vizinhos a Brasília é uma ideia que ainda paira sobre a cabeça de lideranças de diversos segmentos das cidades que circundam a capital da República. De tempos em tempos, a discussão volta à tona, e uma nova proposta que en­trou em pauta é a criação do Es­ta­do do Entorno, cuja capital seria Luziânia, de 191 mil habitantes.

Nem todos os prefeitos de cidades que seriam englobadas pelo projeto de criação de um novo ente federativo enxergam a proposta como solução para todos os gargalos que afligem a região. Há gestores municipais que defendem parcerias mais profundas entre município, governo estadual e União, ou a criação de um fundo constitucional análogo ao Fundo Cons­ti­tucional do Distrito Federal (FCDF) que preveja o envio de verbas federais para saúde, educação e segurança pública de Brasília.

Em contrapartida, há outros prefeitos que veem na criação de uma nova unidade federativa a solução para os vários entraves da região do Entorno, principalmente no que diz respeito à infraestrutura, saneamento básico, saúde, transportes e segurança pública. Os defensores da iniciativa argumentam que a nova unidade federativa já seria criada juntamente com melhorias e investimentos da União. Territo­rialmente enxuto, formado por pouco mais de 20 municípios, o novo Estado receberia do Fundo de Participação dos Estados (FPE) um aporte estimado em R$ 85 milhões por mês e uma arrecadação de ICMS calculado em mais de R$ 1 bilhão mensal.

Além da proposta que cria o Estado do Entorno, existem outras duas concepções de novo ente federativo que englobariam vasta área do território goiano vizinho à capital federal. O mais antigo dos projetos é o Estado do Planalto Central, que teria sua capital sediada em Taguatinga (região administrativa do Dis­trito Federal). A outra sugestão é a de criação do Estado do Itiquira — nome alusivo à cachoeira de maior queda livre da América Latina, com 167 metros de altura —, com sede administrativa em Formosa (110 mil moradores). Além dos municípios goianos do Entorno, o Itiquira arrancaria de Goiás as cidades do Nordeste goiano e incluiria também parte do território de Minas Gerais e Bahia.

Atualmente, a Câmara dos Deputados analisa a criação do Estado do Planalto Central. A intenção é que o novo ente federativo seja composto pelo desmembramento das áreas onde se situam as regiões adminis­tra­tivas do Distrito Federal, mas o texto não especifica quais. Na atualidade, o Distrito Federal conta com 31 regiões administrativas, in­cluindo Brasília.

De acordo com a proposta, o novo Estado também deverá englobar os seguintes municípios de Goiás: Abadiânia, Água Fria de Goiás, Águas Lindas de Goiás, Alexânia, Alvorada do Norte, Buritinópolis, Cabeceiras, Cidade Ocidental, Cocalzinho, Corumbá de Goiás, Cristalina, Damianó­polis, Flores de Goiás, Formosa, Luziânia, Mambaí, Mimoso de Goiás, Novo Gama, Padre Ber­nardo, Planaltina de Goiás, Santo Antônio do Desco­berto, São João da A­liança, Simolândia, Sítio d’Aba­dia, Valparaíso de Goiás e Vila Boa de Goiás.

O autor da proposta, não é um parlamentar goiano e tampouco brasiliense. Trata-se do deputado federal maranhense Fran­cisco Escórcio (PMDB-MA), que defende a criação do Estado do Planalto Central em razão da possível geração de desenvolvimento que a medida traria, como mais empregos e renda. Segundo ele, os grandes fluxos migratórios que foram para a região geraram crescimento urbano desordenado e caótico, de difícil administração, o que leva à necessidade de poderes Executivo, Legislativo e Ju­di­ciário próprios, capazes de suprir as demandas em educação, saúde, infraestrutura dentre outras necessidades.

Para que a proposta saia do papel é necessária a convocação de um plebiscito, medida prevista no Projeto de Decreto Legis­lativo 1127/13. Os eleitores de Goiás e do Distrito federal se­riam convocados às urnas para decidir se querem ou não perder parte de seu território para criar um novo Estado. Caso o eleitorado envolvido aceite a mudança, os parlamentares ainda precisariam aprovar uma lei complementar que seguiria para sanção presidencial. Atual­mente, a proposta é analisada pelas comissões de In­tegração Nacional, Desenvol­vimento Re­gional e da Amazônia; de Finanças e Tribu­tação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania antes de seguir para votação pelo Plenário.

Criar um Estado não sairá barato ao erário. São necessários investimentos em equipamentos estatais, o que significa gastos exorbitantes em um momento em que o País atravessa uma crise econômica que afeta diretamente os cofres públicos. Caso se torne uma realidade, o governo terá que arcar com a criação de secretarias de governo, autarquias e empresas públicas, como a de geração e fornecimento de energia elétrica, de água e de tratamento de esgoto. Além disso, haverá a necessidade da construção de uma nova As­sembleia Legislativa, tribunais de Justiça e de Contas, Ministério Público, um novo sistema penitenciário, além de toda uma estrutura de segurança pública como delegacias, batalhões e academias de polícia. Os defensores da ideia argumentam que o gasto é necessário, já que há uma compensação com a melhoria da qualidade de vida da população.

“Ideia precisa ser discutida amplamente com a população do Entorno”
Cristóvão Tormin (Luziânia): “Se a população aceitar, eu também aprovo” | Crédito:Y. Maeda
Cristóvão Tormin (Luziânia): “Se a população aceitar, eu também aprovo” |
Foto:Y. Maeda

Para Cristóvão Tormin (PSD), prefeito de Luziânia, falta maturidade à ideia, ou seja, ainda não estão claros quais seriam os benefícios palpáveis que a população teria caso fosse criado um novo Estado. Segundo o gestor da maior cidade do Entorno, com aproximadamente 191 mil habitantes, os moradores que residem na região ainda não têm domínio acerca do assunto, portanto a ideia precisa ser discutida amplamente com a população. “Se as pessoas aprovarem, estarei ao lado”, diz.

Itamar Barreto (Formosa): "Apoio criação de um Fundo para o Entorno" | Crédito: Divulgação
Itamar Barreto (Formosa): “Apoio criação de um Fundo para o Entorno” |
Foto: Divulgação

Cristóvão Tormin afirma que a melhor solução no momento seria a criação do Fundo Constitucional do Entorno, aportes oriundos do governo federal que seriam investidos na saúde, educação e segurança pública da região e parcerias efetivas entre municípios, governos federal e estadual, mais o Distrito Federal. O prefeito diz que o Palácio dos Buritis (sede do Executivo brasiliense) precisa ajudar as municipalidades adjacentes, já que a ligação da população do Entorno com Brasília é muito grande e histórica. “O que vier para melhorar é bem-vindo”, diz.

Hildo do Candango (Águas Lindas): “População do Entorno quer soluções” | Foto: Y. Maeda
Hildo do Candango (Águas Lindas): “População do Entorno quer soluções” |
Foto: Y. Maeda

O prefeito de Águas Lindas de Goiás, Hildo do Candango (PTB), já pensa diferente. Ele é favorável à emancipação do Entorno como uma nova unidade federativa e, segundo sua perspectiva, apesar de ainda não existir estudos e estatísticas sobre os impactos positivos e negativos da criação de um novo Estado, a ideia é bem-vinda. “A população do Entorno anseia por soluções, mesmo que isso signifique se desmembrar de Goiás para criar um novo ente federativo”, diz. Para o prefeito do município de cerca de 180 mil habitantes, o projeto é exequível, desde que seja discutido amplamente pelos moradores da região. “No Entorno estão localizadas cidades em pleno desenvolvimento, por isso acreditamos que ao criar um novo Estado haveria um suporte a mais para o crescimento da região”, diz.

O prefeito de Formosa, Itamar Barreto (PSD), afirma que é contra a criação do Estado do Planalto ou do Entorno. Ele diz ser favorável ao surgimento do Estado do Itiquira, que abrange as cidades do Nordeste Goiano, Minas Gerais e Bahia. O chefe do Executivo do município de 110 mil habitantes lembra que há uma resistência muito grande dos moradores das cidades-satélites de Brasília em se tornar parte de um Estado (no caso do Planalto Central). “O que precisa existir é um Fundo Constitucional para o Entorno. Os problemas de saúde, segurança e transporte existem em função de Brasília, nada mais justo o governo federal socorrer esses municípios.”